A uma plateia amiga, Lula discursou um amontoado de mentiras
Bastou o ex-presidente iniciar a campanha eleitoral para Jair Bolsonaro virar um defensor da vacina e da máscara
Ei-lo de volta num discurso em tom moderado para uma plateia favorável, como sempre tem sido nos últimos anos. Luiz Inácio Lula da Silva sabe que não pode falar em lugar nenhum se o auditório não for de amigos. Sequer poderá dar uma volta no quarteirão, porque corre o risco de ser agredido pelo mal que fez ao Brasil, chefiando uma das maiores quadrilhas de corruptos da história do mundo. Com a ajuda do STF, particularmente do ministro Edson Fachin, teve duas condenações anuladas e anda agora leve e solto, como um sábio dos subúrbios, dizendo o que lhe vem à cabeça como se fosse o nome mais importante da política brasileira. Não é. Desta vez, Lula foi longe demais ao dizer que a Lava Jato ajudou na morte de sua ex-mulher, dona Marisa. Foi longe demais. O tom do discurso para os amigos ele deu logo no início, dizendo ser vítima da maior mentira jurídica da história de 500 anos do país. E nesse clima tirou a máscara vermelha com a estrelinha do PT, dizendo que o fazia depois de se orientar com seu médico, já que discursaria falando a dois metros de distância das pessoas.
Em seguida, incriminou o ex-juiz Sergio Moro, chamando-o de mentiroso tido como herói nacional. Fez comentários sobre o governo de Bolsonaro, especialmente no que diz respeito ao desempenho frente à pandemia. Pelo menos nesse momento, não mentiu. Naquele amontoado de mentiras que discursou por quase duas horas, salvaram-se as críticas à conduta de um governo Bolsonaro que entregou a população à própria sorte, que desacredita na vacinação, que desde o aparecimento do coronavírus chegou a debochar do problema, tratando com descaso a doença e zombando dos que demonstravam medo, chegando a chamar o Brasil de “terra de maricas”. Informou que vai vacinar-se e chamou Bolsonaro de “fanfarrão”, assinalando que o Brasil não tem governo. Quanto à vacinação, Lula pediu ao povo para não seguir nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. E insistiu que todos devem tomar a vacina, dizendo que esse deve ser o tratamento de um presidente da República para seu povo. E exatamente nesta quarta-feira, 10, Bolsonaro presidiu uma cerimônia no Palácio do Planalto para comprar de vacinas.
Vestido a caráter, com elegante máscara branca, assinou os documentos, mas não deixou de fazer a propaganda de seu “tratamento precoce”, citando os nomes de todos os medicamentos que disse ter usado e que todos deveriam usar. Houve uma mudança repentina de comportamento. No Rio de Janeiro, algumas pessoas tendo à frente os filhos de Bolsonaro, distribuíram cartazes dizendo: “Nossa arma é a vacina”. O que será que aconteceu? Por mais que o ex-presidiário e ex-presidente agora solto, ainda sem destino certo, seja hoje rejeitado, seu discurso fez acordar um governo que leva tudo na flauta, o chefe e seus três filhos. Fora isso, o discurso de Lula foi apenas um arremedo do que fala sempre desde 1960, mudando algumas palavras. Aquela coisa rancorosa. O discurso foi ameno, mas lá no fundo notava-se um rancor jurando vingança, especialmente ao ex-juiz Sergio Moro, que colocou na cadeia muitos daqueles que nunca imaginaram que um dia isso poderia acontecer. Moro também é uma vítima de Bolsonaro, simplesmente porque acreditou. Lula chamou a Lava Jato de “quadrilha”, jurando que nunca teve nenhum envolvimento com os bandoleiros que depenaram a Petrobras. Nenhuma vez falou no Mensalão. Defendeu o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 para a população que perdeu tudo na pandemia. E disse que o auxílio é uma luta do PT, “para que as pessoas não morram de fome”.
Luis Inácio da Silva também criticou duramente o ministro da Economia Paulo Guedes que vive falando em privatizar tudo. Afirmou que quem gosta de privatização não deve votar nele, porque ele, como chefe de governo, não vai privatizar nada. Nesse ponto já era um discurso oficial de quem parecia estar na cadeira principal do Palácio do Planalto. Em certo momento, Lula fez um afago especial à turma do centrão, da qual quer se aproximar. “Não tenham medo de mim”, chegou a dizer. Durante o discurso, Lula defendeu a liberdade de imprensa, segundo ele uma das razões principais para a manutenção da democracia. No entanto, não lembrou à plateia amiga que seu governo tentou por três vezes calar a imprensa com regulamentações que na época dizia ser necessárias. Isso preferiu não falar. Mas aproveitou o momento para criticar o Jornal Nacional da Rede Globo que, conforme observou, sempre mentiu sobre ele, mas, na terça-feira, 9, apresentou um noticiário, segundo ele, contando toda a verdade que prevaleceu.
Lula aproveitou a brecha deixada e esquecida por Bolsonaro: prestou solidariedade às vítimas do coronavírus, aos familiares das vítimas, ao pessoal da saúde, público e privado, sobretudo para os heróis e heroínas do SUS. Não foi aquele discurso raivoso de sempre. Não foi. A raiva estava no conteúdo, uma raiva silenciosa, com críticas a quase tudo, passando a ideia à plateia amiga de que apenas ele poderá salvar o Brasil. No final, sobrou aquela sensação de que alguma coisa estava por acontecer. Se é verdade, ainda não aconteceu. O discurso nesta quarta-feira, 10, no Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC, em São Paulo, mostrou o mesmo Lula de sempre, dono de todas as verdades do mundo, o maior conhecedor dos problemas brasileiros. Em nenhum momento ele fez um “mea culpa”, nem se referiu ao PT que afundou o país dentro de um poço com tanta corrupção. O que ficou definitivamente patente é que a campanha eleitoral já começou. Tanto que Bolsonaro é hoje certamente um defensor da vacina e do uso da máscara contra o vírus. Nada como um dia após o outro. As coisas mudam de repente.
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