Em meio ao quiproquó da política, a pesquisa Focus já está ultrapassada

Boletim divulgado nesta segunda-feira mostra uma queda mediana das expectativas para o crescimento econômico de 2021 de 3,43% para 3,29%, mas essa previsão não deve valer mais

  • Por Fernanda Consorte
  • 23/02/2021 10h48
Fernando Frazão/Agência Brasil Mudança nos valores dos combustíveis está atrelada a variação do petróleo no mercado internacional e a oscilação do dólar Mercado financeiro responde duramente à intervenção na Petrobras

Nesta segunda-feira, 22, o Banco Central divulgou sua tradicional pesquisa Focus semanal. Ela mostra uma queda mediana das expectativas para o crescimento econômico de 2021 de 3,43% para 3,29%. Uma queda modesta, na minha opinião, considerando todo o quiproquó político que o Brasil está envolvido ao passo que a pandemia corre solta por aí e a vacinação contra a Covid-19 engatinha. Ou seja, essa nova expectativa já está ultrapassada. O governo Bolsonaro foi eleito sob uma bandeira liberal, com seus superministros e pensamentos que iam de ajustes de contas fiscais a privatizações. Mas isso não tem acontecido. Podem culpar a pandemia, 2020 e sua conjunção rara de astros, porém as medidas populistas cada vez mais claras tomadas pelo governo são bem distintas da receita já prescrita para o final da crise (as vacinas e a atração de investimentos.)      

Ora, me cabe então concluir que essa envergadura não tão liberal já estava no DNA do governo e fala cada vez mais alto em detrimento do pensamento inicial. Não acho que já estava arquitetado, mas talvez a única saída de crises para governos populistas sejam justamente medidas populistas. A intervenção na Petrobras com incitações de novos movimentos em outras empresas estatais, como Banco do Brasil e Eletrobras, parece um estouro de quem estava contido numa cartilha dita “liberal”. O problema é que o mercado financeiro responde a isso duramente, bravamente, e coloca preços num patamar que nos diz “olhem, o Brasil já não está legal, com essas medidas, vai ficar pior”. Na segunda-feira pela manhã, a taxa de câmbio brasileira, grande medida de aversão ao risco, mostrava uma alta de mais de 2%, enquanto as outras moedas sugeriam uma piora do humor internacional, mas muito mais contidas. Até a Bolsa de Valores, que vinha se beneficiando de uma taxa de juros baixa no país, não aguentou as investidas do governo. 

Não sou do time que acha que mercado financeiro é soberano, mas também não acho que seja somente um “rebanho eletrônico”; talvez a sinalização esteja piorando e muito, depois de um ano muito conturbado. E quando isso chega na economia real? Pela confiança, pela decisão de não se investir, de se contratar, pelo pensamento de deixar esperar a coisa esfriar, e pela morosidade das coisas (vacina que não chega, reforma que não sai). Quando percebermos, o primeiro trimestre já foi, meio do ano chegou, e o PIB não cresceu. Não deu tempo. Ficou para 2022. Olhando o caminhar dessa carruagem chamada Brasil, eu acho que 3,29% já era.

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