A transição catalã (para onde?)

  • Por Caio Blinder/Jovem Pan
  • 06/10/2017 09h01
EFE Parece-me difícil a esta altura do jogo recolocar a transição em trilhos mais consistentes

Nos anos 70, a Espanha deu uma lição ao mundo sobre como fazer uma transição, a transição da ditadura franquista para uma democracia ao estilo europeu. Quarenta anos mais tarde, as lições de como negociar parecem esquecidas e não sabemos exatamente qual será o rumo da transição catalã.

O ardor dos secessionistas catalães culminou num referendo de números enganosos: 90% de apoio à independência, mas apenas 42% de participação eleitoral, ou seja, a maioria dos eleitores não endossa o divórcio com a Espanha.  Em termos meramente técnicos, o caótico referendo de domingo passado foi ilegal. Nem se fala então da decretação unilateral de independência prometida para a semana que vem.

O movimento secessionista tem uma massa cheia de convicções nas ruas. Isto não quer dizer que tenha apoio esmagador da população catalã (e vamos lembrar que gente de todas as partes da Espanha e do mundo vive na Catalunha). O ardor da mobilização foi esquentado pela reação truculenta do governo central, agora mal casada com a irresponsabilidade das autoridades da Catalunha.

A radicalização secessionista e a truculência de Madrid tornam anacrônicas ideias que pareciam dignas de negociação na semana passada, como autonomia reforçada para a Catalunha. A truculência levou a exageros da outra parte, como acusar o governo de Mariano Rajoy de reeditar métodos franquistas. Eu vejo mais como uma atuação desastrada para refrear o ímpeto secessionista. É um erro de custo alto.

Para onde vamos agora? Há pouco mais de 20 anos (Canadá e Quebec) e em 2014 (Grã-Bretanha e Escócia) tivemos um comportamento maduro. Nações democráticas dispostas a aceitar a possibilidade de divórcio. Não aconteceu e imagine que, no caso do referendo de Quebec em 1995, somente 50,58% votaram contra a independência.

A realidade hoje na Catalunha se revela mais dramática, imprevisível e ágil, diante do cenário de decretação unilateral de independência na semana que vem.  A Europa toma susto atrás de outro. Basta lembrar o que foi o Brexit no ano passado.

Parece-me difícil a esta altura do jogo recolocar a transição em trilhos mais consistentes. Uma proposta no ar é os dois lados aceitarem a realização de um novo referendo com um patamar de no mínimo 60% de votos a favor da independência para ser, não apenas legal, mas legítimo e robusto.

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