Em Porto Rico, Trump desce para um novo patamar
Donald Trump, com sua fulminante retórica de um garoto de sete anos, já explicou o essencial sobre Porto Rico: é uma ilha, cercada de água, grande água, água de oceano.
Além do essencial, é mais complexo explicar Porto Rico, esta ilha cercada de água, devastada no último dia 20 pelo furacão Maria. Claro que a geografia ajuda a explicar um pouco a difícil logística para assistir a ilha, mas acaba sendo a justificativa para uma atitude que, na falta de expressão melhor, podemos rotular de colonialista.
Porto Rico já estava devastado antes do furacão. Tem uma dívida impagável de 70 bilhões de dólares, uma economia em estado de depressão e será penoso reconstruir não apenas a ilha, mas a imagem de cartão postal com palmeiras. A indústria de turismo foi devastada, o que deve acelerar ainda mais o êxodo da população.
E a ironia é que os portorriquenhos podem votar com o pé, em uma maratona menos suada do que a de tantos latino-americanos. Eles são cidadãos norte-americanos. Basta para eles pegar um avião e se instalar no continente. Votam com o pé, mas não em eleições presidenciais. Sequer influenciam no Congresso. Em Washington, portorriquenhos possuem apenas um representante não votante na Câmara dos Deputados (tampouco pagam imposto de renda federal).
A herança colonial (a ilha foi tomada dos espanhóis na guerra de 1898 junto com Cuba e Filipinas) explica o status híbrido. Os portoriquenhos são plenos cidadãos, mas não vivem em um pleno estado dos Estados Unidos da América, como também acontece com habitantes de outros territórios. Temos, por exemplo, as Ilhas Virgens Norte-Americanas, igualmente devastadas por Maria, e Guam, no Pacífico, que o Rocket Man Kim Jong-un já ameaçou devastar.
Porto Rico é pobre mesmo. Tem o maior índice de pobreza entre todos os estados e territórios dos EUA (41%). E também é desafortunado em termos de poder político para fazer cobranças, embora, com 3,5 milhões de habitantes, tenha uma população maior do que a de 21 dos 50 estados do país.
Há gente que não se choca mais com a sem-vergonhice de Trump. Eu já disse, para brincar com meu amigo Guga Chacra, que o presidente já insultou tudo e todos, exceto Vlamidir Putin e o Palmeiras.
Mas mesmo para os padrões Trump, ele foi indecente com os portorriquenhos. Em tuítes disparados no sábado do seu campo de golfe, o presidente insultou a prefeita de San Juan, a capital da ilha, reclamou que a imprensa não reconhece o seu excelente desempenho no socorro à ilha e basicamente chamou os habitantes de vagabundos, pois querem receber assistência sem pegar no pesado. Fake news, señor presidente.
Não há precedentes (como tanta coisa no universo Trump) de um presidente americano destratar uma autoridade, como no caso da prefeita de San Juan, quando ela está ali na linha de frente enfrentando um desastre.
O señor presidente visitará Porto Rico na terça-feira. Vamos ver o que ele irá constatar, além do fato de ser uma ilha cercada de água e atulhada de portorriquenhos em estados variados de sofrimento.
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