Iitate, o paraíso transformado em cidade fantasma pela radiação de Fukushima

  • Por Agencia EFE
  • 09/03/2015 06h30
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Ramón Abarca.

Iitate (Japão), 9 mar (EFE).- Iitate é uma cidade fantasma. Seus seis mil habitantes tiveram que abandonar há quase quatro anos esta montanhosa cidade agrícola situada a 40 quilômetros da usina nuclear de Fukushima e a radiação não os deixa voltar.

O acidente de 11 de março de 2011, quando um terremoto e um posterior tsunami atingiram a usina, mudou o destino deste lugar considerado um paraíso por seus habitantes e que ostentava a honra de ser um dos povoados mais lindos do Japão.

A radiação que emanou durante dias dos reatores danificados acabou com seus cultivos de árvores frutíferas, suas famosas flores e a criação de vacas conhecidas em todo o país pela qualidade de sua carne.

Faltando pouco para completar o quarto aniversário do desastre nuclear, Iitate é um dos 12 municípios próximos à central cujo acesso segue restringido.

Embora seus moradores possam visitá-la durante o dia, seguem sem poder pernoitar ali. O toque de recolher ocorre quando o sol de põe.

“Depois do acidente perdemos tudo, tivemos que ir embora de nosso precioso povoado. Aí começou nossa vida de refugiado. Foi uma época de muito sofrimento. Ainda não sabemos quando poderemos voltar a nossas casas”, explicou à Agência Efe Muneo Kanno, um granjeiro de 55 anos, enquanto caminhava pelas desertas ruas de Iitate.

Kanno vai ao povoado duas ou três vezes por semana para ver como está a casa onde vivia junto com sua mulher, seus pais, sua filha, seu genro e seu neto. Esta família se encontra agora dispersa em distintas localidades da região.

Este é um dos grandes dramas dos mais de 126 mil evacuados que estão em Fukushima. Muitos deles vivem ainda em pequenas casas temporárias pré-fabricadas.

“Sinto saudades de ver diariamente o sorriso do meu neto. Recebemos compensações econômicas, mas o que perdemos não é quantificável”, lamentou o granjeiro que agora mora na cidade de Kodachi e se transformou no diretor da associação “Ressuscitar Fukushima”.

“Não confiamos nas medições do governo. É importante controlar como evolui tudo, nos envolver e fazer todo o possível para que algum dia possamos voltar”, comentou Kanno, que se dedica a monitorar os níveis de radiação na zona junto a outros agricultores.

A calma deste povoado sem habitantes se vê alterada apenas pelos guindastes, escavadeiras e grandes caminhões envolvidos nos vastos trabalhos de descontaminação da superfície do terreno.

Centenas de milhares de sacos pretos cheios resíduos contaminados se amontoam em ambos os lados de estrada. A fantasmagórica imagem lembra que o que era até pouco tempo um terreno fértil segue doente.

Yuri Kanno, de 29 anos, abandonou Iitate logo após o acidente, antes que fosse ativada a ordem de evacuação. Seu marido trabalhava na usina nuclear e recomendou que fosse o mais longe possível.

“Não sei se quero voltar. Me sinto segura onde vivo agora. Não acho que a radiação vá desaparecer de repente e isto me preocupa pelos meus filhos. Talvez meus avôs voltem e eu irei visitá-los”, explicou esta mãe de duas crianças de cinco e dois anos que agora vive na cidade de Fukushima.

O mais velho frequenta uma creche temporária que acolhe 47 crianças de famílias evacuadas de Iitate, um projeto chamado Cocoro Care for Children, iniciado por Kimiko Deguchi, uma médica da distante, mas também castigada cidade de Nagasaki.

A alguns quilômetros de suas antigas casas, na cidade de Iino, os menores recebem o apoio de psicólogos e especialistas voluntários que tentam apagar os efeitos da evacuação e de experiências como não poder brincar ao ar livre durante muito tempo.

Da capital da província, para onde se mudou a um pequeno apartamento junto com sua mulher em 2011, o prefeito de Iitate, Norio Kanno, tenta manter vivo o espírito do povo que rege desde 1996.

“Entendo que a população jovem não queira voltar. Seria maravilhoso se pelo menos pudéssemos recuperar um terço dos habitantes que tínhamos”, comentou o prefeito, reconhecendo, no entanto, que parece ainda difícil que algum dia possam retornar respeitando os níveis de radioatividade mínimos recomendáveis para a habitabilidade.

Pelo menos, assegurou Kanno, 90% de seus concidadãos vivem perto de suas antigas casas, e apenas 30% seguem em residências temporárias.

“Este mundo anda muito depressa. Só se pensa no crescimento econômico. Em nosso povoado a vida era diferente. Vivíamos devagar, gostávamos de fazer as coisas com o coração”, recordou com nostalgia o prefeito no exílio nuclear. EFE

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