Quando a discussão sobre voto impresso acabar, o que inventaremos para passar o tempo?

Pauta não tem chance de passar no plenário da Câmara, mas é evidente que Bolsonaro não vai parar com essa conversa que já encheu; a semana promete ser explosiva

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 09/08/2021 11h15
Tiago Hardman/Futura Press/Estadão Conteúdo Urna eletrônica com a palavra FIM escrita Proposta do voto impresso foi derrotada na Câmara na última quinta-feira por 23 votos a 11

A semana começa tensa no Brasil. Mas qual é a semana que não começa assim neste país? Contamos mais de 560 mil mortes pela Covid-19 e a discussão brasileira é sobre a urna eletrônica. Só um país insensato pode agir dessa maneira. Particularmente, não confio na urna eletrônica, desde um almoço no Rio de Janeiro com o então governador Leonel Brizola, por quem tinha admiração. Procurei por ele e lhe disse que queria conhecê-lo pessoalmente. Convidou-me então para encontrá-lo num sábado, para um almoço. Foi um encontro absolutamente descontraído em que recebi uma aula sobre o voto eletrônico e a TV Globo. No entanto, segui minha vida de cidadão. Votava na urna que não merecia e não merece ainda minha confiança. Mas se há problema nesse setor, que isso seja decidido em uma discussão civilizada. Não gritando, fazendo ameaças de que sem voto impresso não haverá eleição em 2022. Um presidente da República acha que pode tudo, mas não pode. Existem normas a seguir. E isso não parece ser o forte de Bolsonaro. Já houve um presidente da República, Washington Luís, que acabou deposto, cujo lema de suas campanhas eleitorais a partir de 1920 era “governar é abrir estradas”. Hoje caberia bem para Bolsonaro o lema “governar é criar caso com todo mundo”. 

Na sexta-feira, 6, em Joinville, Santa Catarina, Bolsonaro chegou a xingar a mãe do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, chamando-o de filho da p***. Cabe uma coisa assim? Não cabe. Não pode caber. E no sábado, 7, ele repetiu tudo de novo depois de dar um passeio de moto pelas avenidas de Florianópolis. Na verdade, quase todos os integrantes dos poderes do país mostram-se contra o voto impresso. O que Bolsonaro vai fazer? Vai colocar os tanques nas ruas? O presidente do TSE respondeu ao xingamento sem se exasperar. Disse que gosta de repetir que é um ator institucional, não um ator político. Sendo assim, adiantou não ter interesse em cultivar polêmicas pessoais, observando que a conquista da democracia foi a grande causa de sua geração e a isso dedica sua vida pública. “Não paro para bater boca, não me distraio com miudezas, o meu universo vai muito além de cercadinho”, disse Barroso. Está todo mundo cansado dessa conversa. Um país não pode caminhar assim, a não ser que deseja matar-se atirando-se num abismo. A proposta do voto impresso foi derrotada na quinta-feira, 5, na comissão especial que discutiu o assunto, com um placar que ninguém esperava: 23 a 11. Foi um massacre.

Também na sexta-feira, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), deu a entender que tudo isso já aborreceu o país. Procurou o presidente do STF, Luiz Fux, o próprio presidente Bolsonaro, além dos titulares de vários partidos políticos, para comunicar que faria um pronunciamento decisivo sobre o assunto. Usando a rede oficial de rádio e televisão, Lira adiantou que a questão será decidida pelo plenário da Câmara, porque essa discussão foi longe demais e tem que ser encerrada com a votação. O voto impresso não tem chance nenhuma de passar no plenário. A oposição ao governo pede que a votação seja urgente para acabar com essa conversa de vez. A semana que começa hoje tem tudo para ser explosiva. Evidentemente que o presidente da República não vai parar com seus insultos e com a mesma conversa de sempre que já encheu. Não dá mais para aguentar esse clima. A semana promete, sem contar com o circo da CPI da Covid, que é um espetáculo à parte. O Brasil não tem paz. Depois da urna eletrônica, o que inventaremos para passar o tempo?

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