Até a vacinação contra a Covid-19 virou um ato político em que vale tudo
Na terça feira, 19, Bolsonaro anunciará ao país quais serão as vacinas aprovadas, numa cerimônia gloriosa, mas Doria quer se antecipar a isso; a ordem agora é ser o primeiro
A disputa está cada vez mais acirrada. Mas isso mostra a nossa pobreza. A nossa verdadeira inutilidade. A guerra pessoal entre o presidente Bolsonaro e o governador de São Paulo João Doria está próxima do fim. Mas não se sabe ainda o que poderá acontecer. Os contendores estão dispostos a tudo, em obediência a uma vaidade sem tamanho. O Ministério da Saúde estuda a realização de uma cerimônia com ares de festa para terça-feira, 19, com a presença de Bolsonaro, quando anunciará oficialmente o início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil, marcada para quarta-feira, 20. João Doria está louco. E afirma que se isso de fato ocorrer, ele vai esquecer a data de 25 de janeiro, para dar início à vacinação em São Paulo. Doria deixa claro que antecipará a data para sair na frente do governo federal. João Doria quer entrar para a história como o primeiro a iniciar a vacinação no Brasil. Basta que a CoronaVac tenha a aprovação da Anvisa, Doria mudará a data. Mas quem não deseja isso é o presidente Bolsonaro. Tanto que já determinou que o Ministério da Saúde se vire. Bolsonaro quer seu o primeiro.
Aliás, o presidente anda meio desesperado desde quando João Doria marcou o início da vacinação em São Paulo para o dia 25 de janeiro. O presidente começou a ter pesadelos com seringas, agulhas, vacinas, essas coisas todas assustadoras, especialmente para os espíritos sensíveis como o dele. Bolsonaro sabe o que significará João Doria sair na frente. Será um palanque e tanto para discursos inflamados na campanha eleitoral de 2022. Bolsonaro está olhando feio para o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello. Isso não pode acontecer. O governo federal – leia-se Bolsonaro – tem de sair na frente, mesmo tendo tratado o vírus, a doença e as mais de 207 mil mortes no Brasil com descaso. No próximo domingo, 17, a Anvisa vai decidir sobre a aprovação das vacinas no Brasil. E entre elas está a “vacina chinesa do Doria”, como diz Bolsonaro, a CoronaVac, produzida pelo laboratório chinês Sinovac e o Instituto Butantan, de São Paulo. Na terça feira, 19, Bolsonaro anunciará ao país quais serão as vacinas aprovadas, numa cerimônia gloriosa. Mas Doria quer se antecipar a isso. Pretende fazer uma cerimônia igualmente festiva na segunda-feira, 18, ou na própria terça-feira, 19, na mesma hora da cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília.
Nesta quinta-feira, 14, o ministro Pazuello se reuniu com prefeitos de várias regiões do país e informou que a vacinação no Brasil será iniciada na quarta-feira, 20. A data foi comunicada pelo ministro à Frente Nacional de Prefeitos, adiantando que, até lá, 8 milhões de doses serão distribuídas aos Estados que abastecerão os municípios. Como infelizmente não se pode levar nada a sério no Brasil, essa informação carece ainda de muita conversa e reuniões em que as coisas se complicam. Pergunta-se: o ministro marcou o início da vacinação para o dia 20, mas já se acertou com a Anvisa? E se a Anvisa não aprovar as vacinas, como é que fica? Ou não fica? Ou o ministro já sabe do resultado da análise? Ainda nesta quinta-feira, 14, a Anvisa solicitou mais documentos sobre as vacinas. É muita desinformação que chega a ser um deboche. Mas se de fato a vacinação do governo federal começará na quarta-feira, 20, como diz o ministro, João Doria já está mexendo nas peças do seu tabuleiro para fazer a sua festa na terça-feira, 19. A ordem agora é ser o primeiro.
Já se sabe que Bolsonaro não se vacinará, a exemplo de vários líderes mundiais que foram vacinados com fotografias distribuídas ao mundo como exemplo. Como passou o tempo todo falando mal de tudo, inclusive da vacina, o presidente se nega a vacinar-se. Diz que não precisa de vacina nenhuma. É um atleta. E já pegou o vírus. Não precisa ser vacinado contra nada. Bolsonaro tem passado seu tempo útil não governando o país, mas desacreditando todas as vacinas. Na cabeça dele é tudo mentira. O vírus não existe. Não existe nada. E o que se espera do outro lado do ringue? Espera-se um João Doria sorridente, levantando a manga da camisa para que uma enfermeira aplique a vacina tão esperada por uma população que só espera o fim disso tudo para voltar à vida e ao trabalho. Doria se vacinará e tudo será documentado em fotos e vídeos que preencherão o noticiário e os espaços fotográficos dos jornais e das revistas. Bolsonaro terá de engolir. E engolirá seco. E João Doria será declarado vencedor. Será mesmo assim? Até a vacinação se transformou num ato político em que vale tudo. Os doentes e os mais de 207 mil mortos serão, nesse momento de tanta glória, um assunto jogado a segundo plano. O que realmente importa nesse vale de lágrimas é o primeiro lugar.
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