STF revela que o Brasil é o único país do mundo que tem 11 Constituições

Supremo Tribunal Federal realizou na quinta-feira uma das sessões mais constrangedoras de sua história, levando a fogueira das vaidades dos ministros a quase incendiar o circo

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 16/10/2020 14h21
Rosinei Coutinho/SCO/STF (03/12/2019) O ministro Marco Aurélio Mello O ministro Marco Aurélio Mello em sessão do Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal realizou na quinta-feira, 15, certamente uma das sessões mais constrangedoras de sua história. Aflorou ali aquela fogueira de vaidades de celebridades que se julgam deuses intocáveis. Em minha vida jornalista profissional – e aí se somam várias décadas -, nunca vi um STF com essa imagem que tem hoje, alguma coisa muito velha, caindo aos pedaços, sem rumos definidos, compromissado ninguém sabe ao certo com o quê ou com quem. Em alguns países que conheço – e não são poucos –, os cidadãos nem sabem os nomes dos que compõem sua suprema Corte de Justiça. No Brasil, infelizmente para todos nós, os ministros do STF se transformaram em celebridade que dão entrevistas a toda a hora e até participaram de programas de variedades. Chega a ser engraçado. No fundo, lá no fundo do fundo dos episódios hilariantes, as coisas acabam sendo engraçadas. E é tudo muito engraçado, porque o STF revela que o Brasil é o único país do mundo que tem 11 Constituições. Uma para cada ministro concluir seus ensinamentos filosóficos, discorrendo aquele linguajar que está muito distante da vida dos pobres mortais que somos nós. 

O placar foi de 9 x 1 em favor da prisão do megatraficante que foi preso depois de foragido por seis anos. E foi preso quando preparava a exportação para países europeus de quatro toneladas de cocaína. Quatro toneladas. Pois nem isso e a condenação de 25 anos de prisão na Segunda Instância serviram para sensibilizar o ministro Marco Aurélio com sua caneta milagrosa. Soltou o bandido e ponto final. Não se fala mais nisso. Não, não é assim, senhor ministro. Não é nem pode ser assim. Eu sou ingênuo demais e ainda acredito no bem senso das pessoas, especialmente daqueles que ocupam cargos fundamentais para o bom andamento de uma nação. Mas, como tenho muitas dúvidas sobre o Brasil ser ou não uma nação, as palavras se tornam inócuas. Atualmente, todas as palavras são inócuas.

A fogueira de vaidades quase incendiou o circo porque o ministro do STF, agora o decano da Corte, Marco Aurélio de Mello, colocou na rua um dos líderes do Primeiro Comando da Capital, bandido perigoso, já condenado a 25 anos de cadeia. Vale lembrar que nos últimos meses, Marco Aurélio soltou outros 79 bandidos do mesmo calibre de acordo com seu critério de avaliação. E diz que a lei é culpada. Pode ser culpada, mas cabe a um ministro dessa estirpe avaliar as circunstâncias e, pelo menos, ter a dignidade de consultar seus pares. O descaramento é tanto que o megatraficante saiu pela porta da frente do presídio, passos vagarosos, abraçou seu advogado, entrou num carro de luxo e saiu livre, leve e solto. Dissera que iria para sua casa, no Guarujá, mas foi para Maringá, no Paraná, onde o esperava um aviãozinho particular para levá-lo para longe do Brasil. Pelo menos alguém fugiu do Brasil. Na verdade, esse episódio de muitos lados, mostra bem o que é o STF, uma casa onde os brilhos se ofuscam uns aos outros e os melindres estão sempre na ordem do dia com aqueles discursos que parecem não ter fim. O ex-Decano, Celso de Mello, certa vez, precisou de dois dias para dar seu voto numa questão. Um voto de 179 páginas. São muitas maravilhas para um país como o Brasil. 

Na quinta-feira, o ministro Marco Aurélio utilizou todo o seu tempo com críticas pesadas ao novo presidente do Tribunal, Luiz Fux, a quem chegou a chamar de autoritário. Para ele, Fux não é presidente de coisa nenhuma e sim um somente “coordenador de iguais”, frase que também já foi utilizada pelo ministro Gilmar Mendes. Não foi preciso muita atenção para notar que o presidente Luiz Fux não engoliu tudo aquilo a seco. E demonstrou isso nas palavras que disse em resposta a Marco Aurélio e também a Gilmar Mendes e todos que demonstraram contrariedade com sua decisão. Não dever ser fácil ser presidente de um Tribunal assim. Fux se controlou, mas nem tanto. E respondeu mais ou menos à altura das ofensas de Marco Aurélio sempre acompanhadas de um risinho debochado, sem nunca esquecer, claro, o “Vossa Excelência”.

Seja como for, essa é a Suprema Corte de Justiça que temos, com ministros partidarizados. Agora estão caçando o bandido, por ordem de Luiz Fux, que cassou a liminar de Marco Aurélio que, ao lado de Gilmar Mendes, gosta muito de agradar bandidos e corruptos de primeira linha. A questão do tal artigo 136 em que Marco Aurélio se baseou para soltar o megatraficante internacional do PCC será melhor analisada, porque os bandidos vêm nessa norma a porta aberta dos presídios. Se o STF vai mesmo fazer alguma correção ninguém sabe ao certo. E não dá para saber mesmo, já que hoje o Supremo Tribunal Federal é uma das casas oficiais brasileiras mais desacreditadas pela população. Todos eles estão de parabéns.

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