CPMI não vai explorar ‘teorias, versões ou narrativas’; por que, não?

Em seu plano de trabalho, a relatora Eliziane Gama diz que ‘nenhum brasileiro pretende ver um circo, um festival de horrores, mas um trabalho técnico-político conduzido com a seriedade e com a serenidade necessárias’

  • Por Claudio Dantas
  • 06/06/2023 11h27 - Atualizado em 06/06/2023 11h45
Geraldo Magela/Agência Senado senador Marcos do Val (Podemos-ES); senador Izalci Lucas (PSDB-DF); senadora Soraya Thronicke (União-MS). Senadores e deputados durante sessão da CPMI do 8 de Janeiro

No plano de trabalho entregue há pouco à CPMI do 8 de janeiro, a relatora Eliziane Gama (Cidadania/MA) diz que o colegiado não vai explorar “teorias, versões ou narrativas”. “Nossa busca irrestrita e incansável será pela elucidação dos fatos, nada além ou aquém disso”, diz. Segundo ela, “nosso papel será o de investigar eventos, e não a opinião sobre esses eventos”. Ela também ressalta que “nenhum brasileiro pretende ver um circo, um festival de horrores, mas um trabalho técnico-político conduzido com a seriedade e com a serenidade necessárias”.

Como brasileiro pagador de impostos, me enquadro no grupo que não pretende assistir a um circo, embora meu ceticismo e experiências anteriores em coberturas de CPIs — uma dezena em pouco mais de duas décadas — me levem a crer que o esforço será em vão. CPIs são espetáculos políticos; em anos pré-eleitorais, fatalmente se transformam em festival de horrores. A preocupação da senadora é nobre.

Por outro lado, é obrigação de qualquer investigador considerar todas as hipóteses possíveis, como ponto de partida — neste caso, não se deve descartar antecipadamente o risco de eventuais omissões de autoridades ou infiltração de grupos radicais. No decorrer da apuração, com a coleta de evidências e depoimentos, descarta-se as teses menos prováveis, percorre-se os caminhos mais promissores, reconstitui-se episódios, identifica-se seus agentes, para então responsabilizá-los.

Nesse sentido, deve-se reconhecer o mérito da relatora ao considerar a necessidade de se ouvir, no momento adequado, o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino; seu aliado, além do secretário-executivo do MJSP, Ricardo Capelli, ex-interventor na Segurança Pública do Distrito Federal. É esperada com ansiedade também a convocação do general Gonçalves Dias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e de seu antecessor, general Augusto Heleno; além de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do GDF.

Em seu plano, Eliziane defende ainda que a CPMI apure fatos pretéritos ao 8 de janeiro, como os distúrbios de 12 de dezembro em Brasília e o atentado frustrado com um caminhão-tanque no aeroporto da capital federal. Todos os envolvidos devem ser chamados a depor. “Nesse sentido, tentaremos identificar os autores intelectuais, os financiadores e os agentes públicos envolvidos.” Por fim, chama a atenção, positivamente, o interesse, ainda que tímido, de se apurar eventuais violações de direitos humanos dos quase 2 mil detidos no episódio. 

Como bem disse o senador Eduardo Girão (Novo/CE), a comissão “precisa fazer a autópsia e enterrar” o caso. “Não podemos deixar um defunto na sala.” A busca é pela verdade histórica.

 

Leia abaixo as principais linhas de investigação:

+ A atuação de Anderson Torres, enquanto Ministro da Justiça e Segurança Pública, e sua relação com a ação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e com o seu então Diretor, Silvinei Vasques, no segundo turno das eleições e diante das manifestações golpistas ocorridas nas rodovias nacionais logo após o resultado das eleições;

+ A atuação de Anderson Torres, enquanto Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal;

+ Os acontecimentos dos dias 12 e 24 de dezembro de 2022;

+ Os acampamentos na região do Quartel-General do Exército e os atos antidemocráticos contra as sedes dos Três Poderes para identificar seus mentores, financiadores e executores;

+ O planejamento e a atuação dos órgãos de segurança pública da União e do Distrito Federal no dia 08 de janeiro, bem como o apagão na execução das medidas de contenção;

+ As manifestações públicas e em redes sociais de agentes políticos contra o resultado das eleições;

+ A relação do Tenente-Coronel Mauro Cid com pessoas envolvidas com o fato determinado investigado por esta CPMI e com eventuais conspirações golpistas, e

+ A atuação dos órgãos das Forças Armadas e sua relação com os acampamentos na região do Quartel-General do Exército.

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