Rodrigo Constantino: Com reforma razoável, Guedes engolirá sapos protecionistas
O governo resolveu aumentar o imposto de importação de leite em pó para proteger os produtores nacionais. Já se fala em retornar com subsídios na conta de luz também. E não faltam defensores supostamente à direita justificando as medidas, não só pelo argumento pragmático de que seria um custo para se aprovar a reforma previdenciária, mas com base em “argumentos” econômicos mesmo.
Proteger nossos produtores seria algo positivo em si, alegam, coisa que só “liberaloides puristas” não conseguem entender. Eles seguem “gurus” nacionalistas e populistas…
Que tal um recado de Adam Smith a essa turma? “O interesse dos empresários, em qualquer ramo particular de comércio ou fabricação, é sempre, em alguns aspectos, diferente, e mesmo o oposto, do interesse do público. Ampliar o mercado e reduzir a concorrência será sempre o interesse dos empresários. (…) O consumo é o único fim de toda a produção, o interesse do produtor deve ser atendido apenas na medida em que seja necessário promover o do consumidor.”
Não precisamos ficar só na teoria. A produção de leite na Nova Zelândia nem sempre foi tão sofisticada. Mas desde que um governo de livre mercado chegou ao poder em 1984 e essencialmente cancelou doações para os agricultores – algo que quase todos os outros governos consideraram política e economicamente impossível – a agricultura lá nunca foi a mesma. O ganho de produtividade foi extraordinário.
Quem quiser defender que esse protecionismo é um custo que devemos pagar para atrair a bancada rural para votar a favor das reformas estruturais, tudo bem. É um ponto questionável, mas mais sincero e transparente.
Mas quem tenta justificar que o protecionismo é bom, necessário, pois o Custo Brasil é muito elevado e não podemos retirar subsídios de uma hora para outra, melhor nunca repetir por aí que é liberal. Cola logo no Ciro Gomes e não venha manchar a reputação do liberalismo, por favor.
Que Bolsonaro nunca foi mesmo um liberal convicto nós todos já sabíamos. Mas se a inspiração for Geisel em vez de Paulo Guedes, aí complica.
Com tantos deslizes surge uma questão angustiante: até quando o próprio Guedes aguenta isso? Meu palpite: se sair uma reforma previdenciária bem razoável, ele engole os sapos protecionistas, assim como o mercado. Mas se a reforma for chocha, meia-bomba, fraquinha, aí fica realmente complicado…
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