Por que as projeções de inflação e juros não param de subir?

O problema maior é a contaminação das previsões para 2022, que já chegaram, na média, a 4,03%, se distanciando do centro da meta, de 3,5%

  • Por Denise Campos de Toledo
  • 13/09/2021 14h20
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Luciano Claudino/Código19/Estadão Conteúdo Movimentação em açougue na região central de Campina Movimentação em um açougue de Campinas; inflação deixo o preço da carne mais salgado

A inflação voltou, definitivamente, ao radar das preocupações quanto ao andamento da economia. A divulgação do IPCA de agosto, com alta de 0,87%, superando as expectativas, levou a uma nova rodada de revisão das projeções, demonstrando que o avanço dos índices não era temporário, como se pensou durante um bom tempo. O último relatório Focus apontou a expectativa de IPCA em 8%, no fechamento de 2021, o que vai bem além do teto da meta, que é 5,25%. Mas o problema maior é a contaminação das previsões para 2022, que já chegaram, na média, a 4,03%, se distanciando do centro da meta, de 3,5%. Imaginava-se que a retomada da elevação dos juros pelo Banco Central, que até ganhou intensidade nas últimas reuniões do Copom, pudesse mexer favoravelmente com as expectativas. Em vez disso, semana após semana, só temos visto piora.

A questão é que o atual contexto do país não tem ajudado em vários aspectos. Um problema que vem afetando muito a inflação é o dólar em patamar mais alto. Mesmo com alguns momentos de trégua, o que se vê é uma forte resistência no piso dos R$ 5,20, que interfere negativamente na formação de vários preços. Situação que tem muita relação com a política. Os embates entre os poderes, manifestações, discussões sobre o impeachment, receio de maior radicalismo, de dificuldades no encaminhamento da agenda e até adoção de medidas que pesem mais do lado fiscal, na busca por maior popularidade, formam um caldo de incertezas que aumenta o risco país. Isso afeta o potencial de atração de recursos, apesar da elevação dos juros para patamar bem acima das taxas praticadas no exterior. Com a forte liquidez externa, combinada com juros ainda muito baixos e até negativos, além do retorno financeiro maior das exportações, o dólar deveria estar bem mais baixo.

Fora a questão política, temos tido onda sucessivas de pressões de preços: alimentos com a pressão renovada neste ano por fatores climáticos, comprometendo as safras; a crise de energia, com os ajustes fortes das tarifas; a falta de vários insumos industriais, acarretando elevação de custos; commodities ainda em alta no exterior, mesmo com estratégias como a da China para derrubar a cotação do minério. Na composição dos índices, se vê um espalhamento maior dos aumentos de preços, que podem ganhar força com a retomada das atividades, especialmente em serviços. É só fazer uma busca nos custos das viagens domésticas para se constatar um claro movimento de alta.

Esse contexto oferece um risco potencial maior para 2022 pela inércia inflacionária, pela indexação ainda muito presente na economia, que ganha impulso diante das incertezas quanto ao comportamento futuro dos índices, e dos custos. O Banco Central ainda não conseguiu a tão esperada convergência das projeções para o centro da meta, como sempre coloca nas atas do Copom e em outros relatórios. Muitas pressões independem do custo do crédito. Não se pode descartar o agravamento da crise de energia ou um clima político ainda mais pesado no ano que vem, quando entraremos, de fato, em época de campanha para as eleições, piorando o cenário prospectivo para a inflação.

Daí a expectativa de um aperto maior nos juros. As projeções para a Selic deste e do próximo ano já chegaram a 8%. Note que neste ano estão empatadas as projeções de inflação e juros. Portanto, talvez, a Selic tenha de avançar ainda mais para produzir os efeitos esperados. A consequência desse cenário de inflação e juros mais altos são os cortes, também seguidos nas previsões para o PIB. Este ano já está mais ou menos dado, em termos de inflação e crescimento. A projeção para o PIB está em 5,04% no relatório Focus, embora alguns analistas já contem com algo mais próximo de 4,5%. Já para o ano que vem a média está em 1,72% e com risco de cair mais, dependendo da evolução de todo esse cenário. É bom lembrar que as condições políticas afetam decisões de investimento, não só para o mercado, mas também as relacionadas a projetos de infraestrutura, empresariais, que ajudam a alavancar um desempenho melhor da economia. E o potencial dos novos marcos regulatórios, como saneamento, gás e mesmo na área energética, só terão impacto em prazos mais longos, dado o tempo de maturidade dos projetos.

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