Dia de Finados não é mais respeitado como já foi; hoje é um dia de silêncio

Nem todos se ligam num dia como o de hoje, muitos dizem que a morte acaba com tudo e ponto final, mas isso depende da espiritualidade e da sensibilidade que se tem na vida

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 02/11/2020 12h34 - Atualizado em 02/11/2020 12h38
WERTHER SANTANA/ESTADÃO CONTEÚDO Cemitério Movimentação no Dia de Finados no Cemitério do Araçá, no bairro de Cerqueira César, em São Paulo

Hoje é um dia para se guardar no silêncio. Cada um com sua palavra. Sua ausência. O Dia de Finados hoje não é respeitado como já foi e não faz muito tempo. Era um dia em que, por exemplo, as emissoras de rádio passavam o tempo todo transmitindo música clássica. A locução praticamente não funcionava nesse dia. E nas ruas era possível notar as feições entristecidas das pessoas a caminho dos cemitérios. Era um dia em que evitava-se qualquer situação que pudesse provocar risos. O Dia dos Mortos já foi assim e ainda é assim para muitas pessoas que o respeitam com veneração e preces. Mas os tempos são outros e muitas vezes os mortos são esquecidos, como se não tivesse existido. Infelizmente é assim.

O Dia dos Mortos, de alguma maneira, é comemorado desde do século 2, quando alguns cristãos oravam pelos mortos visitando seus túmulos, especialmente daqueles que eram considerados mártires. No século 5, a Igreja decidiu dedicar um dia do ano para rezar por todos os mortos. E desde o século 11, os papas Silvestre II (999), João XVII (1003) e Leon IX (1049) tornaram obrigatória a comemoração desse dia com a participação da comunidade. No século 13, o Dia dos Mortos passou a ser comemorado no dia 2 de novembro, seguindo o dia 1, quando se comemorava a Festa de Todos os Santos. Leon Dinis (1846-1927), pensador e médium espírita, escreveu que a data para homenagear os mortos com orações foi uma iniciativa dos druidas, pessoas que tinham a missão de aconselhamento espiritual e filosófico da sociedade celta, que acreditava em outra vida depois da morte. Mas comemoravam o Dia dos Mortos em casa, não nos cemitérios. Para os espíritas, a visita aos túmulos é uma maneira de exteriorizar a lembrança que se tem do espírito querido, um gesto de afeto ao desencarnado, de acordo com Allan Kardec (1804-1860) que, no seu Livro dos Espíritos, pergunta:

-O instintivo respeito que, em todos os tempos e entre todos os povos, o homem consagrou e consagra aos mortos é efeito da intuição que tem uma vida futura?

E os espíritos respondem:

-É consequência natural dessa intuição. Se assim não fosse, nenhuma razão de ser teria esse respeito!

O Dia de Finados é celebrado em vários países do mundo, de maneiras distintas. Em muitos países, o dia mortos  representa sempre um dia de luto e tristeza, Em outros, a celebração pelos mortos é feita com festas pela memória dos falecidos, sempre refletindo suas referências culturais e religiosas. Nem todos se ligam num dia como o de hoje. Muitos dizem que a morte acaba com tudo e ponto final. Mas isso depende da espiritualidade e da sensibilidade que se tem na vida. Seja como for, em todo lugar há pessoas com flores indo em direção aos cemitérios para visitar e até conversar com seus mortos. É bom que seja assim. É preciso respeitar alguma coisa, porque o mundo chegou num ponto em que a brutalidade no comportamento transformou-se num gesto só de agressão ao outro. Falta respeito em tudo. É difícil falar assim, mas é a verdade que envolve a todos, ou pelo menos aos que ainda não se brutalizaram o suficiente para viver completamente distantes de temas assim. Um dia triste. Penso assim. Sinto assim. Um dia daqueles que se foram depois de cumprir sua passagem na Terra. Mas eu não me engano neste dia em que o respeito seria necessário. Certamente haverá até pancadão em muito lugar. O mundo é esse lixo que aí está. Essa amargura. Um mundo de gente que não sabe nada e faz o que bem entende. Então é melhor se calar. Mas prefiro resistir. Sou um poeta da resistência. Na poesia sou um militante subversivo e já experimentei a dor por ser um subversivo. No entanto, continuarei assim. Hoje é o Dia dos Mortos. Dos que se foram. Dos que ainda vivem só na memória daquelas pessoas que preferiram nunca esquecer.

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