Modelo para paz na Colômbia, desarmamento pioneiro do M-19 completa 25 anos

  • Por Agencia EFE
  • 08/03/2015 10h30
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Cynthia de Benito e Gonzalo D. Loeda.

Bogotá, 8 mar (EFE).- Passados 25 anos desde que entregou as armas, o entorno da guerrilha do M-19 lembra a incerteza vivida naqueles dias, dos quais extraem lições para outros grupos que estejam dispostos a carimbar a paz na Colômbia.

“Nós fomos os precursores deste processo de paz, o compreendemos primeiro, fizemos frente à incompreensão de alguns setores. A história está nos dando a razão”, declarou em entrevista à Agência Efe o senador Antonio Navarro Wolff, ex-número dois desta guerrilha.

Em seu escritório do Congresso, onde atualmente ocupa uma cadeira pelo partido Aliança Verde, Navarro lembrou que o M-19 deixou as armas “porque não havia possibilidade de vitória e a guerra sem vitória não faz sentido”.

O Movimento 19 de Abril (M-19) surgiu em 1970 como resposta à fraude eleitoral que levou à presidência Misael Pastrana Borrero em detrimento do general reformado Gustavo Rojas Pinilla, que não era membro dos dois partidos tradicionais que se alternavam no poder na Colômbia.

A trajetória política de Navarro lhe permitiu ser um dos pais da atual Constituição colombiana, à qual pôde contribuir apenas alguns meses depois que deixou as armas em 8 de março de 1990 junto com seus companheiros, já que tinha claro que da mesma forma que combateram unidos, deviam se desmobilizar ao mesmo tempo.

“Uma guerrilha é uma comunidade primitiva nômade e é fácil se acostumar com a vida em grupo”, explicou.

O agora senador exemplificou esta frase com sua própria experiência, já que quando foi candidato à presidência em 1990, compartilhou sua casa com 15 pessoas às quais depois custou mandar embora, mas que lhe acompanharam para que não o matassem, pois após entregar as armas, o medo de serem assassinados se instalou no grupo.

Navarro alcançou a liderança do M-19 após o assassinato do comandante Carlos Pizarro, que, depois de liderar a desmobilização dessa guerrilha, foi baleado em um avião em pleno voo apenas sete semanas depois de entregar as armas.

Seu entorno temia por ele. Sua filha María José, que estava então com 12 anos, lembrou à Agência Efe que a tensão se instalou a seu redor quando Pizarro se destacou por seu rápido auge como candidato presidencial.

“Tinham assassinado Bernardo Jaramillo (candidato presidencial do partido de esquerda União Patriótica) 20 dias depois da desmobilização, por isso que os temores aumentaram muitíssimo, e nesse momento (Pizarro) era um dos homens mais protegidos”, afirmou.

Pizarro contava então com uma escolta mista integrada por companheiros do M-19 e agentes do Estado.

“Os agentes jamais subiam em casa, sempre subiam os companheiros, com os quais compartilhava níveis de confiança altos porque eram os que tinham acompanhado ele” em sua luta, conteou María José em conversa com a Agência Efe.

Nos últimos encontros do grupo já era possível sentir “um grande nível de ansiedade”, e inclusive o avisaram: “Vão te matar!”, segundo escutou em algumas ocasiões a filha de Pizarro.

Após seu assassinato, uma grande massa acompanhou seu caixão em Bogotá, mostrando assim o apoio popular que esta guerrilha colheu com suas ações, isentas da “degradação vivida pelo conflito armado nos anos seguintes”, com o aparecimento do narcotráfico e a proliferação de crimes contra a humanidade, explicou María José.

Entre as ações do M-19, caracterizadas por tiros simbólicos e ajudas à população mais necessitada, três atos lhe deram um grande eco internacional: o roubo da espada de Bolívar (1974), a tomada da embaixada da República Dominicana em Bogotá (1980) e a do Palácio de Justiça em 6 e 7 de novembro de 1985.

Perguntado pela reconciliação do ex-combatente, Navarro diz que é mais fácil fazer a paz com o inimigo do que com as “vítimas secundárias” do conflito porque guerrilheiros e soldados “tomaram a decisão de estar na guerra”.

“Me atiraram uma granada, eu sei quem fez e em um momento o perdoei, renunciei às denúncias penais, isso não vai fazer minha perna crescer”, comentou sobre o perdão o agora senador, que perdeu seu membro em um atentado durante as negociações de paz que também afetou sua fala.

Deste “paradigmático” processo de desmobilização, como define a filha de Pizarro, podem ser extraídas valiosas lições em um momento no qual o governo colombiano negocia a paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) para pôr fim a 50 anos de guerra, já que “demonstraram ao país que a saída negociada ao conflito era possível”. EFE

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