Vera: Ao deixar aliados pelo caminho, Bolsonaro cria inimigos de forma desnecessária
O general Santos Cruz, demitido da Secretaria-Geral da Presidência da República, é um amigo da vida toda do presidente Jair Bolsonaro. As famílias se frequentavam, estiveram juntos em Campinas, no Rio de Janeiro. Ele ajudou muito Bolsonaro, viajou bastante com ele. Esteve, inclusive, em Juiz de Fora (MG), quando houve a facada. Era alguém que era da intimidade do presidente, uns dos primeiros ministros designados para o ministério e foi designado para um cargo importante no governo.
Dentro de suas atribuições, ele começou a entrar em rota de colisão com alguns aliados do presidente, como Olavo de Carvalho e Carlos, que tinham uma visão diferente do que deveria ser a comunicação do governo e a ocupação de cargos. Essa questão ideológica acabou pesando para a sua saída, saída essa bastante tumultuada porque ela foi antecedida por um processo de fritura muito chato e ruim para alguém que é amigo.
Dentro dessa franqueza, o general tinha chamado Bolsonaro para uma conversa, mais um ou menos um mês antes de ser demitido. Foi uma conversa dura, difícil, mas eles tinham acertado que Santos Cruz ficaria, até porque houve solidariedade dos demais militares do governo e ele conseguiu permanecer.
Mas Santos Cruz já tinha quebrado cristal e as relações não tinham voltado a ser as mesmas de antes.
Na entrevista à revista Época, ele não dá muitas informações sobre sua demissão, mas faz críticas ao que ele chama de barulho, fumaça, que impediram, inclusive, que coisas boas do governo fossem noticiadas. Essa entrevista não foi bem recebida, Bolsonaro deu de ombros, foi bem ríspido ao dizer que Santos Cruz é página virada, enterrando o assunto.
Na entrevista ao Jornal da Manhã, o general Heleno procurou minimizar a saída do companheiro, dizendo que foi um caso pontual, que não houve nenhuma cizânia, mas além de Santos Cruz outros militares foram demitidos.
Além disso, militares da ativa estão sendo chamados para irem para ministérios. Isso causa constrangimentos nas Forças Armadas. Conversei com vários militares da reserva que vêm risco de contaminação política quando coloca militares da ativa em postos de comando do governo.
Era bom o presidente dar uma arrumada nessa questão porque fazia muito tempo que os militares não tinham tanto protagonismo assim num governo. Para que isso não vire uma fritura ou uma fonte de crise, é uma questão de não saber manejar direito, politicamente, essa situação.
Alta volatilidade em 6 meses
Tem muita mudança de ministérios e postos importantes em pouco espaço de tempo. Na Secretaria-Geral da Presidência da República, por exemplo, o general Santos Cruz era o segundo ministro. O primeiro foi Gustavo Bebianno, fritado em óleo quente, que saiu insatisfeito e continua muito insatisfeito com Bolsonaro.
O presidente está criando inimigos que não precisa criar porque são pessoas que gostam do presidente, que estavam aderindo a seus projetos, eram entusiastas de seu projetos, e vão sendo deixados pelo caminho sempre de uma maneira ruidosa, com pouco manejo, pouco trato diplomático.
O general Floriano Peixoto aceita algo que santos Cruz diz na entrevista que ele acha que seria algo indigno: deixar um ponto no primeiro escalão e ir para um secundário, que é o caso da presidência dos Correios. Presidência essa que já teve um general retirado do posto por Bolsonaro sem muita camaradagem, porque estava agindo como um “sindicalista” e era também um militar.
Por tudo isso que eu digo que as coisas vão caminhando para uma situação em que era necessário que o presidente fosse aconselhado por aqueles ministros que têm maior ascendência sobre ele a fazer esse tipo de demissão com mais tato, pesar direito as consequências de deixar ex-amigos pelo caminho, de mexer assim com militares depois de dar a eles tanto poder e de fazer trocas na equipe em um prazo tão curto.
O próprio general Heleno na entrevista à Jovem Pan afirmou que cobram tanto do governo em pouco tempo e é justamente pouco tempo de governo para tanta mexida assim. A demissão de Joaquim Levy da presidência do BNDES foi outro caso.
Esse tipo de coisa é importante para o governo se estabilizar politicamente, fazer com que trocas no primeiro e segundo escalão sejam feitas de forma mais coesa, com menos ruído e que deixe insatisfeitos pelo caminho.
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