Professores analisam as propostas dos candidatos à Presidência para a educação

  • Por Amanda Bozza/Jovem Pan
  • 15/10/2018 19h53 - Atualizado em 15/10/2018 20h04
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Montagem Apesar de alguns destaques nos planos de ambos os candidatos, há um consenso: existem lacunas que impossibilitam prever se qualquer um deles dará certo se implementado

Neste Dia dos Professores, a Jovem Pan conversou com docentes e especialistas em educação para entender as expectativas para os próximos quatro anos em uma pasta que enfrenta problemas como o congelamento de gastos, debates sobre o conteúdo curricular, alto índice de evasão e baixo rendimento dos alunos.

Professores, gestores e críticos da educação analisaram as propostas dos candidatos à Presidência Fernando Haddad e Jair Bolsonaro, observando os possíveis efeitos colaterais que as medidas oferecidas nos planos de governo podem gerar para o futuro da Educação.

A reportagem conversou com quatro especialistas do setor. Apesar de alguns destaques nos planos de ambos os candidatos, há um consenso: existem lacunas que impossibilitam prever se qualquer um deles dará certo se implementado.

Propostas dos candidatos para Educação: Bolsonaro x Haddad  

Ler os planos de governo é um exercício de conhecimento da diversidade brasileira, é assim que se inicia a análise da Mestre em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano e Analista de Políticas Públicas do Instituto SOMOS, Juliana Spinelli Ferrari Sinzato. Para ela, os os planos de governo para educação dos dois candidatos têm características muito distintas. “Percebo uma séria carência de descrições nas propostas do candidato Jair Bolsonaro, apesar de estar ligado ao compromisso de melhorar o posicionamento do Brasil em rankings como o PISA, a partir de modelos aplicados em países como Taiwan, Coréia do Sul e Japão”, afirma. “De outro lado, temos um plano apresentado por Fernando Haddad em que estão listados muitos dos compromissos selados pelo Brasil, como o Pacto Nacional pela Educação e os instrumentos que devem ser fortalecidos ou reestruturados para tal missão”.

A especialista também observa que ambos os candidatos apontam uma importante faceta do sistema educacional brasileiro: custa caro e tem resultados muito pouco eficientes. “Enquanto Bolsonaro propõe que investimentos em educação sejam uma prioridade em seu governo, fica difícil entender como se dará o plano estratégico dessa transformação, já Haddad apresenta a proposta do Custo-Aluno-Educação, uma medida da Campanha Nacional pelo Direito à Educação para o reconhecimento e o uso dos indicadores educacionais com vistas à educação de qualidade”, explica Sinzato.

Apesar de corroborar com algumas questões levantadas por Juliana, o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Arthur Igreja alfineta as ações pouco práticas sugeridas pelos candidatos. “O programa do Bolsonaro em termos de educação é superficial, assim como a grande maioria das suas propostas, que se baseiam apenas em´vamos resolver isso’, mas como, ninguém sabe ao certo”, afirma. “No do Haddad, até em razão de ele ter tido essa experiência como Ministro da Educação por muito tempo, as propostas são mais detalhadas, porém, carecem de uma sintonia com a realidade, pois quando ele fala que vai sair dos quase 5% do PIB para 10%, é aquela velha vertente do PT de tentar fazer as coisas sem ter dinheiro para fazê-las”.

diretora da Fundação SM Brasil e ex-secretária Municipal de Educação da Prefeitura de Belo Horizonte, Maria Piar Lacerda, acredita que o programa e as propostas de Fernando Haddad são sim mais embasadas na realidade econômica do Ministério da Educação e no conhecimento da situação geral da educação brasileira. Ela alerta que as propostas de Bolsonaro têm menos conexão com a realidade. “Ao falar em educação a distância para todas as etapas da educação básica, ele desconhece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e ao mesmo tempo não reconhece a situação da maioria da população em relação a ter boas redes de Wi-Fi em casa ou deixar a criança em casa, sozinha, diante de um computador, sem merenda, sem livro, sem colegas e o mais grave, sem professores por perto para orientar os estudos”, diz.

Representando a ponta do Ensino Básico, Renan Freitas, professor de Geografia e Atualidades da rede pública e privada, observa também a distinção das propostas dos candidatos: “Pelo lado de Jair Bolsonaro o plano dele levanta problemas que realmente são enfrentados na educação, diz que atuará para investir no ensino básico e médio e que os estudantes terão mais aulas de matemática, ciências e português, mas falha um pouco ao explicar de que forma fará isso”, afirma. “O plano de Fernando Haddad parte da premissa de fortalecer alguns programas já criados pelos governos petistas, entre eles o PBID a Universidade Aberta do Brasil. Há propostas para inclusão de minorias, além de buscar integralizar o ensino médio que é encarado como um grande problema visto a evasão escolar”.

Efeitos colaterais 

Quando perguntados sobre os efeitos colaterais da enorme polarização em que o Brasil se encontra e como isso pode impactar o futuro da educação, é possível enxergar uma imensidão de possibilidades.

Juliana Sinzato acredita que é muito importante analisar o tipo de abertura que cada plano de governo deixa para o debate e a participação democrática na educação. “Podemos prever um sucateamento da educação, passando à iniciativa individual grande parte da responsabilidade pela educação? Sim. Podemos dizer que o apelo a uma tendência empreendedora, em escolas onde não há propostas para o desenvolvimento da criatividade, da sensibilidade e do humanismo, vai gerar sofrimento e estagnação de muitos estudantes em ter que criar a partir de um grande vazio?  Sim, com certeza. Podemos prever também que uma educação que não sai do lugar onde está, por insistência e confiança em modelos e instrumentos conhecidos, pode ser problemática e dificultar o alcance de metas fundamentais? É claro”, completa.

Arthur Igreja entende que um dos efeitos colaterais de ambos os planos é a privação do Brasil em sair da armadilha de uma educação de baixa qualidade, que impossibilita o país se aproximar de países como Coreia do Sul, que priorizam a educação e que conseguem ter, anos depois, a colheita de resultados econômicos expressivos. “Infelizmente, o Brasil está nessa ciranda de educação mal gerida, apostas nas mesmas metodologias do passado e aprisionamento em empregos e criação de produtos de baixo valor agregado”, finaliza.

Para Lacerda, o problema pode ser o alijamento de parte da população do direito à educação e a formação de estudantes menos reflexivos e criativos (demandas fortes hoje do mercado de trabalho).

Freitas, por sua vez, acha difícil apontar efeitos colaterais, mas faz algumas observações importantes. Na sua visão, para o plano petista dar certo, é necessário “um gasto maior da máquina estatal e, ao observarmos os discursos da sociedade, isso talvez não seja bem aceito. Ao mesmo tempo no plano de educação do PSL acaba colocando certas questões morais como uma das principais problemáticas da educação, então é possível prever um governo onde se tente restituir “moral e cívica” e pautas como o escola sem partido ganhe relevância.

 

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