A censura franquista e a cruzada contra os decotes na Espanha

  • Por Agencia EFE
  • 07/01/2014 10h39
EFE Marilyn Monroe foi uma das vítimas da censura

Magdalena Tsanis.

Madri, 7 jan (EFE).- Os decotes de Marilyn Monroe, Sophia Loren, Ava Gardner e de outras divas do cinema foram a principal fixação da censura da ditadura franquista espanhola na cruzada contra o erotismo, conta o livro “La censura franquista em el cartel de cine” (“A censura franquista no cartaz de cinema”, em tradução livre), que acaba de ser publicado na Espanha.

Nada que pudesse alterar a moral e a ordem estabelecidas – ideias políticas, religião, mas sobretudo sexo – escapava do controle dos censores, que devolviam os cartazes aos artistas para retocá-los várias vezes, segundo explica o autor e colecionador Bienvenido Llopis em entrevista à Agência Efe.

Foi assim que o tomara-que-caia de Rita Hayworth magicamente ganhou mangas em uma imagem promocional de “Gilda”, que as Bond Girls mais sensuais de “Moscou contra 007” simplesmente sumiram do cartaz, e Sara Montiel abraçou o vazio em “A mulher perdida” quando o corpo de Giancarlo Del Duca foi apagado.

A fenda do vestido de Anita Ekberg em “A Doce Vida” foi considerada muito ousada e aparece coberta em folhetos que nunca chegaram a ser distribuídos, já que a censura optou diretamente por proibir o filme.

E algo parecido aconteceu com “O Eterno Pretendente” com Cary Grant, cujos panfletos foram destruídos porque o título em espanhol (igual à versão em português) foi considerado inadmissível para os censores.

A ideia de reunir o material surgiu para Llopis há 28 anos. Na época tinha um ponto de venda no principal mercadinho de Madri, o Rastro.

Um cliente, dono de alguns cinemas na cidade de Burgos, se aproximou e lhe mostrou um panfleto do filme “Caminho de Santa Fé” com um selo do arcebispado local estrategicamente colocado para camuflar o beijo de Errol Flynn e Olivia de Havilland.

“Isso me acendeu uma lampadinha”, disse o autor, que dedicou meia vida ao projeto, que está sendo bem recebido na Espanha.

“Busquei por toda Espanha, correndo o país de cima a baixo”, conta Llopis, que comprou anuários do cinema espanhol do início dos anos 60, com as listas de empresários de cinema, endereços e telefones, e começou a viajar.

“Fiz viagens de três a 25 dias, entrando nas cidades, perguntando às pessoas, algumas vezes com mais sorte que outras. Encontrei cinemas que podiam estar cheios de material e estavam havia 20 anos fechados, e outros que chegavas e havia um supermercado ou um bingo”, contou.

Algumas vezes até os nomes e rostos de determinadas estrelas o regime não via com bons olhos e, claro, censurava. Assim, Charles Chaplin aparece sem cabeça e rotulado como “Carlitos” nos cartazes de “Shanghaied”.

James Cagney também era frequentemente excluído dos elencos, enquanto outros como Joan Crawford e Bette Davis eram incluídos e depois apagados.

Além de cartazes e programas, o livro inclui trechos cortados de jornais e postais.

“Em 99% dos casos os cartazes eram feitos por artistas espanhóis, contratados pelas distribuidoras”, explicou o autor, citando nomes como Jano, “o mais prolífico”, Joseph Soligó, “o preferido dos colecionadores” e Macario Gómez, seu favorito.

A censura terminou por decreto do Diário Oficial do Estado (BOE) em 1º de dezembro de 1977, e embora sua prática não tenha sido imediatamente extinta, os artistas começaram a pôr em prática seu desejo de liberdade.

Nos anos seguintes, havia tanta pressa de despir as mulheres que Jane Birkin, que aparecia de jeans e camiseta no cartaz francês de “Catherine et Cie”, no cartaz espanhol usava um biquíni, um prelúdio da “exibição de pele” que viria após o fim da ditadura. EFE

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