Movimentos de renovação esbarram na política “real”
Meses atrás, de longe, a onda parecia gigante e inevitável. Ao mesmo tempo em que a Operação Lava Jato abalava importantes figuras da classe política tradicional, pesquisas de opinião indicavam que a população estava disposta a votar em novos rostos. Identificados com esse sentimento, movimentos de renovação foram surgindo por todo o País – com estimativas positivas quanto à possibilidade de eleger “sangue novo”.
Hoje, de perto, essa mesma onda ameaça chegar muito menor na praia eleitoral, correndo o risco de produzir apenas uma inofensiva espuma. “Entre o entusiasmo e a realidade existe um descompasso. O nosso sistema atua como desarticulador da mudança, e ele se blindou. Essa eleição vai trazer o menor índice de renovação da história. Com a reforma eleitoral, o Congresso já ‘contratou’ a eleição. Ou seja, todos os recursos serão alocados para reeleger os nomes de sempre ou seus apadrinhados”, disse o especialista em Direito Eleitoral Luiz Fernando Pereira.
Com a restrição de recursos (o fundo eleitoral terá R$ 1,7 bilhão), um período menor de propaganda gratuita, a impossibilidade de candidaturas independentes e nenhum presidenciável outsider para fomentar a ideia do novo, os partidos devem concentrar a estratégia nos candidatos conhecidos para garantir a eleição. “Quem vai indicar para quem vai o dinheiro de campanha são nomes como Roberto Jefferson (presidente do PTB), Valdemar Costa Neto (presidente do PR), Romero Jucá (presidente do MDB)…”, provocou Pereira.
Os próprios grupos de renovação já calibraram seus discursos. O otimismo do começo deu lugar ao realismo e às “perspectivas de longo prazo”. Em setembro de 2017, o movimento RenovaBr, que oferece bolsa de estudos para candidatos ao Legislativo (federal e estadual), imaginava eleger de 70 a 100 nomes. Com o decorrer dos meses, as estimativas deixaram de ser públicas – e hoje giram em torno de 20% em um universo de 131 bolsistas elegíveis. Outro movimento de formação de líderes, a Raps, também falava em 60 a 80 deputados eleitos, mas, atualmente, já não tem divulgado projeções que possam, eventualmente, criar falsas expectativas.
Desistências
Alguns nomes que pareciam ter potencial eleitoral nem sequer estão dispostos a arriscar. Um dos casos mais marcantes é o de Rafael Parente, de 40 anos, filho do presidente da Petrobrás, Pedro Parente.
Pós-graduado em educação pela New York University (NYU), fundador de uma startup de educação, cofundador de um grupo de renovação (o Agora!) e com um relativo sucesso nas redes sociais (mais de 130 mil seguidores), ele parecia pronto para encarar o desafio de uma candidatura. Mas, desistiu. “Desde o início, no Agora!, debatíamos sobre a necessidade de candidaturas que representassem esse sentimento de renovação. Eu me animei”, disse Parente. “Aí conversei com meu pai. Nas conversas, entendi que, no Brasil, seria difícil acontecer um processo de renovação no estilo Emmanuel Macron (presidente francês). E, além do mais, eu tinha que me filiar a um partido, tinha que assumir o carimbo de um partido”, afirmou. “Ponderei sobre meus compromissos profissionais e desisti de concorrer.”
O medo
Para a pesquisadora Beatriz Pedreira, do Instituto Update, essa ainda não será a eleição da renovação, “No começo, os grupos se empolgaram muito. Tinha aquela empolgação inicial do ‘vamos salvar o Brasil’. Mas não será nesta eleição que a gente vai fazer a renovação que se imaginou no início do processo. Meu receio é de que isso frustre muito”, afirmou. “Essa reação do sistema à possibilidade de renovação não é só brasileira. De qualquer forma, é preciso que esses grupos continuem trabalhando e apontando para o futuro.”
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