Dez medidas urgentes para salvar a educação dos danos causados pela pandemia
Investir na infraestrutura, rever o currículo escolar, promover a educação híbrida e apoiar os professores estão entre as ações que podem promover uma necessária revolução
Humildemente, como pesquisador e educador há mais de três décadas, apresento dez grandes ações que, no meu ponto de vista, precisam ser adotas imediatamente para que consigamos recuperar em parte o que perdemos e estancar a “sangria” que a educação sofreu durante a crise do coronavírus. O Brasil é um dos países que têm apresentado um dos mais tristes cenários nas áreas de saúde e educação no que se refere aos impactos da pandemia. Estamos meio inertes e despreparados para lidar com os desafios que a Covid-19 nos trouxe. Nossas estratégias e ações não estão sendo eficientes e eficazes. Na educação, são vários os estudos que apontam que precisaremos de muitos anos para recuperar a aprendizagem dos alunos. Pelo movimento observado por parte do Ministério da Educação, daqui a pouco teremos que nos render e assumir a lanterninha quando compararmos com os demais países. O Banco Mundial já nos alertou, em um relatório apresentado em março deste ano, que as perdas educacionais são muito mais significativas entre os alunos mais pobres, pois eles têm muito mais dificuldade de acesso à educação remota. O documento calcula que a desigualdade de aprendizagem entre os estudantes mais ricos e os mais pobres pode alcançar uma diferença de quase três anos letivos.
O economista do Banco Mundial Ildo Lauathare aponta que o Brasil pode perder, em um ano, o que levou dez para conquistar no que tange aos avanços educacionais. Ele nos lembra que um “dia de escola aberta não compensa um dia de escola fechada. A perda que tivemos e que deveremos ainda ter será muito danosa”. Diante deste cenário, apresento a seguir as dez grandes ações que, a partir de muitos estudos realizados, precisam ser adotadas. Vamos a elas:
- É preciso implantar ferramentas e mecanismos para diagnosticar a real aprendizagem dos alunos no ano passado. É fundamental avaliar com muita propriedade o nível dessa aprendizagem, com foco nos conteúdos essenciais relacionados à idade-série de cada estudante;
- Faz-se necessário implantar um programa de recuperação, principalmente para os alunos que apresentarem maiores problemas no diagnóstico da aprendizagem. Devem ser unidos todos os recursos para a promoção desse programa;
- O currículo das escolas precisa ser revisto de forma que sejam trabalhados conteúdos essenciais, devendo ser flexibilizados, além do currículo, a carga horária e os dias letivos. O foco tem que ser nos resultados, principalmente com atenção redobrada aos alunos mais vulneráveis;
- Deve haver um forte investimento na infraestrutura da escola para implantação da educação híbrida, com água e saneamento, equipamentos e protocolos de proteção sanitária, principalmente para receber os alunos que não têm condições adequadas para o ensino remoto;
- Sugere-se implantar a educação híbrida não dividindo as turmas de forma aleatória, por exemplo, com metade tendo aula presencial em um dia ou semana e metade em outra. Recomenda-se que os alunos que têm melhores condições de aprendizagem em casa ou que apresentam um nível satisfatório (verificado no diagnóstico de aprendizagem) continuem com o ensino remoto, e os alunos que não têm essas condições passem a desenvolver essas atividades na escola. É uma educação híbrida que privilegiará os menos favorecidos;
- Os governos federal, estadual e municipal devem fazer convênios com empresas de telecomunicações para levar o ensino a todos, seja por meio de rádio, TV ou internet. Ou seja, o ensino remoto precisa ter mais qualidade e precisa contar com o uso de tecnologias mais eficazes e que atinjam quase a totalidade dos alunos;
- É preciso estabelecer ou reestabelecer forte conexão do estudante com a escola e da escola com as famílias. Colégios que estão conseguindo fazer isso apresentam resultados muitos maiores de aprendizagem dos alunos do que os que não o fazem. Devem ser feitas amplas campanhas para incentivar essa conexão e relação;
- É fundamental melhorar as condições de aprendizagem em casa, seja por fornecimento de internet e equipamentos para os alunos e professores ou apoio e orientação aos pais, entre outras ações que visam a melhora do ambiente de aprendizado do aluno em casa;
- O professor deve receber apoio irrestrito e integral para o desempenho das suas funções. Ou seja, é preciso rever todas as condições, desde o preparo e planejamento da aula até a execução, correção e avaliação das atividades desenvolvidas pelos alunos. As educações remotas e híbridas exigem muito mais do professor, principalmente em termos de tempo. Também devem ser ofertados programas de formação, focados no desenvolvimento de competências digitais e outros temas alinhados às novas exigências e tendências educacionais. É preciso garantir aos professores tecnologia nas escolas para dar suporte ao seu trabalho. E nunca esquecer de cuidar da saúde mental e bem-estar desses que hoje são, junto com os profissionais da saúde, os grandes heróis da pandemia;
- Destacamos a importância de um olhar todo especial para o gestor educacional, seja diretor escolar ou coordenador pedagógico. Esses gestores precisam estar muito preparados para lidar com esses grandes desafios. Precisam de orientação, acompanhamento, formação e desenvolvimento para que consigam planejar, estruturar, organizar e liderar as escolas para o enfrentamento da maior crise educacional de toda a história.
Além dessas dez ações, temos mais um pedido especial, principalmente aos políticos e gestores dos sistemas educacionais, Ministério de Educação, secretarias estaduais e municipais, conselhos de educação, gestores escolares e ainda a sociedade em geral: precisamos aproveitar essa grande janela de oportunidade que esta crise nos oferece para promover uma revolução na educação. Precisamos de um sistema educacional mais eficaz e justo. Essa pode ser uma das maiores oportunidades para promovê-lo. Que Deus nos ouça e que assim aconteça!
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