Recomendação do MPF sobre contaminação de mercúrio em terra indígena no Pará é ignorada pelo governo

Cúpula da Amazônia será oportunidade para explicar omissão sobre pedido para declaração de emergência em saúde pública na bacia do Rio Tapajós por contaminação de mercúrio

  • Por Claudio Dantas
  • 07/08/2023 12h03 - Atualizado em 07/08/2023 12h17
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Marizilda Cruppe/Fotos Públicas Tapajós Garimpo ilegal na TI Munduruku

Lula recebe a partir de amanhã, em Belém (PA), chefes de Estado de 15 países para a Cúpula da Amazônia. Será uma boa oportunidade para explicar por que até agora seu governo nada fez sobre a recomendação do Ministério Público Federal para que declarasse emergência em saúde pública na bacia do Rio Tapajós por contaminação de mercúrio. A solicitação foi feita ainda em abril pelo procurador Gabriel Dalla Favera de Oliveira, que deu 30 dias para manifestação do Ministério da Saúde, e outros 180 dias para implementação de um plano de ação sugerido. O MPF instaurou inquérito civil para apurar a responsabilidade pelo desastre ambiental, anexando estudos da Fiocruz, da UFRJ e do Imperial College London que mostram a contaminação na região de Itaituba, especialmente na terra indígena Munduruku, chega a 57,9%. A recomendação do MPF foi enviada à Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, que encaminhou o caso para a Secretaria de Saúde Indígena, mas nada foi feito até o momento.

Ao mencionar os estudos realizados na região, dominada pelo garimpo, o procurador ressalta que “os achados não deixam dúvidas que os indígenas, residentes nas aldeias investigadas, ingerem pescado contaminado por mercúrio em concentrações muito acima dos limites reconhecidos, internacionalmente, como seguros”. “Portanto, encontram-se sob risco permanente de adoecer devido aos efeitos tóxicos do mercúrio no organismo, conforme demonstrado ao longo deste relatório. Este cenário sombrio é ainda mais preocupante para as mulheres em idade fértil e para as crianças menores 5 anos, populações reconhecidamente mais vulneráveis aos efeitos nefastos da contaminação.” Oliveira diz que 7 em cada 10 crianças e adolescentes, de 10 a 19 anos, apresentam índices de mercúrio acima do limite de 6μg.g-1 — a mediana foi 6,6 μg.g-1, com variação entre 1,4 e 23,9 μg.g-1. A cada 10 crianças menores de 5 anos, 4 apresentam elevadas concentrações de mercúrio. Na aldeia Sawré Aboy, 8 em cada 10 crianças menores de 12 anos também apresentavam alto índice do metal.

“A persistência da deliberada omissão do Estado brasileiro em reconhecer e envidar esforços no sentido de prevenir a contaminação e tratar a população contaminada por mercúrio há de refletir, observando-se o alto grau de contaminação do povo indígena Munduruku, não apenas a vulneração dos direitos fundamentais à vida, à saúde e à felicidade, mas igualmente perspectiva etnocida, eis que redundará em relegar o povo Munduruku – e as demais populações afetadas – à própria sorte e assim lhe imputar o ônus de abandonar suas práticas tradicionais – inclusive alimentares – com vistas a garantir a sua subsistência”, alerta o procurador, que recomenda, entre outras coisas, o desenvolvimento de plano de descontinuidade do uso de mercúrio na mineração artesanal de ouro na região, a elaboração de Plano de Manejo de Risco para as populações cronicamente expostas ao mercúrio, o monitoramento sistemático dos níveis do metal na população Munduruku, assim como o acompanhamento clínico dos afetados e o emprego da Força Nacional do SUS para a testagem ampla da população.

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