Guerra civil brasileira segue firme e é alimentada por alguns alucinados que dão as ordens no país

Número de assassinatos por ano vinha caindo, mas voltou a crescer no 1º semestre de 2020; de janeiro a junho, houve um assassinato a cada 10 minutos, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 26/10/2020 12h00 - Atualizado em 26/10/2020 12h02
Reprodução/Pixabay Homem aponta arma de fogo De janeiro a junho, 25.712 pessoas foram assassinadas, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública

São tantas as câmeras espalhadas pelas cidades brasileiras, que muitos crimes bárbaros são registrados diariamente em todo lugar. Há sempre uma câmera com o olho aceso observando. Fora isso, são agora milhões de cinegrafistas de celular, mostrando as cenas de um cotidiano cada vez mais brutal. Cenas de violência em todo lugar, dia e noite, ininterruptamente. Na maioria dos assaltos, a vítima entrega tudo que tem, mas o bandido quer mais e mata por absoluta perversidade. Não dá mais para sair às ruas. Não dá mesmo. Sair às ruas transformou-se numa aventura. Há sempre um bandido numa esquina esperando especialmente as pessoas que se mostram mais frágeis. E as mortes somam números assustadores. Seria, digamos, um estágio para uma guerra civil. Talvez possamos usar a palavra ensaio. Seria um ensaio. A verdade é que o Brasil vive uma guerra civil não declarada, tal o número de assassinatos por ano. É assustador. Não poderia ser diferente num país com 14 milhões de desempregados e com 50 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza absoluta. Ainda assim, o número de assassinatos por ano vinha caindo desde 2018, mas voltou a crescer no primeiro semestre deste ano. Mesmo com a pandemia, essa máquina de extermínio ceifou a vida de 25.712 pessoas de janeiro a junho. Isso significou um assassinato a cada 10 minutos. É demais. É inaceitável.

O Brasil é um dos dez países mais violentos do mundo. O total de homicídios intencionais no 1º semestre deste ano foi 7% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado, que teve 24.012 ocorrências. Os dez estados com os piores registos, além do Rio de Janeiro e São Paulo, estão no Norte e Nordeste. A taxa mais alta de assassinatos é a do Amapá, com 49,7 casos por 100 mil habitantes. Em todo o ano passado, 47.773 pessoas foram mortas no Brasil, número menor do que no ano anterior, 2018, que interrompeu uma escalada de crescimento da violência, que registrou o recorde em 2017, com 64.078 assassinatos. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública coloca essas mortes no rol de morte-violentas intencionais (MVI), que somam os homicídios dolosos, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes em ações policiais em todo o país. É preciso dizer que, apesar da queda no ano passado, o Brasil se manteve entre os países mais violentos do mundo, acima dos Estados Unidos e Argentina, por exemplo. Nessa conta tem que se colocar as mortes das organizações criminosas que disputam os mercados e as rotas do tráfico de drogas.

Roraima é o Estado recordista de assassinatos em proporção à sua população em 2018, mas conseguiu baixar a taxa de 66,6 casos por 100 mil habitantes naquele ano para 35 ocorrências em 2019. A alta verificada no 1º semestre deste ano conta especialmente com os assassinatos especialmente em São Paulo, Bahia e Pernambuco. O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, observa que esses números atuais são resultados do pacote anticrime do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, que não foi aprovado como ele desejava. Some-se a isso o incentivo à política armamentista do presidente Bolsonaro, com mais de dez decretos para facilitar a circulação de armas de fogo no país. De acordo com os dados do fórum, 72,5% dos assassinatos no Brasil são cometidos por armas de fogo e que jovens negros são as principais vítimas dessa guerra civil não declarada. Renato Sérgio Lima observa que o crime organizado tem a seu favor uma série de fatores, como policiais que se ensimesmaram em demandas corporativistas e também em conflitos com governantes de vários estados, que foram politizados pelo debate entre Bolsonaro e governadores e prefeitos, que têm que se virar para cuidar da segurança. Assim, não surpreende o crescimento de assassinatos.

Com tudo isso, cresceu também o número de policiais mortos e de pessoas mortas em ações da polícia. O Fórum Brasileiro de Segurança observa, ainda, que os fatores para esse crescimento constante de homicídios se deve às promessas de alguns governadores eleitos em 2018, de que a polícia teria carta branca para matar. Exatamente isso. Carta branca para matar. A diretora executiva do fórum, Samira Bueno, explica que há estados em que a polícia mata pouco, como em Minas Gerais, observando que, em outros, a questão chega a ser obscena, como em São Paulo e Rio de Janeiro, onde a polícia é responsável por 30% do número de mortes: “A gente tem decisões políticas que se misturam com culturas organizacionais que incentivam o uso da força letal como instrumento de controle”, diz ela. Os números mais exatos sobre essa questão são de 2017, em que 65.602 pessoas foram assassinadas no país, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Foi o maior nível da história de letalidade violenta intencional do país. Desse total, os negros representaram 75% das vítimas. A guerra civil brasileira não declarada atinge em cheio a economia do país. Segundo o Ipea, os gastos relacionados à violência correspondem a 6% do PIB. A Organização Mundial de Saúde afirma que 123 pessoas são vítimas de homicídios por armas de fogo todos os dias no Brasil. Esse número sombrio representa cinco mortos por hora. No ranking dos 100 países mais violentos do mundo com mortes por arma de fogo, o Brasil ocupa a 10ª posição. Na América do Sul, o Brasil está em 2º lugar. Só perde para a Venezuela. Não declarada, a guerra civil brasileira vai seguindo firme com o crime organizado, traficantes, milicianos e outros fatores infelizmente alimentados por alguns alucinados que dão as ordens atuais no país.  

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