Um número na balança não deveria nortear nossas vidas

O peso ainda é um rótulo que teima em definir nossa potência ou reprovar quem somos

  • Por EdiCase
  • 09/09/2023 10h00 - Atualizado em 09/09/2023 11h48
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Números na balança não determinam quem são as pessoas e não devem conduzir a vida delas Números na balança não determinam quem são as pessoas e não devem conduzir a vida delas Imagem: Golden Sikorka | Shutterstock

“Sua saúde está ótima, mas você poderia emagrecer um pouco. Imagina como não ficaria se perdesse peso?”. Ouvi isso do cardiologista, depois de levar uma pilha de exames para verificar como estou. Respondi: “emagrecer não é algo fácil”. “Se tiver força de vontade, você consegue”, rebateu. Saí do consultório arrasada com o rótulo daquela que “não tem força de vontade”.

Não está escrito, mas é dito nas entrelinhas

Corrida de rua e pilates duas vezes por semana, aula de bicicleta, uma. Basta fazer uma soma para descobrir que me exercito cinco vezes por semana. Mas olho para o cardápio e sei onde estou derrapando. Gosto de doces.

Não como em quantidade, mas habitualmente pego um pedacinho deste ou daquele. Passei a vida em dieta, controlando, calculando. Já tomei remédios, de todo tipo. Tudo para caber na calça 36 e naquilo que as pessoas esperavam de mim. Quem disse que mulheres bonitas, bem-sucedidas e saudáveis não podem ser gordas? Não está escrito, mas é dito nas entrelinhas.

Não resistir à tentação não significa fracasso

Sei que engordei nos últimos dois anos. Mais do que gostaria. As roupas de sempre deixaram de caber, o que provoca reencontros com velhos fantasmas. Não sei se engordei pela chegada dos 50, dos hormônios em curva descendente ou pela angústia e tristeza da rotina com meus pais. Papai está com 87. Mamãe, 81. Era para eles que corria quando precisava ser cuidada. Agora, sou eu quem cuida.

A gente não é preparada para ver o pai usar fraldas. Ou para dizer à mãe o que deve ou não fazer. Desculpe, senhor cardiologista. Mas aquele pedaço de bolo de brigadeiro, que só a minha mãe sabe fazer, não vai mais existir em poucos anos. Comi um. Não tive força de vontade. Da mesma forma que não resisti ao pedaço de delícia de abacaxi, doce que minha tia Lybia preparava. A tia que amava e se foi, ano passado, sem lembrar o próprio nome.

Ilustração de duas bonecas em cima de uma balança medindo o peso corporal
Quilos extras na balança não determinam a força de vontade ou a qualidade de vida das pessoas (Imagem: Arina Kumysheva | Shutterstock)

Quilos extras não dizem nada sobre as pessoas

Tenho força de vontade para me exercitar de manhã porque a endorfina arrebata minha melancolia. Para trabalhar até tarde porque preciso fazer a minha vida e a dos meus filhos acontecer. Para ir à casa dos meus pais, apesar dos incômodos. Meus quilos extras não me fazem menos saudável, mas o incomodam.

Você olha para mim a partir da superfície. Mas vivo mergulhada na minha intensidade. De ser. Escrevo este texto após ler sobre a reavaliação do Índice de Massa Corpórea (IMC) como parâmetro único para medir a saúde de alguém. Um rótulo que teima em definir pessoas. Uma pena.

Por Ana Holanda – revista Vida Simples

Segue se exercitando porque gosta, mas não topa mais dietas restritivas.

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