Disputa política no Brasil fica cada vez mais hostil e perigosa, mas poucos ligam para isso

Militares demonstram engajamento político nas redes sociais, embora o regulamento disciplinar das Forças Armadas classifique atos como transgressores; quem perde com essa briga é o país

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 03/08/2021 15h45 - Atualizado em 03/08/2021 15h46
Rosinei Coutinho/SCO/STF - 12/03/2020 Plenário do STF com a presença dos ministros Recentemente, o STF foi alvo de críticas do general da reserva Eduardo Barbosa

Não é novidade para ninguém, pelo menos para aqueles que ainda conseguem pensar neste cenário brasileiro cada vez mais tenso. O Brasil começa decididamente a trilhar caminhos perigosos. Mas poucos se lixam para isso. O país caminha aos tropeços num recinto de escuridão, com manifestações cada vez mais hostis. Estamos nos transformando numa terra de inimigos. Basta ler com alguma atenção o texto que o general da reserva Eduardo Barbosa, presidente do Clube Militar, publicou no site da entidade na última quinta-feira, 29, contra o Supremo Tribunal Federal. Ao texto, o general deu o título “Suprema Corte desmoralizada”. 

Trata-se, também, de um recado direto ao ministro da Defesa, general Braga Netto e aos três comandantes das forças militares do país. O general Eduardo Barbosa afirma que, por não terem sido eleitos pelo povo, esses ministros se promiscuem em discussões políticas que não lhes cabem. Diz ser vergonhoso e hipócrita o papel assumido pelo STF, escrevendo em sua página oficial para mentir, com o objetivo de confundir a opinião pública, muito provavelmente para respaldar uma CPI esdrúxula, que mais parece um tribunal de inquisição, segundo ele. Refia-se à afirmação do STF quando diz que não impediu o presidente da República de coordenar o combate à pandemia. De acordo com o presidente do Clube Militar, todos sabem que as decisões do STF deram aos governadores e prefeitos o poder absoluto para tomar as medidas que bem entendessem, inclusive com decisões inconstitucionais e desvio escancarado de recursos públicos. O general observa que isso contribuiu para piorar as consequências nefastas da pandemia, fazendo lembrar governos do passado rechaçados pelo povo nas eleições de 2018, mas ainda protegidos por ministros escolhidos exatamente por esses corruptos que permanecem impunes, com aqueles mesmo discurso dos que destruíram o país e desejam voltar ao poder.

Na última terça-feira, 27, também no site do Clube Militar, o Major-brigadeiro Jaime Rodrigues Sanchez criticou com veemência o protesto contra o presidente Bolsonaro realizado em São Paulo, chamando os manifestantes de “vândalos esquerdistas”, assinalando que os inimigos do governo usam armas deploráveis. O major adianta que atualmente existe no país uma trama para derrubar Bolsonaro e evitar sua reeleição. Entre esses vândalos destacam-se, de acordo com o major, os políticos do PT, ajudados por ministros do STF, aos quais chama de “bandidos investidos de poder judicial”. Ele reclama, também, da passividade dos bolsonaristas diante do que está ocorrendo no país. Diz ainda que a eleição fraudada será a cartada final, “se falharem os golpes de Estado em andamento ou se nenhum novo atentado contra a vida do presidente for desfechado”. 

Ao mesmo tempo, vários militares da ativa têm usado as redes sociais demonstrando engajamento político, apesar de os regulamentos disciplinares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica classificarem como transgressões as manifestações político-partidárias de integrantes das Forças Armadas. Toda essa atividade nas redes sociais indica alinhamento ao presidente Bolsonaro e parlamentares próximos ao governo, com muitas críticas ao PT, ao Supremo Tribunal Federal e à esquerda em geral. Chegou-se onde se podia chegar. A hostilidade cresce cada vez mais e sugere que o país anda à deriva, perdido de si mesmo. Trata-se de uma declaração de guerra, embora os oficiais da reserva não tenham comando de tropas. Os caminhos estão cada vez mais perigosos numa discussão que parece não ter fim. Fica difícil prever o futuro deste país dividido politicamente medindo a força bruta. Quem tem a ganhar? Parece que essa história do dia a dia brasileiro acontece em capítulos cada vez mais difíceis. Quem perde é o Brasil, antigamente chamado de “o país do futuro”.

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