Felipe Moura Brasil: Quanto menos petismo entre bolsonaristas, melhor
Entre a “parcialidade contra” – que setores da imprensa fingem ser “imparcialidade” – e a “passagem de pano” – típica da militância paga ou fanática –, existe a vigilância serena, exercida com a análise dos fatos disponíveis até cada momento e dos limites do que se pode concluir a partir deles, com senso das proporções e das nuances, além de argumentação lógica, não ranço pessoal, político ou ideológico, nem pressa em absolver ou condenar antes de uma exposição conclusiva das provas.
Neste caso, nada impede a execração pública dos criminosos comprovadamente culpados e de seus defensores cínicos, dentro dos limites da lei.
A vigilância serena é exercida por veículos, autores e jornalistas independentes, cujas análises agradam à militância quando expõem distorções ou refutam mentiras contra seus políticos prediletos ou grupo ideológico, mas causam nela incômodo ou a alegada “decepção” quando os criticam ou buscam esclarecer suspeitas sobre eles.
A militância, claro, confunde os jornalistas independentes com a torcida da qual ela própria faz parte, atacando esses jornalistas quando eles exercem sobre seus xodós a mesma vigilância serena e eventualmente irônica que sempre exerceram sobre seus adversários em ocasiões análogas, ou seja, de declarações, comportamentos ou atos repudiáveis e de suspeitas dignas de investigação oficial e jornalística, guardadas as devidas proporções de cada caso e do histórico dos envolvidos.
Nem sempre, no entanto, ocorre a mera “confusão”. Com frequência, consciente da obscuridade de um caso ou até da culpa de um político predileto, a militância paga ou fanática ataca jornalistas independentes para forçar seu desgaste com o público, associando-os aos setores parciais da imprensa ou atribuindo à isenção um valor negativo, para que o público se afaste deles e só busque notícias com a própria militância, em sites e blogs “alternativos” que apenas se declaram “independentes”.
Os setores parciais da imprensa e a militância adversária vivem num arranco-rabo explícito que alimenta as narrativas dos dois lados, porque os excessos recorrentes de um deles, apontados pelo outro, diluem eventuais verdades que expõem.
Jornalistas parciais forçam tanto a mão para queimar adversários que, quando há informações aparentemente comprometedoras sobre eles, a militância acusa cinicamente a imprensa de demonizar mais uma vez seus políticos de estimação, que aproveitam para se fazer de perseguidos, em vez de esclarecer fatos obscuros.
Não é preciso, por exemplo, ter chegado a qualquer conclusão sobre culpa ou inocência de Flávio Bolsonaro em relação a movimentações bancárias atípicas de seu ex-assessor Fabrício Queiroz para notar, por um lado, que jornalistas parciais ignoraram os demais deputados e assessores citados no mesmo relatório do Coaf, ainda que o filho do presidente tenha maior relevância jornalística; e, do outro, que a ala pitbull da militância bolsonarista na internet – que não representa o eleitorado total do atual presidente – rosnou contra a imprensa inteira, incluindo veículos e jornalistas independentes que buscam desobscurecer os fatos.
Como o Brasil agora é, literalmente, um mar de lama, o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho soterrou temporariamente o caso Queiroz, mas quando ele voltar à tona no debate público, os jornalistas parciais terão a oportunidade de se comportarem como jornalistas independentes, e a ala pitbull dos bolsonaristas virtuais, a de não se comportarem como petistas.
Não que eu espere por atitudes assim, claro. O que eu espero sempre é o aumento da histeria de todos os grupos não independentes, enquanto expresso o que julgo necessário para que o grupo dos cidadãos sensatos seja maior do que todos eles.
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