Gisela João: de vendedora de loja à nova estrela do fado

  • Por Agencia EFE
  • 17/07/2014 16h01

Óscar Tomasi.

Lisboa, 17 jul (EFE).- A fadista portuguesa Gisela João chegou a Lisboa em 2010 com apenas uma mala e muitos sonhos, mas decidida a vivenciar o difícil mundo do fado, gênero no qual passou a ser considerada uma nova estrela, comparada inclusive com Amália Rodrigues, seu principal ícone.

O fato é que, em menos de três anos, Gisela passou de uma mera vendedora de loja de roupas – a 2,5 euros por hora – à estrela do fado com o lançamento de seu mais recente trabalho solo, em julho de 2013. Anteriormente, a cantora de Barcelos chegou a fazer parte da banda Atlantihda.

Após o lançamento do debut, intitulado com seu próprio nome e que teve milhares de cópias vendidas, Gisela ganhou reconhecimento e passou a dividir o palco com figuras como Mariza, a fadista mais conhecida dentro e fora de Portugal na atualidade.

Desta forma, entre participações especiais e convincentes atuações, Gisela ganhou as casas de fado da capital portuguesa, onde acabou sendo amadrinhada por Maria da Fé, outra das grandes do gênero, e se tornou reconhecida no “mundo”.

Aos 30 anos, idade relativamente tardia para se lançar na música, Gisela chegou com força no mercado fonográfico português, tanto que seu trabalho de estreia recebeu críticas muito positivas da crítica. Embora seja uma defensora do fado em sua versão mais tradicional, a cantora carrega uma imagem mais moderna, levando em conta suas visíveis tatuagens e um “piercing” no nariz.

Em entrevista à Agência Efe, a jovem fadista admite que ainda sente vergonha ao subir no palco, uma sensação que não se reflete na plateia, onde sua voz potente encanta a todos.

“Eu não sou Amália Rodrigues e nem quero ser”, explicou Gisela João, a mais velha dos sete irmãos de uma humilde família de Barcelos, que ainda hoje se “alucina” ao ver o êxito de “Gisa”, como é conhecida em casa.

Segundo a nova revelação do fado, a comparação com sua maior diva lhe afaga e lhe dá vertigem ao mesmo tempo. “É um peso muito grande para mim e, para ser sincera, não gosto de comparações, já que todos nós somos diferentes”, declarou.

Com uma carreira infestada de casualidades e de intenso trabalho, Gisela se encantou com os acordes do fado ainda criança, com apenas sete anos, enquanto esfregava a casa e ouvia pelo rádio um tema de Amália, “Que Deus me Perdoe”.

“Se minha alma fechada pudesse mostrar, e o que eu sofro calada pudesse contar, todas as pessoas veriam a desgraçada que sou, quando finjo alegrias e quando choro cantando”, entoa a cantora com uma naturalidade incrível.

“Me identifiquei com essa letra porque eu era a mais velha entre meus irmãos e tinha responsabilidades em casa, tinha que ser sempre forte e não fazer tolices para dar exemplo ao demais”, relembra a cantora que, apesar de flechada, só foi se entregar ao gênero mais tarde, na adolescência.

Amante então da música eletrônica, Gisela retornou ao gênero popular português motivada pela abertura de uma casa de fados em sua cidade natal, embora tenha se mudado ao Porto para realizar um curso de moda.

Com dificuldades de se manter longe da família, a cantora encontrou um trabalho de meio período para conciliar com os estudos. No entanto, o vírus do fado já tinha lhe infectado e, por isso, sentia muitas saudades dos palcos.

Através de um amigo músico, ela chegou a uma das casas de fado mais conhecidas do Porto, onde precisou vencer o ceticismo inicial do proprietário para conseguir se firmar no fado.

Como integrante do grupo Atlanthida, ela também conheceu algumas das principais figuras da cena musical portuguesa, o que lhe deu a oportunidade de atuar diante de Maria da Fé.

“Ela me convidou para ir morar em Lisboa e disse que podia me ajudar. E eu sabia que ocasiões assim só se apresentam uma vez na vida”, ressaltou a cantora.

As aparições mais ou menos esporádicas em casas de fado de Lisboa lhe obrigaram inicialmente a conciliar esse trabalho com o de vendedora para chegar ao fim de mês, embora tenha conseguido se destacar nos palcos com o passar do tempo e alcançado suporte para se concentrar em sua carreira.

“Poderia ter gravado um disco (solo) antes, mas eu não faço as coisas por fazer”, apontou a cantora, que lançou o álbum no verão de 2013. Desde então, o disco vendeu cerca de 15 mil cópias, enquanto ela ganhou fama e popularidade, tanto que já chega a ser reconhecida nas ruas.

“Estava comprando uns móveis outro dia e me pediram para tirar fotos umas três vezes, e eu toda despenteada, suando…”, comentou a cantora entre risos.

Apesar de sua juventude e de sua imagem “moderna”, Gisela é uma defensora do som mais tradicional do fado: “Me dá muito medo de cair nesse erro de querer fazer algo diferente para ser diferente. Eu não entendo assim minha música. Para mim, o fado tem que ser puro e cru”.

Segundo essa jovem promessa, o fado é gênero “intenso” e não triste, como costuma ser rotulado, já que, para ela, mais triste são as dificuldades que um artista atravessa para viver de seu trabalho em Portugal. EFE

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