Movimento da inflação continua incerto, mesmo com Selic em alta

A possibilidade de a taxa de juros chegar a 7,25% no final do ano existe, mas o relatório Focus desta semana trouxe novamente alta das projeções do IPCA

  • Por Denise Campos de Toledo
  • 09/08/2021 13h45 - Atualizado em 09/08/2021 15h55
José Carlos Daves/Futura Press/Estadão Conteúdo - 25/07/2021 Imagem com uma calculadora, uma seta para cima e moedas representa o aumento da inflação Há quem aposte em mais inflação e mais juros do que indicam as atuais projeções

O Copom acabou confirmando as expectativas do mercado, não só em relação à alta da Selic para 5,25%, mas também com o comunicado mais duro, em que sinalizou a possibilidade de a taxa básica subir além do nível neutro para assegurar a convergência das projeções do ano que vem para o centro da meta. O mercado gostou. Mas, na prática, não houve grandes alterações nos movimentos dos ativos e nas projeções. Mesmo contando com a possibilidade de a Selic chegar a 7,25% no final do ano, o relatório Focus desta semana trouxe alta das projeções do IPCA pela 18ª semana consecutiva. A deste ano subiu para 6,88%, com jeito que pode bater nos 7%, superando muito o teto da meta, o limite de tolerância, que é 5,25%. E, para o ano que vem, apesar do compromisso mais sério do Copom, a previsão subiu para 3,84%, acima do ponto central da meta, que é 3,5%.

A questão é que as pressões inflacionárias continuam sendo renovadas. A semana começou com o IGP-DI da FGV, de julho, subindo 1,45%, ante a expectativa de 1,32% e acima dos 0,11% de junho. Em 12 meses bateu nos 33,35%, no ano acumula 15,91%. O IPA, dos preços no atacado, avançou 1,65% depois de uma animadora deflação de 0,26% no mês anterior. O IPC, que também entra na composição, subiu 0,92%. Commodities voltaram a subir no exterior, como soja e minério de ferro. No varejo, tem alimentos prejudicados pelo clima e tudo mais que tem afetado o poder de compra de todos nós, como as tarifas de energia. Tem mais: o dólar não está respondendo como se esperava à elevação dos juros. O normal seria que, até pelo diferencial em relação às taxas praticadas no exterior, houvesse maior atração para o capital externo. Só que há toda uma combinação de problemas trazendo inseguranças políticas e fiscais, que pioram muito a avaliação do risco país. Risco que pode não ser compensado pela Selic mais alta, reforçando a rentabilidade dos investimentos. Além de não atrair mais capital, pode haver saída, como a Bolsa já registrou no mês passado.

Os impasses políticos entre os poderes, a subida de tom das acusações e alertas entre o presidente e ministros do Judiciário são um fator de incerteza crescente. Por outro lado, se vê concessões demais da equipe capitaneada por Paulo Guedes e propostas que dão a ideia de um menor compromisso com o fiscal, tendo como contrapartida uma postura mais populista e focada nas eleições. O objetivo maior parece ser obter mais recursos para medidas que assegurem maior popularidade, o que passa pela reforma tributária, parcelamento de precatórios, ampliação do Bolsa Família, reajustes do funcionalismo e até utilização de recursos das privatizações. São pautas que ainda serão debatidas pelo Congresso. Mas, com a postura mais gastadora que se tem notado nas formulações relacionadas ao orçamento, difícil imaginar que o discurso de austeridade pregado por algumas lideranças vá prevalecer na prática.

O dólar, em patamar mais elevado, tem sido muito o reflexo desse contexto de incertezas. E nessas condições acaba sendo mais um fator de pressão sobre o comportamento e as projeções de inflação. O certo é que, mesmo com juros mais altos, o comportamento futuro da inflação continua incerto, seja pelos sucessivos choques de preços, seja pelas dificuldades de a política monetária alcançar o resultado esperado. Por isso, há quem aposte em mais inflação e mais juros do que indicam as atuais projeções.

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.