Felipe Moura Brasil: Dinheiro de ex-assessor inflama torcidas pró e contra Bolsonaro

  • Por Felipe Moura Brasil/Jovem Pan
  • 10/12/2018 08h50
Rovena Rosa/Agência Brasil Neste domingo, Jair Bolsonaro disse que o ex-assessor do filho "tem que explicar” e, referindo-se a qualquer irregularidade, que “pode ser, pode não ser”

Prevalece no debate público brasileiro a preocupação de cada debatedor em ser o maior opositor ou defensor de um político, juiz, grupo ou corrente ideológica, e não a análise dos fatos disponíveis até cada momento e dos limites do que se pode concluir a partir deles, enquanto fatos novos ou ocultos não vêm à tona.

Que a militância dos partidos atue assim, dentro dos limites da lei, é do jogo. Mas a transformação da atividade jornalística e intelectual em megafone de interesses partidários, quando não de ranços e recalques pessoais, resultou nessa ‘futebolização’ do debate, onde se faz vista grossa para imoralidades ou ilegalidades cometidas por gente do seu “lado”, enquanto se acusa gente do outro de barbaridades sem indícios suficientes.

Nunca houve fatos disponíveis que permitissem a conclusão de que Jair Bolsonaro é um nazista (que dirá Hitler, que comandou o extermínio de milhões de judeus), como setores da imprensa e demais militantes pintavam o deputado; nem indícios suficientes para a conclusão de que havia cometido qualquer crime de corrupção, mesmo após toda a devassa feita na vida do líder constante das pesquisas que acabou eleito presidente.

Tampouco faltou, decerto, motivos para notar que Bolsonaro, como escrevi em 9 de agosto, não é a encarnação perfeita do conservadorismo, e que também, como ele próprio havia dito, não é santo.

Para as arquibancadas estremecerem, no entanto, bastou vir à tona um fato oculto e até o momento mal explicado sobre a identificação pelo Coaf de movimentação bancária – não exatamente dinheiro em conta – de 1 milhão e 200 mil reais de um ex-assessor de seu filho Flávio, o PM Fabrício Queiroz, que assinou um cheque de 24 mil reais para a futura primeira-dama Michelle, agora atribuído pelo presidente eleito, sem maiores detalhes, ao pagamento de uma “dívida pessoal” de Queiroz com ele – Bolsonaro -, que contou ainda ter feito o depósito na conta da esposa por “questão de mobilidade”, já que tem dificuldade para ir ao banco em razão da rotina de trabalho.

De um lado, no debate público, já começou a sessão “eu avisei”, na qual todas as análises erradas sobre o resultado da eleição e as rotulações descabidas feitas durante a corrida eleitoral supostamente se justificam a posteriori em razão do fato oculto revelado e ainda não esclarecido que nenhuma delas tinha levado em consideração.

De outro lado, com variações de grau, mas certamente em menor escala que a dos petistas quando alvos de investigação, já se recrimina na internet qualquer jornalista que, sem cravar conclusões antes da hora, divulga e apura as informações relativas ao caso, cobrando explicações de Jair, Michelle e Flávio, de quem, aliás, oito assessores fizeram depósitos na conta de Queiroz.

Neste domingo, Jair Bolsonaro disse que o ex-assessor do filho “tem que explicar” e, referindo-se a qualquer irregularidade, que “pode ser, pode não ser”. O presidente eleito ressaltou que as movimentações mais altas aconteceram com a mulher e as duas filhas de Queiroz, e sugeriu que os valores transferidos pelos demais assessores foram baixos:

“Um ao longo de um ano transferiu 800 reais, o outro transferiu 1.500 reais, poxa.”

Já Flávio Bolsonaro disse que falou com Queiroz e ouviu uma explicação plausível, mas que o ex-assessor terá de convencer não ele, mas o Ministério Público quando for chamado a depor.

Enquanto Queiroz não traz à tona sua explicação, as especulações sobre o caso obscuro ecoam aos quatro ventos. Na hipótese mais comprometedora para Jair Bolsonaro, ele teria comandado e se beneficiado para despesas pessoais de um esquema ilícito de coleta de taxas dos salários dos empregados em gabinetes de membros da família. As variações dessa hipótese, descendo em escala de comprometimento, seriam Flávio comandar o esquema sem conhecimento do pai, ou Queiroz comandá-lo sem conhecimento de Flávio nem de Jair.

Até o momento, apesar da margem para desconfianças, não é possível cravar qualquer conclusão. A não ser as de sempre: que todo culpado de ilicitude deve ser punido, seja quem for; e que a revelação de fatos ocultos não consagra a histeria, nem redime erros passados.

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