Adriana Calcanhotto, a cantora que quer levar a poesia ao povo

  • Por Agencia EFE
  • 21/03/2014 16h04

Adriana Calcanhotto falou sobre seu novo álbum em entrevista

Divulgação Adriana Calcanhotto

Funchal (Madeira), 21 mar (EFE).- Com um novo álbum prestes a ser lançado, a cantora brasileira Adriana Calcanhotto se define como uma poeta cuja vocação surgiu do sonho de levar a melhor poesia para as classes mais populares através da música.

Aos seus 48 anos, a metade deles dedicados à carreira, Calcanhotto se mostra crítica com o caminho seguido pelo Brasil e em entrevista à Agência Efe justificou sua participação nos protestos e manifestações na rua com a sensação de descontentamento sentida no país, além das aparências.

Ela, pelo contrário, exala paz e tranquilidade. A pele branca, os cabelos escuros e olhos azuis, se apresenta nesta sexta-feira no Festival Literário da Madeira, em Portugal, enquanto se prepara para viajar em uma longa tour que a levará à Espanha e a diferentes cidades da América Latina para apresentar “Olhos de Onda”.

O álbum, gravado em fevereiro no Rio de Janeiro, mistura canções inéditas com versões de outros artistas e várias de suas músicas mais conhecidas.

“Também estão as músicas que as pessoas querem ouvir, as obrigatórias, as de sempre. Eu não encaro isso como um desconforto, ao contrário, faço o exercício de cantá-las como se fosse a primeira vez”, revelou, sempre preocupada em não perder a espontaneidade nem a paixão por tocar.

A cantora, nascida em uma família de artistas, admitiu que em alguma de suas primeiras excursões perdeu essa capacidade para renovar sua esperança a cada noite, um erro que agora garante de não cometer.

“Quando aconteceu, me senti fatal, desonesta, e é por isso que agora trabalho, não deixo que isso me afete de nenhuma forma, é das coisas que mais cuido. Oscar Niemeyer dizia que a vida é um sopro, que é muito curta como para fazer qualquer coisa no piloto automático”, argumentou.

Em “Olhos de Onda”, que antes de álbum foi um show que rodou o mundo todo, Calcanhotto se apresenta sozinha no palco acompanhada somente de seu violão, instrumento que deixou de tocar por um tempo por causa de uma lesão em sua mão direita.

Considerada representante de uma nova geração de artistas brasileiros, afastada de rótulos e que se caracteriza por misturar diferentes estilos, contou ter sido influenciada pela “bossa nova”, não à toa, seu pai dedicou a vida a este gênero, mas também pelo “punk” e até pelo rap.

Quando estava em dúvida entre ser astronauta, tenista ou arquiteta, a ideia de seguir pelo caminho da música venceu quando tinha apenas 14 anos.

“Meus pais se separaram, e eu tinha que lavar os pratos. Lavava ouvindo rádio, com o volume bem baixo, e aí escutei letras maravilhosas de Caetano Veloso, Maria Bethania recitando Pessoa, Fagner cantando Ferreira Gullar. Aí aconteceu um click e decidi que daria minha vida para conseguir que a alta poesia soasse na rádio popular”, relembrou.

Dito e feito. Calcanhotto foi capaz de recitar grandes nomes da literatura em suas letras e, ao mesmo tempo, soar em emissoras comerciais e em novelas, o que a tornou conhecida, e querida, nas camadas mais populares.

“Identifico-me com os antigos trovadores da era provençal, com essa transmissão da poesia da Grécia antiga”, filosofou a artista, que exibe um perfil mais crítico e reivindicativo quando é interrogada sobre os avanços de seu país.

“O Brasil não está crescendo (economicamente), as contas estão maquiadas”, criticou veementemente.

A cantora censurou o, segundo sua opinião, elevado gasto público destinado à construção de infraestruturas para a Copa do Mundo e defendeu a existência de motivos para sair à rua e protestar, como fizeram milhares de brasileiros no ano passado.

“Temos ainda dois graves problemas: o saneamento básico para evitar doenças, principalmente entre as crianças, e a educação. Quando as pessoas saem à rua, é porque realmente estão insatisfeitas”, ressaltou.

Fora das polêmicas, Calcanhotto quer cada vez mais chegar ao público infantil, o que a levou recentemente a publicar uma antologia de poesia para crianças.

“Lia muito na infância, achava que a leitura era a chave para ser adulta, e detestava ser pequena, que as pessoas mandassem em mim. Pensava que, assim que entrasse no mundo adulto, poderia ficar acordada a noite toda”, lembrou entre risos.

A artista, com o passar dos anos, realizou alguns de seus sonhos, embora ainda tenha desafios pendentes: “Algo que não fiz ainda e que adoraria seria cantar com Mick Jagger. Quem sabe”. EFE

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