Taxar o Whatsapp foi o começo da quebra da economia no Líbano
Muita gente diz que tudo começou a piorar no país com a explosão do porto de Beirute, mas um economista aponta o imposto sobre o uso do aplicativo como princípio da tensão social
Muitos analistas veem a razão da crise atual no Líbano — uma das três piores dos últimos 170 anos, segundo o Banco Mundial — na explosão do porto de Beirute, em agosto do ano passado. Outros falam que esse pode ter sido um evento determinante, mas a crise vinha de antes e foi causada pelo excesso de gastos do governo. A explosão só piorou o que já estava ruim. Mas o economista libanês Nisreen Salti, professor da Universidade de Beirute, tem opinião diferente. A explosão e a crise da dívida são fatores importantes, mas a razão foi outra: taxar o WhatsApp.
Tudo começou nos anos 90, quando o governo libanês adotou uma paridade fixa para o dólar, algo como tinha aqui no começo do Plano Real, quando US$ 1 valia R$ 1. A decisão ajudou o país a atrair investimentos, empresas estrangeiras não precisavam calcular a cotação da moeda. Teriam sempre o mesmo valor para seus dólares. O problema é que muitos libaneses viram aí uma oportunidade de investimento, comprando dólares na crença de que a paridade era impossível. Uma hora a cotação iria subir, e nisso ganhariam dinheiro. O governo, para atender à demanda de dólares, se endividou na moeda no exterior. Acabou com uma dívida que hoje chega a US$ 97 bilhões.
Mas, como conta o economista libanês, as coisas ainda não tinham saído do controle. O país enfrentou várias crises, mas sempre era salvo de última hora. Às vezes, pelos dólares vindos do exterior, outras porque os países vizinhos, como a Arábia Saudita ou o Catar, acabavam ajudando, já que não queriam uma crise tão perto. A coisa saiu de controle, ironicamente, quando o governo decidiu sanear as contas públicas. Propôs aumentar a tributação de vários produtos, como o fumo e a gasolina.
Mas teve um que irritou particularmente as pessoas: um imposto sobre o uso do WhatsApp, aplicativo que é largamente utilizado pela população, principalmente os mais jovens. As ruas foram tomadas por protestos contra o pacote, que acabou rejeitado pelo Congresso libanês. Foi o que liquidou a confiança dos credores no governo. A corrida à moeda americana foi ainda maior, e desta vez não havia dólares para abastecer o mercado, levando a uma disparada na cotação. Quando não faltava mais nada, veio a explosão no porto de Beirute, fazendo a economia entrar no colapso em que ainda se encontra.
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