ONU adverte para conflitos provocados por dramática escassez futura de água
Julio César Rivas.
Toronto (Canadá), 24 fev (EFE).- Um relatório da ONU divulgado nesta terça-feira advertiu que em pouco tempo a demanda por água provocará conflitos, o que torna necessário atuar urgentemente eliminando a corrupção que existe no setor e as subvenções a áreas como energética e agrícola.
O relatório, realizado pelo Instituto de Água, Meio Ambiente e Saúde (INWEH) da Universidade das Nações Unidas, com sede no Canadá, assinalou que em 10 anos 48 países com uma população total de 2,9 bilhões de pessoas estarão classificados como “com escassez de água ou com estresse de água”.
E para 2030, a demanda mundial esperada de água doce será 40% superior à oferta. Os países mais deficitários serão os de menos recursos, com jovens povoações em rápido crescimento.
Segundo o relatório, “é provável que novos conflitos apareçam à medida que se extrai mais água de cada vez mais rios do mundo até o ponto de não chegarem ao mar”.
O relatório destacou que um dos maiores problemas é a galopante corrupção no desenvolvimento de infraestruturas aqüíferas e sanitárias, tamanha que 30% do financiamento destinado a desenvolver recursos de água acabem sendo desviados para outros fins.
“Em muitos lugares do mundo a corrupção está provocando uma hemorragia de recursos financeiros que poderiam e deveriam estar disponíveis para eliminar a pobreza e apoiar os objetivos de Desenvolvimento Sustentável (da ONU), particularmente os relacionados à água”, disse o relatório.
“A corrupção não é só um ato criminoso. No contexto do desenvolvimento sustentável poderia ser vista como um crime contra a humanidade”, acrescentou o relatório, intitulado “Water in the World We Want”.
O diretor do INWEH, Zafar Adeel, declarou à Agência Efe que “o impacto da corrupção na água é mais imediato e visível porque afeta as vidas e a saúde da população. Há uma relação direta entre a falta de condições de salubridade e água potável e as mortes infantis por diarreia em países em desenvolvimento”.
O relatório recomendou que “os governos e todos os setores econômicos devem erradicar a corrupção mediante o estabelecimento e a implementação de protocolos anticorrupção claros e definidos, com consequências graves forem violados”.
Os autores do relatório, que analisaram a situação em dez países de todo o espectro econômico, na América do Sul o escolhido foi a Bolívia, para redigir “Water in the World We Want”, também disseram que as subvenções recebidas por setores como o energético e o agrícola devem ser dirigidas ao desenvolvimento de recursos de água.
E acrescentaram que o setor energético tem que se responsabilizar pelo desperdício de recursos hídricos.
“A retirada de subsídios prejudiciais e improdutivos, incluídos os dados às companhias petrolíferas, assim como às de gás e carvão, pelo incrível valor de US$ 1,9 trilhão ao ano liberaria recursos públicos”, assinalou o documento.
Corinne J. Schuster-Wallace, uma das autoras do relatório, disse à Efe que a transferência desses subsídios ajudaria a conseguir entre US$ 1,2 e US$ 2,4 trilhões ao ano, necessários para construir as infraestruturas aqüíferas e serviços sanitários que satisfaçam as demandas populacionais.
“É necessário um novo jogo de prioridades dos setores que precisam de investimentos. A quantidade de dinheiro disponível é limitada. A redistribuição das subvenções ao setor energético é uma ferramenta mais do que necessária para alcançar os objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, ressaltou.
Schuster-Wallace reconheceu que tanto o setor energético como o agrícola têm grande poder de influência sobre governos, tanto no mundo desenvolvido como nos países em desenvolvimento, o que faz com que eliminar esses subsídios não seja fácil.
“Mas por outro lado temos a necessidade imperativa de conseguir desenvolvimento sustentável, igualdade, desenvolvimento social e integridade meio ambiental. A única forma de sucesso é pensar e atuar de forma diferente”, acrescentou.
Os autores do relatório indicam que ao desperdício de recursos pela corrupção e a falta de recursos públicos pelos subsídios dados a outros setores se une a crescente ameaça de alteração do ciclo hidrológico no mundo todo em consequência da mudança climática.
A combinação destes fatores é o que Schuster-Wallace e Robert Sandford, também coautor do relatório, qualificaram como “jogar pôquer” com cartas nunca vistas.
“A perda de um ciclo hidrológico fixo é como jogar pôquer com um baralho em que novas cartas nunca antes vistas aparecem constantemente com frequência crescente, até o jogo não ter nenhuma coerência ou sentido”, concluíram os autores. EFE
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