SP < RJ! Entenda por que o carnaval paulista ainda não se compara ao carioca
Desfiles grandiosos, sambas populares, participação de famosos… Há algum tempo, basta o calendário chegar a fevereiro e março para que o seguinte comentário seja proferido: “o carnaval de São Paulo está evoluindo. Logo, logo, alcança o do Rio de Janeiro”. Mas, analisando com mais profundidade, será que tal avaliação é correta?
O Jovem Pan Online conversou com o sujeito que talvez melhor conheça o carnaval paulista e o questionou sobre o assunto. Dono da voz que há anos embala a leitura das notas na apuração de São Paulo, Antônio Pereira da Silva, o popular Mestre Zulu, usou toda a sua sabedoria e experiência para opinar.
Ou melhor, desabafar. No alto de seus 67 anos, Zulu foi direto e reto: “ainda não é possível dizer que o carnaval de São Paulo é tão bom quanto o do Rio de Janeiro. Esse negócio de que vamos alcançar os cariocas é uma coisa que, quando eu era moleque, já ouvia falar. E, agora, eu já estou bem velhinho, hein? Então, acho que ainda vai demorar um bocado de tempo para acontecer. Eu, por exemplo, não vou ver isso aí, não, filho”.
A justificativa? “Faltam muitos detalhes, principalmente no lado profissional e de respeito aos profissionais que trabalham com o carnaval”, afirmou Zulu. “No Rio, eles buscam a perfeição na organização, enquanto nós ainda estamos engatinhando, querendo encontrar a maneira como as coisas devem ser feitas. Andar para frente é a ordem natural que Deus nos ensinou, mas, aqui em São Paulo, parece que estamos voltando à Idade da Pedra”, criticou.
Abaixo, entenda ponto a ponto por que, no entendimento do Mestre Zulu, o carnaval paulista ainda está muito longe do carioca:
Passistas
“As diferenças ainda são muito grandes. Com exceção da São Clemente, que é da Zona Sul, todas as grandes escolas do Rio de Janeiro são do morro. No carnaval do Rio, você vê muitas passistas de raiz desfilando na avenida. Na Mangueira, Império Serrano… Tem muita gente de fato boa. Em São Paulo, não é bem assim”.
Fantasias
“No Rio de Janeiro, que é uma cidade litorânea, as fantasias são mais leves, muito melhores. Já em São Paulo, são um tanto quanto pesadas, mesmo sem chuva. Em nível de fantasia, os cariocas estão à frente”.
Carros Alegóricos
“Eles levam vantagem, porque há uma saída logo na dispersão da Sapucaí em que os carros são imediatamente desmontados. Aqui em São Paulo, o que existe é um depósito de alegorias no terreno da aeronáutica. Precisamos aprender essa técnica ainda. As alegorias paulistas estão cada vez mais lindas, mas ainda não se comparam às cariocas. Muitos carnavalescos do Rio de Janeiro estão sendo contratados por São Paulo. E isso é uma prova de que sabemos que ainda estamis muito atrás dos cariocas. Essas importações são feitas para que, um dia, os carros paulistas alcancem a qualidade das alegorias do Rio de Janeiro”.
Samba e bateria
“Há muita diferença ainda. Aqui em São Paulo, estava indo tudo numa boa e houve uma regressão muito grande. Samba e, principalmente, bateria são a base de um bom carnaval. Mas, aqui em São Paulo, as letras e melodias têm sido feitas principalmente por firmas, um grupo de gente que faz samba para um monte de escola. Isso tem que acabar. Essa espécie de terceirização não está levando à nada. Vira uma mesmice. Na minha concepção, cada escola de samba deveria ter os seus compositores próprios”.
Público
“Com o atual modelo, o público de São Paulo jamais será igual ao do Rio de Janeiro. Lá, você encontra um escalonamento justo de preços. Os ingressos devem ser cobrados de acordo com o bolso das pessoas. Na Sapucaí, tem os paredões de camarotes. Se você tem bala na agulha, é para lá que vai. Mas também há muito espaço para quem não tem condições de pagar tão caro. Aqui em São Paulo, o carnaval é muito elitizado. E a prova disso é que, nos ensaios técnicos, quando as entradas são de graça, tem muito mais gente na arquibancada do que em dia de desfile”.
Importação é um caminho
“A troca de informação é sempre boa. E São Paulo não importa só do Rio de Janeiro. Muitos profissionais ligados ao Festival de Parintins, de Amazonas, estão sendo trazidos ao carnaval paulista para ensinar novos conceitos de movimentos e esculturas. Já dá para perceber essas influências no carnaval de São Paulo. E a escola pioneira nisso foi a X-9. Daí em diante, todas aprenderam o caminho. E eu acho que os paulistas têm, mesmo, de fazer isso”.
Conclusão
“A evolução tem de ser total. Aqui em São Paulo, você olha para o lado e vê carros alegóricos lindos, maravilhosos, mas o primordial não é isso. O todo é que tem de ser analisado. Tem de ter alegoria bonita? Sim, claro. Mas também tem de ter o chão da escola, sambistas e passistas de verdade. Andar para frente, todo mundo anda. Na minha época, houve uma pequena evolução. Mas, hoje, parece que a coisa estagnou”.
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