Em um único dia, Covid-19 supera o número de mortos do 11 de Setembro e do Dia D

Passou da hora dessa polarização falida ser deixada de lado para que o país possa reverter a condução conturbada e negligente do enfrentamento ao coronavírus

  • Por Marcelo Escobar
  • 26/03/2021 09h00
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Paulo Guereta/Agência O Dia/Estadão Conteúdo - 25/03/2021 Vestidos com roupas de proteção, coveiros enterram vítima da Covid-19 na Vila Formosa Vítima da Covid-19 é enterrada no cemitério da Vila Formosa, zona leste de São Paulo

Todos se recordam o que faziam quando receberam a trágica notícia dos ataques às Torres Gêmeas, no fatídico 11 de setembro de 2001. A lembrança decorre dos absurdos ilógicos do terror daquele acontecimento. Da mesma forma a Operação Overload, codificada como Operação Neptuno e popularmente conhecida como Dia D — , é objeto de incontáveis livros e teorias, bem como lembranças nem um pouco prazerosas – apesar de sua importância histórica –, por ter sido um dos grandes massacres da 2ª Guerra Mundial, haja vista a quantidade de jovens que morreram ao desembarcar nas praias da Normandia naquela fúnebre ocasião em 6 de junho de 1944. Também não se discute que uma das questões mais recorrentes, ao menos na história americana, também pela quantidade significativa de baixas, oposições políticas e discursos inflamados, foi a Guerra do Vietnã. 

O que poucos relacionam foram as quantidades de mortos em tais datas. Nos atentados às Torres Gêmeas, faleceram 2.996 pessoas, ao passo que o Dia D foi responsável por 2.499 baixas apenas entre os soldados americanos (morreram também 1.660 soldados britânicos e 340 militares canadenses). Já a Guerra do Vietnã vitimou, ao longo de praticamente 20 anos (entre 1º de novembro de 1955 e 30 de abril de 1975), 58.220 americanos, ou seja, uma média anual 2.911 mortes por ano, ou cerca de oito óbitos por dia.

A mórbida relação entre tais eventos merece destaque diante da quantidade de protestos e indignação que todos geraram — e ainda acaloram rodas de discussões, inclusive políticas e acadêmicas. Isso em terras estrangeiras. Imagino o que não dirão os livros de história brasileira acerca dessa semana, uma vez que perdemos, para a guerra contra a Covid-19, mais de 3.000 cidadãos em um único diaSe compararmos a perda diária de 3.000 vidas brasileiras com os episódios acima, temos a lúgubre e desgostosa constatação de que, em todos os eventos (2.996 no 11 de Setembro, 2.499 no Dia D e uma média de oito por dia no Vietnã), as mortes foram inferiores aos nossos recentes e espantosos números nessa avassaladora pandemia.

Sem qualquer jactância, e com viés absolutamente apartidário, não há como se calar diante da sinistra constatação de termos mais mortos por dia do que um atentado como o 11 de Setembro, ou mesmo sepultarmos mais pessoas do que o total dos oficiais americanos mortos por dia no decorrer de toda a Guerra no Vietnã. Passou da hora dessa polarização falida ser deixada de lado para que o país seja visto como um todo, indissociável, para somente então cobrarmos com veemência as rédeas dessa condução conturbada e negligente do enfrentamento do vírus SARS-CoV-2.

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