Felipe Moura Brasil: Uma lição de Nelson Rodrigues e Millôr Fernandes
A irreverência provocadora de Nelson Rodrigues e Millôr Fernandes legou ao debate público uma série de frases deliciosas, algumas das quais, no entanto, se levadas ao pé da letra, causam algumas confusões conceituais.
Reacionário, por exemplo, é o que Anthony Quinton chamou de “revolucionário do avesso”. Enquanto o revolucionário busca impor um futuro idealizado, o reacionário busca resgatar um passado igualmente idealizado, de modo que ambos os fins utópicos justificam na cabeça deles os meios radicais.
Já o conservador busca, como descreveu João Pereira Coutinho, “preservar o que é válido no presente recorrendo aos instrumentos tangíveis desse presente – e não a fantasias sobre o passado”. Ou, na definição de Roger Scruton, encontrar o que você ama e agir para proteger isso, em vez de encontrar o que você odeia e tentar destruir.
O conservador Nelson Rodrigues, injustamente chamado de reacionário por seus detratores, saiu-se com um chiste: “Sou reacionário. Reajo contra tudo que não presta.”
Ou seja: Nelson assumiu o rótulo, mas sorrateiramente alterou seu sentido, dando-lhe um valor positivo antes inexistente. Por causa disso, muita gente, hoje, até se orgulha de ser reaça.
Já Millôr Fernandes eternizou a máxima: “Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.”
Foi uma forma jocosa de dizer que a imprensa tem de estar sempre vigilante, como fiscal rigorosa de qualquer poder estabelecido, sem se curvar.
Mas a oposição real é a adversária política de um governo. Se jornalista vira adversário político, a busca da verdade e da análise honesta dos fatos se torna secundária diante da necessidade de se opor: de turbinar erros e omitir acertos, disseminando narrativas falseadas.
Isso não é jornalismo, embora seja muitas vezes a imprensa.
Se for para tirar uma lição das frases de Millôr Fernandes e Nelson Rodrigues, é a de que devemos estar sempre vigilantes para reagir contra tudo que não presta. Seja dentro ou fora de qualquer governo. Seja uma laranja podre ou o cordão dos puxa-sacos.
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