Bolsonaro e Mourão vivem um casamento de fachada em que os dois contam as horas para acabar

Visita do vice-presidente ao ministro Luís Roberto Barroso, do STF, azedou de vez a relação; rompimento respinga no Exército, que não aceita ver um general ser tratado com descaso

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 27/08/2021 12h57 - Atualizado em 27/08/2021 18h08
Antonio Molina/Fotoarena/Estadão Conteúdo - 04/08/2021 Sentados na bancada da frente durante posso de Ciro Nogueira, Hamilton Mourão, à esquerda, e Jair Bolsonaro, ambos de máscara e trajes sociais, sentam lado a lado, mas não se olham Jair Bolsonaro já comparou sua relação com Hamilton Mourão com a de um cunhado que ele precisa suportar

A crise entre o presidente Jair Bolsonaro e seu vice, o general Hamilton Mourão, chegou até aonde tinha de chegar. Completamente rompidos. Daí para adiante é difícil prever. É como se o Brasil não tivesse vice-presidente da República. Mourão vai seguindo seu caminho sem saber ao certo o que representa no governo. Talvez nada. A questão azedou de vez quando o general fez uma visita ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso, desafeto declarado de Bolsonaro por causa da urna eletrônica. A pouca relação entre os dois é de fachada. A amigos próximos, Mourão já chegou a falar em renunciar ao seu cargo. A visita a Barroso foi vista como um ato de traição. Era a gota que faltava. Pior é que Bolsonaro soube desse encontro pela imprensa. A visita ocorreu exatamente naquele dia em que o presidente promoveu espetáculo constrangedor em frente ao Palácio do Planalto, o desfile de tanques da Marinha. Um desfile sem sentido, com ares de provocação, com tanque quase parando, fumaça saindo, uma cena inconveniente. 

Nesse dia, Mourão disse ao presidente do TSE que as Forças Armadas nunca embarcarão em aventuras inconstitucionais. Ao saber, Bolsonaro não se conformou. Quase bateu com a cabeça nas paredes do Planalto. O problema é que as Forças Armadas não estão gostando dessas cenas grotescas. Existe, sim, um mal-estar já instalado entre o presidente e os comandos militares, que não admitem esse tratamento humilhante dado ao vice. Bolsonaro começa a se desgastar nos comandos do Exército, Marinha e Aeronáutica. Chegam a dizer que ele é um capitão reformado. Mas é o presidente da República. No entanto, a maior referência nas Forças Armadas é a figura de um general, caso de Mourão. Já o vice-presidente, que vai levando sua vidinha, dando seus recados todas as tardes por meio da imprensa, no entardecer de Brasília, já não está aceitando tantas humilhações. Às vezes, faz um afaguinho em Bolsonaro, em outras. critica, mas sem perder a calma.

Na sexta-feira, 20, Mourão disse que não calça os sapatos de Bolsonaro. O vice comentava o desejo do colega de chapa pedir o impeachment de Barroso, do qual, aliás, desistiu. Bolsonaro já afirmou várias vezes que Mourão só atrapalha e, por isso, impôs ao vice uma espécie de lei de silêncio. Disse, recentemente, que Mourão é igual a um cunhado. Você casa e tem que aturar o cunhado de feições maçantes o tempo todo ao seu lado. Pior é que não tem jeito de mandar um parente embora. Essa indisposição vem de longe. O casamento dos dois, em 2018, foi feito na correria, conforme Bolsonaro já explicou várias vezes. O rompimento veio logo. Agora, é um casamento de fachada. Parecem gato e cachorro. No entanto, isso começa a incomodar as Forças Armadas. Um general não pode se submeter a tal descaso, ainda mais sendo o vice-presidente do país. Seja como for, essa questão não tem volta. O presidente Bolsonaro fica no seu lugar e o vice-presidente permanece no seu. Os dois ignoram-se. Mal se cumprimentam. Mourão chega a ser excluído até cerimônias em que sua presença seria necessária. Assim, não pode mais continuar. Essa relação chegou ao limite do insuportável. 

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