Brasileiros lesados pela inflação precisam questionar a catastrófica indexação da economia

Modelo de cálculo dos índices que reajustam os preços e contratos no país deveriam ser questão obrigatória nas discussões para disputa ao Palácio do Planalto

  • Por Jorge Serrão
  • 13/12/2021 16h00
Aloisio Mauricio/Fotoarena/Estadão Conteúdo - 26/10/2021 Feirante coloca a mão na testa, em frente a uma barraca de laranja, e duas placas de preço Os preços de compra de alimentos em regiões produtoras não são afetados da mesma forma que nas metrópoles

Na Inglaterra, em 2021, a alta nos preços dos alimentos está chegando aos absurdos 13.000%, mas o índice da inflação anual medida em outubro de 2021 atingia apenas 4,2%. Os burocratas e tecnocratas brasileiros não conseguem explicar ou entender esses fatos. A inflação de oferta ocorre em todo o mundo, como efeito de medidas tomadas na pandemia de Covid-19. Faça você mesmo a sua pesquisa. Dá um Google aí e verá que o problema é generalizado. Mas, no Brasil, tem um defeito específico: será que os índices inflacionários refletem a realidade? Como a “inflação” no maior produtor de alimentos do mundo é divulgada como mais alta que em qualquer outro país? Chegou a hora de repensar o modelo e a metodologia de indexação da economia brasileira. Um país continental tem de respeitar sua estatura geográfica, econômica e social.

No Brasil, os contratos celebrados para remunerar o capital e o mundo dos negócios (pelo menos em tese) seguem as regras do livre mercado. E os índices e indicadores de correção monetária são vários: IPCA, INPC, IGPM, IPC, IPCA-E e por aí vai. Contratos públicos e privados são reajustados por esses índices que são nacionalizados. Ou seja, considera-se que, através de uma certa metodologia, uma determinada equação é possível fazer equivalência entre a alta dos preços da Grande SP, Grande RJ, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, Sinop, em Mato Grosso, Porto Velho, em Rondônia, Uberlândia, em Minas Gerais, em Caruaru, em Pernambuco, e Goiânia, em Goiás.

A porca torce o rabo quando se enfrenta uma inflação de oferta como a atual, na qual a alta do preço dos alimentos é decorrente de problemas de sazonais, problemas de logística e descontrole da cadeia produtiva. Assim, fica claro que índices nacionais não passam de abstração intelectual e acadêmica que afeta criminosamente a vida de milhões de famílias brasileiras. Um país continental, com realidades tão diferentes, com características econômicas e produtivas tão heterogêneas, não pode ser definido em um único índice ou indicador ou por percentuais calculados de modo tão parecido.

Os alimentos nas regiões ricas do agronegócio não tiveram seus preços afetados da mesma forma que nos centros urbanos de São Paulo e Rio de Janeiro. Mas é isso que o INPC ou o IPCA tentam nos fazer acreditar. As regiões grandes produtoras de proteína animal, produtoras de arroz, milho, feijão e de frutas diversas, não sofrem a mesma alta de preços que a Grande SP. Na verdade, adotar índices nacionais só serve para indexar preços administrados e que beneficiam o rentismo promovido pela oligarquia medieval brasileira. Transformaram as empresas do setor elétrico, de fornecimento de água, combustíveis, pedágios e aeroportos em sociedades com acionistas que corrigem as tarifas por índices inflacionários nacionalizados, padronizados, que penalizam a população e os consumidores.

Os grandes centros urbanos e suas regiões metropolitanas concentram aproximadamente 45 milhões de habitantes, ou seja, cerca de 20% da população brasileira. Generosamente podemos arredondar para 25% da população. Por isso, cabe perguntar: qual o sentido de impor aos demais 75% dos brasileiros um fator de correção monetária que não tem nada a ver com a sua realidade? Esse absurdo é imposto ao povo desde os anos 1970 neste nosso Brasil. Machucamos e maltratamos 170 milhões de brasileiros, todos os meses, utilizando uma fábula ou abstração acadêmica concebida pela cabeça de pseudointelectuais da tecnoburocracia.

A alta dos alimentos apenas evidencia a falha deste modelo. Os preços de compra de alimentos ou mesmo alugar um imóvel nas cidades de Cascavel-PR, Corumbá-MS, Santa Maria-RS, Blumenau-SC ou Petrolina-PE não foi afetado da mesma forma que nas metrópoles brasileiras. O tema precisa ser debatido seriamente. Um aluguel em Sinop, em Porto Velho, em Caruaru não pode estar indexado ao mesmo índice que os aluguéis na Grande São Paulo ou Grande Rio de Janeiro. É um crime de extorsão econômica praticado contra as famílias trabalhadoras. Essa indexação gera distorções perversas que punem as famílias. Essa indexação é uma herança maldita imposta aos brasileiros pelos senhores feudais que se acham “donos do poder”. Há décadas, foram impostos à sociedade brasileira os índices nacionais de inflação. Uma sorrateira e sórdida forma com a qual nossa oligarquia medieval encontrou de enriquecer, empobrecendo ainda mais nossa população, através de uma injusta indexação da economia. A regra é clara. Se a economia capitalista é baseada em convenções e contratos – formais e informais, as regras destes contratos definem como a riqueza gerada no país será distribuída. Passou da hora de repensar o modelo. O assunto precisa entrar na pauta da campanha eleitoral.

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