Nada mais sintomático desta geração mimada, cega e ressentida do que queimar igrejas no Chile
O ressentimento que nasce deste clamor de vingança e confunde os desvios da civilização cristã com o cerne do cristianismo é o ressentimento de uma geração que não aprendeu a amadurecer com o sofrimento
A base da civilização nos últimos 2000 anos é o cristianismo. O humanismo cristão gerou valores para além da própria justiça. A percepção cristã de que o homem nasce imperfeito, rudimentar, instintivo e que pode alcançar o esboço do sublime numa aprendizagem permanente é o pilar do humanismo moderno, da construção do respeito ao outro. A misericórdia cristã é o reconhecimento mútuo da nossa miséria humana em comum. Misericórdia é a concórdia pela miséria compartilhada, observada e mutuamente criticada. A misericórdia nos ajuda a perdoar e construir um mundo melhor pelo prazer da doação, da melhoria de nossa íntima condição pela mútua observação e perdão de nossas falhas em comum. A misericórdia nunca cancela o outro. O sofrimento, as perdas, injustiças, são todas ferramentas de aprimoram o caráter neste sentido. A civilização cristã é uma tentativa permanente de construção de misericórdia e compaixão. O trabalho – sobretudo o trabalho de construção de elos afetivos ao redor – torna-se um sacrifício de prazer em nome da melhoria de vida do outro. Do ponto de vista pragmático, é mais que funcional: se um ajuda o outro, todos nos ajudamos. E todos melhoramos.
Há desvios, claro, mas estes desvios são a própria base do cristianismo. O cristão sabe que não existe natureza humana perfeita. Por isto sua humildade. O cristão percebe que pode haver – e há – desvios dentro da própria Igreja, inclusive. Mas é por estes desvios mesmos que uma pessoa melhora, se aprimora. Uma sociedade perfeita, sem sofrimento e desvio não precisaria do cristianismo. Uma sociedade perfeita seria uma sociedade zumbi em sua alegria anódina permanente. A imperfeição nos empurra para a busca de um sentido. E o sentido de vida cristã é o outro. A ajuda permanente ao outro. Mas aí vem um sujeito chamado Jean Jacques Rousseau e diz que a civilização corrompe o homem, que nasceria bom. Mentira. Uma criança é uma tabula rasa, que se preenche com boa ou má educação, boa e má índole. Desta mentira, inverte Rousseau, a culpa do pecado original – que faz o homem buscar sua superação e busca de sentido transmuta-se em culpar os outros, em culpar a civilização, a própria civilização cristã por suas misérias pessoais. O ressentimento nasce deste clamor de vingança que confunde os desvios da civilização cristã com o cerne do cristianismo.
Cerne este que incentivou o trabalho mútuo de melhoria da vida da humanidade, na ciência, medicina, tecnologia, caridade etc. Ao longo de séculos, a vida no mundo da civilização cristã ocidental melhorou substantivamente. Hoje temos menos guerras, menos fome, menos miséria, em enorme parte pelo senso de cooperação cristã que incentiva mesmo os não cristãos a trabalharem uns pelos outros. Muitos privilégios conquistados à base de luta hoje são dados de graça e generosidade a esta nova geração. O mundo segue imperfeito. Mas comparem o mundo de hoje com o do passado. Muito melhor, não? Menos problemas em uma geração criam outros problemas: o mimo, por exemplo. Uma geração que crê que o que foi conquistado a duras penas por gerações anteriores acaba crendo que o que lhe foi dado como presente – à custa de trabalho – seja um direito nato.
Nada mais sintomático desta geração mimada, ressentida e cega aos valores cristãos que criaram a civilização ocidental e seu conforto que queimar igrejas no Chile. O Chile tem um dos mais elevados índices de desenvolvimento humano e econômico da América Latina. De repente, por um preço de passagem de ônibus (uma imperfeição em meio à construção da civilização), pipocam protestos beligerantes que visam derrubar governo e queimar igrejas, depredar instituição, revirar casas e pessoas. Queimar, enfim, a casa de Cristo, que é o pai fundador do conforto das novas gerações. O ressentimento deste pseudoprogressismo mimado que confunde os desvios de uma sociedade imperfeita; que confunde os desvios do cristianismo com o próprio cristianismo, cristianismo este que gerou o trabalho da compaixão, é o ressentimento de uma geração que não aprendeu a amadurecer com o sofrimento, que rejeita o próprio sofrimento como um mal herdado da civilização cristã. Civilização esta que embala o conforto desta geração mal agradecida. Uma civilização cristã que os ensinou o valor da compaixão e tolerância. Que eles negam, assim como Rousseau, o pai do ressentimento satânico, nega o valor da gratidão pelos pilares da civilização que o gerou , embalou – e mimou.
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