Consulta pública é uma armadilha do Ministério da Saúde para induzir pessoas a serem contra a vacinação infantil

Formulário online é cheio de perguntas que sugerem a resposta em seu enunciado; com adjetivos como ‘absurdo’ e ‘acinte à sociedade’, profissionais de saúde reagem à artimanha do governo

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 27/12/2021 10h38
Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo - 20/12/2021 De terno, camisa branca, gravata amarela e máscara, Marcelo Queiroga gesticula com as palmas das mãos abertas Consulta pública sobre vacinação infantil foi determinada pelo ministro Marcelo Queiroga

Mais um fato desalentador, provocado por insensatez e falta de humanidade, atinge o brasileiro. A consulta pública do governo para decidir sobre a vacinação contra a Covid-19 em crianças de 5 a 11 anos recebe duras críticas e é chamada de ilegal e absurda. As perguntas são feitas de maneira que levam a pessoa consultada a se colocar contra a vacina, quer queira, quer não queira. O questionamento cerca o consultado, conseguindo a resposta que deseja. Na verdade, um ato de má fé do Ministério da Saúde, do servil ministro Marcelo Queiroga, que um dia, como médico, ainda vai se envergonhar do que fez e faz neste período em que passa no governo. A tal consulta vai ficar aberta até o dia 2 de janeiro em formulário online.

As reações são várias, mas a maior parte revela a elaboração das perguntas que, no fundo, condenam a vacinação das crianças. A pesquisadora da Fiocruz Margareth Dalcolmo, por exemplo, examinou o formulário e sentenciou à GloboNews: “É absurdo no nascedouro”. Ela observou que o governo deveria ter a grandeza de acabar com essa bobagem e acrescentou que um formulário com esse objetivo necessita de metodologia para ser válido. Margareth também considera que o questionário leva a opinião pública a uma confissão que não merecia. A consulta realizada pelo ministério é uma afronta e absolutamente ilegal no conteúdo e na forma.

Para Deisy Ventura, professora de ética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, o formulário é um objeto descabido, com perguntas confusas que induzem ao erro. “Trata-se de um acinte à sociedade”, disse a docente, também em entrevista à GloboNews. Ela salientou que o Ministério da Saúde há muito tempo encerrou suas atividades como uma instituição republicana, agindo explicitamente como uma milícia ao arrepio da lei, fazendo molecagens como essa consulta que custará muitas vidas. E criticou: “Trata-se de um crime continuado, absolutamente impune”. Já o presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, Marco Aurélio Sáfadi, observa ser incompreensível a necessidade de uma receita para que uma criança seja imunizada. Diz que a consulta fere um dos mais importantes princípios que regem o SUS, a universalidade, a equidade.

Pelas reações, sente-se que a tal consulta, que tem o único propósito de atender o presidente Bolsonaro — que não quer a vacinação infantil —, é uma armadilha para quem a lê e dá sua opinião. A resposta já está na pergunta, feita de acordo com o desejo do governo. Questões que enganam as pessoas consultadas e obtêm a resposta desejada. E enquanto o governo continua agindo dessa maneira, a cada dois dias morre uma criança de 5 a 11 anos vítima da Covid-19 no Brasil. O Palácio do Planalto discute num sério desrespeito à população, o que, aliás, vem fazendo desde o surgimento do coronavírus. E as crianças nessa faixa etária seguem em risco. Os especialistas em Saúde, que ainda existem no Brasil, mostram-se preocupados. Este é um governo que sempre se mostrou contra a vacina, e não muda. Dados da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 revelam que, em 2021, já foram registrado 3.185 casos em crianças de 5 a 11 anos, com 145 mortes. Só o governo não vê.

O presidente Bolsonaro afirma, com todas as letras, que uma criança morta a cada dois dias não justifica nenhuma medida de emergência. E assim vamos caminhando. Com um ministro da Saúde inútil e um governo decididamente contra a vacinação, o Brasil só vai tomar providências sempre muito tarde, como tem ocorrido em tudo que se refira à pandemia. No final, é o povo que paga pela insensatez. E pega com dor. Ao presidente Bolsonaro isso pouco importa. Quem manda é ele. E pensando ser dono de tudo, faz o que bem entender. A consulta pública para vacinação de crianças, exigindo prescrição médica, é mais uma indecência que temos de engolir. 

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