Piora geral das projeções reflete desafios maiores para a economia

Boletim Focus desta segunda mostra piora nas previsões para inflação, crescimento, juros e dólar, mas o mais preocupante é a contaminação das expectativas para 2022

  • Por Denise Campos de Toledo
  • 06/09/2021 13h05
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Pixabay Cédulas de real espalhadas Em meio a todas as incertezas, o mercado elevou a projeção média da inflação deste ano para 7,58% e a do ano que vem para 3,98%

O mercado financeiro não para de piorar as projeções para os vários indicadores da economia. Foi o que mostrou o relatório Focus desta semana, divulgado pelo Banco Central. Houve piora das projeções de inflação, crescimento, juros e dólar. O mais preocupante é a contaminação das expectativas para 2022. A previsão de inflação teve o reforço do aumento de energia anunciado na semana passada, que está valendo agora em setembro. Além do impacto direto do reajuste das tarifas para o consumidor, ainda pode ter o indireto, pelo repasse dos custos maiores para as empresas, que ainda convivem com pressões da falta e alta de preços de vários insumos. E os preços que subirem agora não vão devolver a alta no ano que vem, mesmo que um bom período chuvoso permita a mudança na bandeira tarifária. Por outro lado, ainda há dúvidas quanto ao custo dos alimentos, com a oferta também prejudicada por fatores climáticos e a evolução dos preços da gasolina, diesel e gás, que dependem muito das condições externas e do dólar. Dólar cuja instabilidade está muito relacionada ao cenário político, mesmo que a perspectiva de juros em alta garanta um maior ingresso de investimentos no país e até a internalização de recursos das exportações, o que pode exercer alguma pressão baixista.

Fato é que, em meio a todas essas incertezas, o mercado elevou a projeção média da inflação deste ano para 7,58% e a do ano que vem para 3,98%. Como destaquei, preocupa mais a de 2022, que vai se afastando do centro da meta, que é 3,5%. Sendo que para 2021 já tem muitos analistas trabalhando com algo acima de 8% que, até pela indexação ainda muito presente na nossa economia, pode ter maior repercussão nos índices do próximo ano. Diante disso, claro, se espera um aperto maior na política de juros do Banco Central. A projeção da Selic para este ano foi ao nível “esquisito” de 7,63%, que reflete apostas que testam qual a tendência das próprias projeções do mercado. Uma ou outra instituição coloca uma projeção mais estranha para ver o rumo das apostas. E rumo é de alta. Para 2022 a previsão é que a taxa básica de juros chegue a 7,75%.

Aí tem a questão do crescimento, que vem dando sinais de perda de ritmo, como o recuo de 0,1% do PIB no segundo trimestre e a queda da produção industrial em julho. Fora isso, tem os riscos da crise hídrica e a de energia – não está descartado algum tipo de racionamento além de apagões que também afetam a atividade -, a freada dos investimentos por cautela diante do cenário político e o peso da inflação e dos juros em alta sobre o poder de compra dos consumidores, também prejudicados pelo desemprego ainda elevado, com uma recuperação que não tem ajudado muito do ponto de vista do rendimento médio. Nesse contexto, se vê a continuidade dos cortes nas projeções de expansão do PIB, que caíram, na média, para 5,15% neste ano e 1,93% no ano que vem. Pela primeira vez, a projeção média do mercado para o crescimento da economia em 2022 está abaixo de 2%.

Por trás dessa piora das projeções ainda tem todo o mal estar provocado pelas questões fiscais, o que mexe com as expectativas de várias formas. O mercado aguarda o encaminhamento da reforma do Imposto de Renda no Senado, com muitas pressões para que seja rejeitada, tanto pela complexidade gerada pelas várias mudanças, como distorções e o estímulo à sonegação ou mesmo o planejamento tributário, que pode ser facilitado pelas várias exceções aplicadas até na taxação de lucros e dividendos, para tornar a proposta mais aceitável. Além dos problemas diretos que pode trazer para as empresas. Dependendo de algumas condições, a reforma ainda pode provocar perda de receita para o governo federal, Estados e municípios, que seguem na campanha contrária à proposta aprovada na Câmara. Resta ainda a novela dos precatórios.

Se esperava um entendimento com a participação do STF, que poderia dar um verniz de legalidade à postergação do pagamento das sentenças judiciais, que excedessem as projeções corrigidas pela inflação. Isso garantiria a folga necessária para a ampliação do Bolsa Família. Mas dependendo do tom das manifestações deste 7 de setembro e desdobramentos políticos, qualquer definição de alternativas pode ficar apenas por conta do governo. Sendo que, mesmo com o aval do STF, a leitura ainda era de um drible nos compromissos, sem qualquer esforço mais sério para ajustar as finanças via redução das despesas. Como se vê, motivos é que não faltam para essa piora geral das projeções do mercado. Não se trata de torcida contra ou pessimismo. São previsões que embutem reais desafios que a economia tem pela frente. Desafios estes que podem ser ampliados pelo cenário político, que vem antecipando polarizações preocupantes para 2022.

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