Se não mexer na Previdência, viramos a Grécia, diz Pezão

  • Por Estadão Conteúdo
  • 13/11/2016 12h44
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O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, após reunião com o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil) Marcelo Camargo/Agência Brasil Luiz Fernando Pezão

Após duro tratamento contra um câncer, que o afastou por sete meses, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) retomou o comando do Rio, no começo do mês, com a recomendação de trabalhar só quatro horas diárias. A crise do Estado, com um rombo de R$ 17,5 bilhões no Orçamento em 2016, que levou à invasão da Assembleia Legislativa por servidores furiosos com a possibilidade de redução salarial líquida de 30%, não deixou. “Se não mexer na Previdência, daqui a pouco eles (os aposentados) não vão receber. É Grécia”, afirma, fazendo referência à crise do país balcânico. A situação levou Pezão, em viagens recentes a Brasília em busca de socorro, a cumprir jornada diária de 8h às 23h, para desespero dos médicos.

Um plano B para o pacote de ajuste apresentado pelo governo do Rio é inevitável, não?

Não sei. Estou muito preocupado com este ano, com encerrá-lo. Com esses arrestos (feitos pelo governo federal), dificultou muito. Decretamos calamidade (pública, por causa da crise fiscal). Não quero tratamento diferenciado, mas tem de pelo menos ter algum equilíbrio nessa calamidade. Sei que o Tesouro Nacional tem uma receita de bolo a ser seguida, mas em um estado de calamidade, tem de ter alguma exceção. Em vez de arrestar R$ 200 milhões (por causa da execução de garantias a dívidas não pagas), será que não pode arrestar R$ 100 milhões e deixar R$ 100 milhões para a próxima semana? Aqui, o caixa é diário. Estávamos, desde 26 de outubro até o dia 6 sob arresto da Justiça. Aí, no dia 7, entramos no arresto do Tesouro Nacional.

A solução precisa de Brasília? 

Precisa muito. Não temos como adiar a reforma da Previdência. Ela é vital para a União, mas é vital para os Estados. Não dá para a gente ter 66% do funcionalismo do Estado tendo aposentadoria especial, com menos de 50 anos. Temos 100 coronéis (da Polícia Militar) na ativa e 600 aposentados, ganhando R$ 23 mil. Se aposentam com 48 anos, 49 anos. Você acha que essa conta vai fechar?

A União deveria ter incluído ajuda para os Estados na meta fiscal?

Especialistas que eu consulto dizem que quem faz (um déficit primário de) R$ 170 bilhões faz de R$ 200 bilhões. Isso poderia ter ajudado os Estados e municípios a sair do sufoco.

Até 2013, o Rio estava crescendo, tinha a perspectiva dos grandes eventos, euforia geral. O que aconteceu? 

Aconteceu uma tempestade perfeita. Primeiro, a queda dos royalties do petróleo, que não passam nem pelo caixa do Estado, vão direto para financiar a Previdência. Com a queda dele, tivemos de aportar recursos do Tesouro para cobrir o déficit previdenciário. Segundo, se a Petrobrás é importante para o Brasil, imagine para o Rio de Janeiro. Todo o teatro de operações da Petrobrás, 80%, é aqui. Se ela se paralisa, tudo o que gira em torno – a indústria naval, a atividade de empresas que fornecem para a Petrobrás – também para. Terceiro, nunca tivemos isso, nem na Grande Depressão (no final da década de 20): estamos quase chegando a 7% de queda no PIB. O Rio perdeu 23% da arrecadação.

O Sr. fez uma campanha pela reeleição, em 2014, otimista. Não dava para ver o que estava acontecendo?

Havia coisa represada nas despesas. O Rio e o Espírito Santo são os que menos gastam com o Executivo no Brasil, proporcionalmente à sua receita. A gente tem um funcionalismo muito mal remunerado no Executivo. Foram correções.

Mas o Espírito Santo fez um ajuste forte em 2015 e também depende do petróleo. Por que o Rio não fez o mesmo?

A gente voltou ao custeio de 2013 em 2015. E fizemos uma coisa que parecia impossível: R$ 15,6 bilhões, em 2015 e 2016, de receitas extraordinárias. Na crise. Veio de depósitos judiciais, de um TACT (Termo de Ajuste de Conduta Tributária) que fizemos com devedores do Estado. E, em 2016, estamos cortando mais despesas ainda. Não sei se chega de volta a 2013 ou 2012.

Reformar a Previdência não mexe com direitos?

Não quero cortar em direito adquirido de ninguém, mas não vai ter Previdência para pagar isso. Eu tenho 438 mil funcionários, 232 mil inativos e 216 mil ativos. Qual medida que se toma diante de uma redução de 7% do PIB, se não se pode mexer no inativo? Se não mexer na Previdência, daqui a pouco eles (os aposentados) não vão receber. É Grécia. Tenho mais professor inativo do que ativo, em um momento em que a população está demandando mais serviços, porque ninguém tem mais dinheiro para pagar plano de saúde e colégio particular. Eu cuido de 16 milhões (população do Rio) ou cuido de 400 mil pessoas (servidores)? Tenho de cuidar de tudo, mas o dinheiro é finito.

Muita gente atribui a crise às perdas de receita por causa de incentivos fiscais. Concorda?

Sou totalmente favorável aos incentivos. A fábrica da Nissan nós disputamos com 15 Estados. Se ela não está ali, em Resende (Sul Fluminense), estaria em outro lugar com os mesmos incentivos. Viramos competitivos, porque entramos na guerra fiscal. Ela tem de acabar para todo mundo. Agora, não podemos perder investimentos. Nos tornamos o segundo polo siderúrgico, o segundo polo cervejeiro e o segundo polo automotivo do País. A Land Rover e a Nissan vieram para cá por causa disso.

A dívida do Rio saiu de R$ 59 bilhões em 2010 para R$ 107 bilhões em 2015. A que atribuir aumento tão grande?

Ao crescimento dos juros da dívida, que era corrigida pela aquela maluquice de IGP-DI mais 6% ou 9%. O Estado ficou 10 anos sem capacidade de endividamento. Quando a União abriu (capacidade), e o Rio tinha feito o dever de casa, pegou crédito para fazer investimento. Mas o crescimento é mesmo do serviço da dívida. O governo Garotinho (1999-2002) renegociou R$ 22 bilhões, nós já pagamos R$ 46 bilhões e devemos R$ 70 bilhões. Como pode? IGP-DI mais 6%, nem agiota cobra.

O senhor falou que não pediu intervenção, mas teme que a situação social se agrave, com mais manifestações? 

Medo eu não tenho de nada. Depois do que eu enfrentei na minha doença, eu não tenho medo de nada, mas sei o problema social que vamos ter no País, não é só no Rio. Vamos ter problemas sociais fortes. São 14 milhões de desempregados, atrasos de pagamento, de fornecedores e de terceirizados. É um caldeirão difícil. Mas tem de ser enfrentado, temos de descobrir caminhos. Só ontem à noite (quinta-feira) falei com 12 governadores. Oito me ligaram e eu liguei para quatro. Todo mundo quer equilibrar sua Previdência. 

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