Colômbia registra em um mês o recorde de ameaçados durante o processo de paz
Cynthia de Benito
Bogotá, 27 set (EFE).- Mais de 150 defensores de direitos humanos, jornalistas e políticos foram ameaçados na Colômbia em menos de 30 dias, o que transforma este mês em um “setembro negro” ao acumular o maior número de intimidações realizadas desde que começou o processo de paz entre o governo e as Farc.
O fluxo de ameaças começou em 8 de setembro, com uma lista de 91 pessoas, para as quais o grupo paramilitar “Águias Negras” dava 15 dias para sair do país.
Foi o início de uma lista que foi completada pelo grupo criminoso de origem paramilitar “Los Rastrojos”, que nos seguintes dias aumentou a relação com jornalistas, políticos e mais ativistas.
No total, somam mais de 150 e o mês ainda não acabou.
“É um setembro negro porque desde 2009 não eram registradas ameaças em massa desta envergadura”, apontou à Agência Efe o coordenador da ONG Somos Defensores, Carlos Guevara, que vela pela segurança dos ativistas de direitos humanos na Colômbia.
Guevara é taxativo ao afirmar que este mês é um “ponto muito alto” quanto a ameaças, e absolutamente desconhecido no marco do processo de paz entre o governo e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), que começou em Havana em novembro de 2012.
“A pergunta que tentamos responder é quem quer criar um clima de pânico, porque achamos que estão usando os membros das Águias Negras e Los Rastrojos, mas que há outras pessoas por trás das ameaças”, sustentou.
Essa é uma das chave que os ativistas usam para denunciar que desta vez as ameaças são especiais. “Por que elas estão sendo feitas agora e não quando se iniciaram os diálogos de paz?”, se perguntou Guevara.
O analista de Fundação Paz e Reconciliação Ariel Ávila, destacou como incongruência que “Los Rastrojos” funcionam com alianças locais, e os pactos que obtêm com outros grupos armados ao norte da Colômbia não têm porquê ser respeitado no sul.
“O que dizemos é que são aliados locais deste grupo os que estão pressionando as ameaças, ou seja, criadores de gado e grandes proprietários de terras que se sentem em risco pelo processo de paz, porque vai revelar muitas verdades e terão que reparar a vítimas que foram despejadas de suas terras”, declarou.
Dos mais de 150 ameaçados, não foi registrado ainda nenhum morto, mas sim um ataque, o sofrido por Alberto Yepes, coordenador do observatório de direitos humanos na Coordenação Colômbia Europa Estados Unidos, que integra 240 ONGs.
“Fomos alvo de um roubo de informação importante para os temas de pós-conflito e vítimas, especialmente relacionados com os casos de falsos positivos e desaparecimento forçado”, relatou Yepes à Efe.
Dias após ser incluído em uma lista de ameaçados, desconhecidos armados o abordaram na rua, confiscaram seu computador e dois telefones celulares que continham uma investigação de um ano sobre a participação de militares em massacres.
Agora, conta com medidas adicionais de proteção por parte do governo.
“Há um desconcerto total. A solução na Colômbia é dar segurança a todo o mundo, mas as investigações não avançam, então há ameaças e assassinatos e ninguém sabe quem foi”, se lamentou Ávila.
Enquanto as ameaças disparam e os ameaçados buscam os que consideram os verdadeiros autores das advertências, o país faz frente aos dois últimos fatos que sacudiram a situação dos ameaçados.
O primeiro deles é a crise orçamentária da entidade do Estado encarregada de brindar segurança aos ameaçados, a União Nacional de Proteção (UNP), que mantém 76,7% dos serviços que oferece em mãos privadas e que arrasta um déficit de 100 bilhões de pesos colombianos (cerca de US$ 49,5 milhões).
O segundo é o debate realizado no Senado sobre a relação do ex-presidente Álvaro Uribe com narcotraficantes e paramilitares, que comoveu o país e voltou a desencadear enfrentamentos de forma radical entre a esquerda e a direita, um reflexo da luta que vive a Colômbia há mais de meio século.
“Se diz que nos próximos dias vão ameaçar muita mais gente para que o Estado não tenha capacidade de proteger a todos, e então os ameaçados que se descuidarem vão terminar assassinados”, advertiu Ávila. EFE
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