Ação e reação! Como Paraisópolis virou um celeiro do rugby brasileiro

  • Por Jovem Pan
  • 19/01/2016 18h32

Instituto Rugby Para Todos funciona em Paraisópolis e usa o esporte como forma de inclusão social

Facebook/Reprodução Rugby Para Todos Paraisópolis

Quando, no fim do século XIX, voltou da Inglaterra para o Brasil com duas bolas, um par de chuteiras e alguns uniformes na bagagem, Charles Miller não sabia, mas dava o pontapé inicial à maior paixão verde e amarela. O País conhecia ali o futebol, esporte do qual se tornaria pentacampeão mundial mais de um século depois. Mas se engana quem pensa que o funcionário da ferrovia São Paulo Railway só ensinou os brasileiros a jogar bola com os pés. Miller também foi o responsável por introduzir na cultura nacional outro esporte bastante popular mundo afora: o rugby.

É desnecessário dizer qual das modalidades foi mais abraçada pelo Brasil. Se o futebol já deu cinco taças mundiais e incontáveis fins de semana de alegria ao povo canarinho, o rugby definitvamente não está sequer na lista dos esportes favoritos da maior parte dos brasileiros. Mas há exceções. E são elas que mantêm acesa a chama do esporte que, embora não goze de prestígio no País apaixonado pela bola, move multidões em outros pontos do planeta, como Europa, Nova Zelândia, África do Sul, Austrália e até mesmo Argentina.

Uma destas exceções está localizada a cerca de 12 km do Parque Dom Pedro, no Centro de São Paulo, onde oficialmente se jogou a primeira partida de futebol no Brasil. Foi na famosa comunidade de Paraisópolis que centenas de jovens viram no esporte britânico a oportunidade de crescer na vida e sonhar com um futuro melhor. É lá que, há doze anos, funciona o Instituto Rugby Para Todos.

Criado em 2004 pelos ex-jogadores Maurício Draghi (foto abaixo) e Fabrício Kobashi, o projeto nasceu da necessidade de suprir demandas educacionais e de lazer da comunidade de Paraisópolis e, hoje, pode ser considerado um dos celeiros brasileiros do esporte que integrará os Jogos Olímpicos de 2016.

“Tínhamos o desejo de popularizar o rugby, que era muito elitizado aqui no Brasil. Ele sempre foi praticado em clubes ingleses, franceses… Nós queriamos quebrar esse paradigma e apresentar o esporte a um público que não teve acesso”, contou Maurício Draghi, em entrevista a Zeca Cardoso para o programa Domingo Esporte, da Rádio Jovem Pan. “O que contribuiu foi a inclusão do rugby nos Jogos Olímpicos e o fato de o Rio de Janeiro sediar o evento em 2016. Isto mudou todo o cenário”, acrescentou.

A evolução do projeto é gritante e enche de orgulho os moradores de Paraisópolis. “O trabalho começou com a simples ambição de apresentar o esporte a um público menos abastado. Nós não sabíamos como ele iria receber essa novidade e nem se haveria atratividade na comunidade. Mas esse público trouxe demandas educacionais e de desenvolvimento. Hoje, 11 anos depois, Paraisópolis é um bairro, um local com muito mais oportunidades, e o rugby participou dessa transformação”, disse Draghi.

O ex-jogador, que sempre viveu em bairros vizinhos a Paraisópolis, não esconde que enfrentou muitas dificuldades na tentativa de implementar o rugby na região. O que o motivou a seguir lutando? O apoio dos moradores da comunidade. “Como falamos dentro do rugby, sempre vem um empurrão para frente”, brincou Draghi, apelando a uma mecânica característica do esporte para explicar a insistência no projeto.

E ela, sem dúvidas, vem sendo recompensada. Atualmente, o Instituto Rugby Para Todos conta com com um belo campo sintético, atinge 250 crianças de seis a 17 anos de idade e não só forma futuros jogadores. “Há jovens que hoje têm outras demandas. Então o projeto disponibiliza casas para atletas formados e também atua na formação de técnicos e árbitros de rugby”, explicou Maurício. “O pessoal de Paraisópolis tem muitas competências, e nós queremos mostrar que eles também têm condição de vencer”, complementou.

O Instituto Rugby Para Todos possui um time, o Leões de Paraisópolis. E, apesar de não competir na categoria adulta, a equipe é uma das mais fortes da base brasileira. Já foram vários resultados satisfatórios em torneios de nível e o principal: a esperança de que o futuro do rugby nacional vai ser melhor.

No último fim de semana, por exemplo, a Seleção Brasileira conseguiu uma campanha inimaginável no Seven de Viña Del Mar: foi vice-campeã do torneio, assegurou pelo segundo ano seguido classificação ao Torneio Qualificatório de Hong Kong e pela primeira vez na história conquistou duas vitórias seguidas sobre o Uruguai, um triunfo sobre o time de desenvolvimento dos Estados Unidos e outro resultado positivo diante da poderosa seleção de desenvolvimento da África do Sul.

Um dos jogadores brasileiros na Argentina era Robert Tenório, que cresceu no Instituto Rugby Para Todos. Seria ele o maior ídolo dos meninos e meninas que hoje integram o projeto social em Paraisópolis? Ainda não. Tal honra cabe a David Pereira Martins (foto abaixo), que também foi lançado pelo time da comunidade e jogou o último Sul-Americano pela Seleção Brasileira adulta.

Ele inspira os jovens não só pelo talento que possui com a bola em mãos, como também pela vontade que sempre demonstrou ter de passar seus conhecimentos adiante. É aluno de Educação física e, apesar de já ter atuado pelo tradicional Pasteur, ainda mantém suas atividades como monitor em Paraisópolis. A satisfação está nas palavras de Maurício Draghi: “hoje, as crianças falam: quero ser igual ao Deivid. Para mim, é um orgulho imenso”.

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