Funai prevê chegada em massa de índios isolados na fronteira do AC
Manaus, 27 jul (EFE/Amazônia Real).- Uma equipe responsável pelo contato com índios desconhecidos da fronteira do Acre com o Peru enfrentou a desconfiança e o medo para convencê-los a tratar, com remédios dos “brancos”, uma gripe capaz de exterminar a tribo, que vive em local de difícil acesso no oeste da Amazônia.
Em entrevista à agência Amazônia Real, o coordenador-geral de Índios Isolados e Recém Contatados da Funai, Carlos Lisboa Travassos, explicou que os índios isolados recém contatados foram identificados como o povo do rio Xinane, pertencente ao tronco linguístico Pano.
Sem resistência a doenças como a gripe, eles foram convecidos a tomar remédios pelos intérpretes da etnia jaminawá, que falam dialetos da mesma língua. O próximo passo é vacinar todo o grupo.
Travassos classificou a situação na fronteira como crítica. Na região há várias tribos compartilhando o mesmo território pacificamente. E a perspectiva é de que haja uma aproximação massiva do grupo indígena isolado na base da Funai do rio Xinane.
“No dia 26 de junho, aconteceu o primeiro contato dos índios isolados. Eles apareceram atravessando o rio Envira. A aldeia Simpatia (dos índios ashaninka) fica bem na margem do rio. Eles assopravam barulhos de animais”, contou Travassos.
“Foram contatos razoavelmente rápidos, de algumas horas, e depois eles retornaram para a mata. Foi assim nos dias seguintes. Os diálogos foram realizados por dois intérpretes muito habilidosos, que conhecem os dialetos da língua Pano, o mesmo tronco linguístico dos índios isolados: José Corrêa Jaminawa, de 70 anos, e o Almerindo Jaminawa, de 60. São pessoas muito experientes, que conseguiram manter uma comunicação plena com os índios e uma relação de confiança”, acrescentou.
Travassos relatou que, uma semana após esse contato inicial, quando os índios desconhecidos voltaram à aldeia Simpatia, percebeu que eles estavam com gripe.
“No dia 4 de julho, eles apareceram na aldeia Simpatia. Eu já estava lá. Depois, retornaram para a mata. No dia seguinte, percebemos que eles contraíram gripe. O médico (Douglas Rodrigues, da Secretaria de Vigilância em Saúde) fez a primeira medicação para controlar a febre, e aí eles novamente voltaram para a mata. Foi um momento de muita tensão nossa, porque não sabíamos se tinha mais pessoas no acampamento onde eles estavam, quantas pessoas eram”, disse.
“Depois, não sabíamos se eles tinham retornado ao grupo maior, o que seria o pior dos mundos para a gente. Seria disseminar uma gripe para um grupo inteiro num local de difícil acesso. Mas, felizmente, a gente encontrou com eles no meio do rio Envira, e os convencemos a viajar até a base do rio Xinane”, contou.
Segundo Travassos, os intérpretes foram decisivos no trabalho de convencimento para que os índios se tratassem com medicamentos.
“Nós dependemos muito da qualidade dos dois intérpretes jaminawa. São pessoas muito maduras, que conseguiram um diálogo muito bom e conseguiram explicar que a gripe não era um xamanismo, um feitiço, era algo que todos nós acabávamos contraindo e que só sarava quando tomava o remédio. Então esse convencimento se deu quando perceberam que a saúde deles estava piorando. Eles voltaram ao acampamento e buscaram o restante do grupo, que eram duas mulheres, que não tinham aparecido”, afirmou.
“A base do Xinane fica distante cerca de 3 horas de viagem de voadeira (canoa de alumínio com motor de popa). Foi a primeira vez que eles entraram num barco a motor. Na base tem um chapéu de palha (cabana) onde permaneceram acampados por quatro dias e meio em tratamento, de 6 a 10 de julho. Isso permitiu quebrar o ciclo que os médicos dizem de disseminação do vírus da gripe. Eles só retornaram ao acampamento deles quando tivemos certeza de que não iriam levar aquela gripe ao restante do grupo”, disse.
O coordenador também afirmou que a Funai solicitou ajuda ao Itamaraty para intermediar a participação do governo peruano nas ações com esses índios isolados. Além disso, ele pediu uma resposta do governo brasileiro na proteção da integridade física e cultural da etnia.
“Poderia ter tido um resultado muito ruim na questão da gripe e da disseminação incontrolável de um surto epidêmico, que a gente não tem como atuar. As estruturas que existem precisam ser melhoradas substancialmente se o nosso país não quiser ver uma situação lamentável que seria uma perda de índios isolados”, declarou. EFE/Amazônia Real
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