Mesmo com economia fraca, já é hora de o Banco Central elevar os juros
Não dá para fazer de conta que as pressões inflacionárias são apenas passageiras, isso só reforçaria o ambiente de incertezas no país
Nesta semana, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) deve voltar a elevar os juros básicos. A aposta dominante é de uma alta de 0,5 ponto na Selic, que vem sendo mantida no patamar histórico de 2% desde agosto do ano passado. Pode parecer estranho falar em alta dos juros quando se vê a economia perdendo ritmo diante do agravamento da pandemia, com mais medidas restritivas às atividades, isolamento, desemprego elevado e sem o robusto auxílio emergencial que, em 2020, nos fez acreditar em uma recuperação em V. Mas o fato é que a persistência de fatores que pesam na formação de preços aumenta o risco de a inflação ganhar novo impulso, o que também é muito nocivo do ponto de vista econômico e social. Melhor não deixar o gigante acordar.
Depois de uma fase, no começo da pandemia, em que tivemos até deflação, uma sucessão de fatores tem mantido a inflação acima das projeções. São os aumentos de commodities no exterior, desde alimentos até minério de ferro, passando pelo petróleo. Houve também um desequilíbrio entre oferta e demanda no âmbito doméstico, em boa parte porque não se confiava numa reação mais rápida da demanda e as empresas deixaram os estoques cair. Por outro lado, tem a questão de custos e falta de insumos e componentes para a indústria, o que também afeta os preços. E tem o câmbio. O real foi das moedas com pior performance no ano passado, muito reflexo das incertezas, que ainda se mantêm, quanto à evolução das contas públicas, as condições de controle da pandemia, as inseguranças institucionais e jurídicas, que vão desde intervenções na Petrobras e Banco do Brasil até a anulação dos processos do ex presidente Lula. Fora pressões externas, como a alta dos juros do treasuries, títulos americanos, pela perspectiva de retomada mais forte da economia dos Estados Unidos, o que pode desviar recursos de outros mercados, especialmente dos que ofereçam maior risco.
Para um país que já entrou na pandemia com dificuldades para engatar um ajuste mais sério das finanças e avançar com reformas estruturais, 2020 e este começo de 2021 só fizeram aumentar o potencial de riscos do Brasil. A PEC Emergencial poderia ser um marco para a redefinição de rumos. Mas, da forma como foi desidratada, mesmo que assegure uma perspectiva melhor, em prazo mais longo, e viabilize a volta de um auxílio emergencial menos robusto, deu uma boa indicação do que se pode ter de dificuldade no encaminhamento da agenda de reformas. Enfim, do ponto de vista dos fatores que têm levado à pressão sobre o dólar, não se pode contar com maior alívio, o que, por sua vez, aumenta a possibilidade de a inflação continuar pressionada. As projeções não param de subir e é por aí que o Banco Central, agora com autonomia, deve trabalhar. Mexe nos juros, mostrando que está atento, esfria especulações e começa a calibrar o ritmo da demanda lá na frente, mais para 2022. As mexidas nos juros básicos levam um tempo para fazer efeito. É ruim subir juros num ambiente de atividade ainda fraca? É. Podemos estar flertando com a estagflação? Sim. Mas não dá para manter juros cada vez mais negativos, fazendo de conta que as pressões inflacionárias são apenas passageiras. Isso só reforçaria o ambiente de incertezas, que colabora muito para pressões como do dólar. É esperar que haja espaço político para seguir adiante com a pauta prioritária da economia, além do controle da pandemia, com muita vacinação, para que um cenário mais favorável, para a inflação, não dependa tanto do aumento dos juros.
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