Brasil intensifica processo de “privatização” da segurança
Manuel Pérez Bella.
Rio de Janeiro, 15 abr (EFE).- Com grades na porta de cada edifício residencial dos bairros endinheirados das grandes capitais e um exército de vigilantes privados que quintuplica os agentes de seguranças nas ruas, o Brasil aumenta a despesa com segurança privada com a deterioração dos índices de violência.
O faturamento do setor cresceu nos últimos anos a taxas que superam o 10% anual, apoiada principalmente na expansão de segmentos como a blindagem de veículos, os sistemas eletrônicos e os seguranças particulares, o que, segundo analistas, conduz a uma “privatização” da segurança.
Segundo dados do setor, o investimento privado supera o gasto público acumulado pelos três níveis de governo que, juntos, desembolsaram R$ 61,104 bilhões em 2012.
Este número, segundo a ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública, é enganoso, já que 37% dessa soma se dedicou a pensões e seguridade social dos policiais e não a políticas “efetivas” de segurança.
As regiões onde acontece a mais rápida expansão da segurança privada são os estados do Nordeste e o Amazonas, áreas com crescentes taxas de violência e onde mais escasseiam os investimentos públicos, segundo as patronais do setor.
Não em vão, Maceió, Fortaleza e João Pessoa são a quinta, sétima e nona cidades com as taxas de homicídios mais altas do mundo, segundo um relatório da ONU divulgado na semana passada.
“A sensação de insegurança alcançou os brasileiros de todas as regiões do país. A blindagem (de veículos) deixou de ser uma necessidade exclusiva de São Paulo e Rio de Janeiro”, afirmou à Agência Efe o presidente da Associação Brasileira de Blindagem (Abrablin), Laudenir Bracciali, em comunicado.
A blindagem de veículos registrou uma expansão de 11,55% no primeiro semestre de 2013, segundo os dados mais recentes da Abrablin, que calcula que essa taxa de vendas seguiu forte durante todo o ano.
A blindagem mais habitual, considerada a “mais adequada à atual realidade” das grandes cidades brasileiras, é o nível III-A, que suporta tiros de submetralhadoras, de pistolas 9 milímetros e revólveres Magnum de calibre 44.
O custo médio para blindar um veículo com este nível é de R$ 47.300, segundo números da patronal, que registra oito anos de expansão contínua.
Embora esses preços sejam acessíveis para poucos bolsos no Brasil, o investimento em segurança privada não se restringe às classes poderosas, segundo explicou à Efe o sociólogo Ignacio Cano, do Laboratório da Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
“A classe baixa também investe em segurança: em grades, em cachorros; a classe alta, em (carros) blindados, sistemas eletrônicos e seguranças particulares”, relatou Cano.
O número de seguranças particulares se elevou consideravelmente nos últimos anos, em parte com o impulso da Copa do Mundo de 2014 e também pela expansão de hotéis, shoppings e bancos.
Segundo dados enviados pela Polícia Federal à Agência Efe, o Brasil tem atualmente 2,3 milhões de seguranças particulares registrados, número que não inclui centenas de milhares que trabalham de forma clandestina, entre eles policiais que fazem horas extras em lojas ou bares devido aos baixos salários pagos pela corporação.
O número de seguranças particulares contrasta com os 400 mil policiais que integram os 27 corpos estaduais da Polícia Militar.
O grande número de seguranças particulares e a habitual concentração dos policiais nos bairros ricos gera, na opinião de Cano, “uma privatização dupla da segurança”.
“As classes médias aqui contratam segurança privada e exigem, com sucesso, que a polícia também vigie as mesmas áreas”, comentou Cano, destacando que nos bairros periféricos a taxa de policiais por habitante “é muito baixa”.
O emprego de policiais como seguranças particulares clandestinos representa uma reviravolta mais neste processo de privatização.
“O que o Estado faz é o que está financiando a segurança privada”, resumiu Cano, indicando que estes policiais foram treinados e usam armas pagas com dinheiro público.
“Nós defendemos que, já que não se pode eliminar esta prática, pelo menos que se regularize”, acrescentou o sociólogo. EFE
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