Paraguai traça desafio para evitar desaparecimento de línguas indígenas
Chema Orozco.
Assunção, 4 set (EFE).- O guaná, com apenas quatro falantes, é uma das línguas indígenas que correm perigo de desaparecer no Paraguai, que tem como desafio preservar seus 20 idiomas originais se não quiser perder parte de uma cultura ancestral que historicamente foi deixada de lado por suas instituições.
As cerca de 20 línguas nativas do Paraguai são divididas em cinco famílias linguísticas (guarani, mataco, zamuco, maskoy e guaicurú), cada uma com suas respectivas variantes.
Um dos fatores que as colocam em risco é sua desvantagem em relação ao castelhano e ao guarani paraguaio, a segunda língua oficial do país, que está impregnada de palavras e estruturas sintáticas do espanhol.
O guaná, da família maskoy, é um caso mais extremo, pois seus falantes são quatro idosas que vivem em uma comunidade com cerca de 200 pessoas no norte da região do Chaco, entre os rios Paraguai e Apa.
Esse lugarejo, que se estende por 40 hectares com casas precárias e sem nenhum tipo de infraestrutura, começou a abandonar sua língua no início do século XX, quando seus membros foram trabalhar para a empresa argentina Carlos Casado, a primeira fábrica de extrato de tanino das Américas.
“Os funcionários tiveram que utilizar o idioma de contato, o guarani paraguaio, e acabaram abandonando sua própria língua. Isso causou um corte geracional e os mais jovens deixaram de falar (o guaná)”, disse à Agência Efe Nieves Montiel, da Secretaria de Políticas Linguísticas.
A situação se repetiu com o fim do “boom” do tanino e os guaná se mudaram para Vallemi, perto de onde se encontram na atualidade, para trabalhar na recém-criada indústria nacional do cimento, onde o guarani paraguaio era o idioma mais utilizado.
“A invasão de uma língua dominante também ameaça o manjui, da família mataco, falado no Chaco por aproximadamente 350 pessoas, e outros idiomas da mesma região, como o tomaraho, do grupo zamuco, além do angaité e do sanapaná, na parte leste do país, ambos da família moskoi”, alertou Montiel.
Algumas línguas nativas começaram a desaparecer devido a políticas de extermínio, como no caso do povo aché, da família guarani, que foi perseguido durante a ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989).
De acordo com estudos antropológicos feitos no início da década de 1970, a população da comunidade aché foi reduzida em mais de 60% num período inferior a cinco anos devido a ocupação de suas terras ancestrais, a falta de atendimento médico e a venda de suas crianças para o trabalho doméstico.
“No caso dos aché, a perseguição começou por volta de 1910 porque eram os últimos nativos a fazer contato na região leste do Paraguai”, disse à Efe Jan David Hauck, antropólogo que pesquisa essa língua.
“Os que foram enviados para reservas tiveram que falar o guarani paraguaio ou o espanhol e se estabeleceu uma espécie de hierarquia entre os que falavam essas línguas e os que não”, informou Hauck.
Montiel admitiu que o Estado paraguaio demorou muito para reverter essa situação e aplicar políticas de recuperação e de igualdade linguística.
“A Constituição apoia os direitos culturais dos povos indígenas, mas até a criação, em 2002, da Secretária de Políticas Linguísticas não houve muito trabalho institucional”, disse.
No âmbito educativo, a Universidade Católica de Assunção contribuiu para a revitalização dessas línguas com a fundação de um arquivo digital que conta com gravações em áudio e vídeo, depoimentos de seus falantes e gramáticas e livros em espanhol que se referem a essas culturas.
No entanto, os especialistas reunidos na apresentação do projeto reconheceram que isso não é suficiente se os próprios falantes não tiverem o interesse de revivê-las.
Nesse sentido, Montiel opinou que o exemplo das quatro avós guaná, que se dispuseram a dar aulas do idioma a pedido da comunidade, representa um sinal de esperança.
“Em novembro fomos à comunidade e encontramos pessoas muito interessadas em recuperar sua identidade cultural. As quatro senhoras dão aulas aos fins-de-semana, orais, pois a maioria dos moradores são analfabetos, e nós oferecemos apoio através da Secretaria”, disse Montiel. EFE
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