Quebra de patentes não vai melhorar acesso dos países e pode impedir novas vacinas
Solução é defendida por um grupo de países liderados pela Índia e, mais recentemente, pelos Estados Unidos; medida, no entanto, pode retirar incentivo ao desenvolvimento de imunizantes
Cada pessoa que morre de Covid-19 a esta altura, maio de 2021, poderia ter sido salva se tivesse sido vacinada. Mas enquanto alguns países, como os Estados Unidos e Reino Unido, já têm vacinas para toda a população, a maioria, principalmente os países pobres, ficam sem. Em alguns lugares, a espera vai levar anos. A solução, defende um grupo de países liderados pela Índia, é a quebra das patentes das vacinas, posição encampada agora também pelo governo dos Estados Unidos. Sem ter que pagar pelas patentes, os países pobres poderiam fabricar as próprias vacinas e imunizar suas populações.
Nas palavras das economistas Mariana Mazzucato, Jayati Ghosh e Els Torreele, que assinam um artigo na revista The Economist defendendo a quebra, a descoberta da vacina contra a Covid-19 é um milagre da ciência, pois conseguiu em tempo recorde a cura contra uma epidemia mortal. Porém, a escassez de vacinas estaria desperdiçando este milagre, e criando um apartheid onde alguns escapam e muitos morrem conforme o país onde nasceram. Argumentam, ainda, que as vacinas só surgiram depois dos governos investirem mais de US$ 12 bilhões em seu desenvolvimento, financiando as pesquisas dos laboratórios, e que o lucro da Pfizer, primeira farmacêutica a anunciar uma vacina, no primeiro trimestre, de quase US$ 1 bilhão, é prova de que as vendas até agora já compensaram os custos de desenvolvimento do imunizante.
Na mesma The Economist, Michelle Mcmurry-Heath, imunologista que dirige a Biotechnology Innovation Association, também usa o exemplo da vacina da Pfizer, mas para defender a propriedade intelectual. O imunizante foi apresentado em 2020. No entanto, o laboratório alemão BioNTech e a farmacêutica americana já desenvolviam desde 2018 a tecnologia, que usa o RNA mensageiro, que faz com que funcione tão bem. Não seria tão eficiente sem a possibilidade das empresas lucrarem com a inovação. Além do mais, a construção de fábricas exige muito dinheiro dos países e levaria meses. Dificilmente uma vacina estaria pronta antes daquela oferecida pelos fabricantes originais. Quanto ao argumento do financiamento público, realmente foi assim que a Moderna e a Astrazeneca obtiveram suas vacinas. Mas não a Pfizer, que usou dinheiro privado. Ela argumenta, finalmente, que o governo americano faria mais pela vacinação das nações menos desenvolvidas se juntando ao consórcio Covax, da Organização Mundial de Saúde (OMS), e doando as doses que tem sobrando. Beneficiaria os países no fim da fila das vacinas atuais sem retirar o incentivo ao desenvolvimento de novas, que podem ser necessárias no futuro.
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