A ideia de desenvolvimento nega a identidade dos povos, diz Mia Couto

  • Por Agencia Brasil
  • 16/04/2014 23h43
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Escritor moçambicano criticou a ideia de que a natureza pode ser “controlada, administrada”. Para ele, é preciso localizar as razões pelas quais o mundo enfrenta, hoje, uma crise ambiental profunda (Luís Miguel Martins / Creative Commons)

A utopia do desenvolvimento sustentável foi o tema do debate que reuniu cientistas, escritores e até presidente da República, na 2ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura, hoje (16), em Brasília. O escritor moçambicano Mia Couto criticou a ideia de que a natureza pode ser “controlada, administrada”. Para ele, é preciso localizar as razões pelas quais o mundo enfrenta, hoje, uma crise ambiental profunda: “Esse sistema não está mal porque não anda bem. Está mal porque produz miséria, desigualdade, causa ruptura em modos que vida que aí, sim, poderiam ser sustentáveis”.

Crítico da ideia de desenvolvimento sustentável, o escritor e também biólogo avalia que a ideia de desenvolver traz uma negação. “Estamos retirando o núcleo central, o ambiente. E essa negação é a negação da identidade cultural dos povos que foram expropriados”. Povos cujos modos de vida poderiam inspirar uma relação do homem com a natureza, que seja baseada no respeito e não na compreensão “de que a natureza pode ser vista como um recurso natural”, segundo Mia Couto.

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Integrante do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, ligado às Organizações das Nações Unidas (ONU), o cientista Carlos Nobre defendeu a ideia de desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade, para ele, deixaria de ser um adjetivo do desenvolvimento para transformar-se em substantivo que explica a relação com o mundo ou desejos, como felicidade, equidade e justiça. Ele destacou a gravidade das mudanças climáticas e os impactos ambientais decorrentes delas: “Os riscos que estamos colocando para o planeta, nas próximas décadas, séculos e milênios, são enormes. Nós estamos conduzindo a biologia do planeta à sexta grande extinção. Nós estamos produzindo, por ações humanas, a extinção de até 40% das espécies”.

O presidente de Gana, Dramani Mahama, que é historiador e especialista em uso de tecnologia para a agricultura, alertou para a necessária mudança no comportamento dos seres humanos. “Se não criarmos uma teoria que nos ajude a sustentar a raça humana no mundo e continuarmos com essas taxas de consumo, o que vai acontecer com a raça humana?”, questionou, ao destacar que a população despeja diariamente a mesma quantidade de alimento que consome, e que, por outro lado, falta alimento a parte da população. “Nós precisamos aprender a existir com todas as espécies em nosso planeta, que é o único que temos. E nós só vamos aprender se mudarmos nosso conceito de felicidade e de bem-estar”, sentenciou.

A mudança de paradigma, que conduza a outra relação com a natureza, para os debatedores, deve começar desde já. A tecnologia e a inteligência humana devem ser usadas como ferramentas para a superação da crise atual, e a literatura deve ser capaz de despertar sensibilidades e reflexões. Para a Agência Brasil, Mia Couto disse que a literatura pode, desde já, “mostrar que o ambiente não é assim como nós o arrumamos; mas é tudo; não está fora de nós; está dentro de nós. A literatura pode fazer, e deve fazer essa denúncia daquilo que é uma espécie de fabricação permanente da desigualdade e da miséria”, afirmou. Crítico da situação atual, o escritor alertou: “Nós estamos falando de uma situação que poderá ser catastrófica. Mas para dois terços da humanidade, essa catástrofe já está aqui e vem por causa da fome, da guerra”.

Editor Stênio Ribeiro

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