Entenda por que a Psiquiatria precisa da Filosofia
Um dos motivos é que ainda há uma crescente pressão da indústria para a medicalização de indivíduos que buscam atingir seu melhor desempenho e estarem alinhados a uma cultura da performance e do mérito
Os professores Kendler e Parnas fizeram um encontro na Dinamarca para discutirmos “Por que a Psiquiatria precisa da Filosofia?”. Dentre as respostas para esta difícil pergunta, estiveram: porque o adoecimento mental é presente e crescente na sociedade contemporânea; porque apesar da Psiquiatria ser fundamental na compreensão e cuidado de pessoas em sofrimento emocional, temos enfrentado um enorme reducionismo causal para a manifestação dos transtornos; porque há uma crescente pressão da indústria para a medicalização de indivíduos que buscam atingir seu melhor desempenho e estarem alinhados a uma cultura da performance e do mérito. Ainda há muito o que evoluirmos na compreensão etiológica, ou seja, no estudo das causas de determinados transtornos mentais como, por exemplo, da depressão maior, abuso de substâncias, esquizofrenia e transtornos de personalidade.
As publicações científicas em revistas de renome somente aumentam as áreas de estudo e compreensão dos fenômenos mentais, passando pela perspectiva biológica (molecular, celular, neuronal, inflamatória), comportamental e psicológica, com uma série de construtos envolvidos no funcionamento do humor, cognição, afeto e memória, sem contar a influência de importantes aspectos sociais na saúde mental do indivíduo como a família, relacionamentos, violência, adversidades vividas na infância, cultura, etnia e processos socioeconômicos. A Psiquiatria precisa da Filosofia também porque embora nossos tratamentos sejam melhor compreendidos e mais eficazes do que há duas ou três décadas, eles estão longe de ser curativos, nem mesmo temos a total compreensão de como eles funcionam; porque dificilmente há um campo prático e teórico da Medicina mais amplo que a Psiquiatria; e, por fim, porque a percepção do mundo é influenciada por nossas concepções teóricas sobre ele.
Além de médicos bem formados, temos de nos preocupar em discutir e questionar o impacto emocional de se viver em tempos de predominância do eu, hiperconectividade, guerra, pandemia, pobreza e do preconceito. Diante dessa complexidade, tem sido crescente o ganho da indústria do bem-estar e do número de oportunistas de todas as áreas se apropriando do tema da saúde mental para dar dicas de sucesso e enfrentamento breve. Vale dizer que o campo da saúde mental é complexo e não representa apenas a ausência de doença mental, mas sim, um estado de bem-estar em que as pessoas realizam suas atividades, conseguem enfrentar o estresse da vida diária, trabalhar adequadamente, render frutos do seu trabalho e ser capaz de contribuir para a sua comunidade.
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