Barcelona entra mais uma vez no DeLorean de “De Volta para o Futuro”
Enfrentando a si mesmo e trafegando em uma espiral infinita de acontecimentos, o Barcelona vive há décadas como se estivesse dentro de um DeLorean voador, a máquina do tempo do filme “De Volta para o Futuro”.
Algumas histórias se repetem no clube catalão, mudando apenas a época e os personagens. Além disso, uma semana no Barça pode ser uma década em qualquer outro gigante do futebol europeu. Nos últimos dias, o diretor esportivo foi demitido, houve a divulgação de uma divergência entre a estrela da equipe e o técnico, e o presidente teve que antecipar as eleições para junho de maneira inesperada.
Nesta semana, o Barcelona “viajou” em seu DeLorean para 2003, quando Joan Gaspart renunciou, assim como Sandro Rosell no ano passado. Enric Reyna então assumiu a presidência interinamente e tentou encerrar o mandato sem convocar eleições, exatamente como o atual mandatário, Josep Maria Bartomeu.
Também houve uma volta a 1986, com o enfrentamento entre a estrela de então, Bernd Schuster, e o treinador Terry Venables. Na realidade, a briga entre craques e técnico é um assunto recorrente no Barça: Johan Cruyff contra Hennes Weisweiler, Romário contra Cruyff, Rivaldo contra Louis Van Gaal e, agora, Messi contra Luis Enrique…
O atual Barça está acéfalo. Pouco importa que a equipe esteja viva nas três competições que disputa – Liga dos Campeões, Campeonato Espanhol e Copa do Rei – nem que não haja uma grave crise de resultados. Em poucos clubes isso seria motivo para que o clima ficasse tenso, mas o Barcelona é um deles.
O problema é o grau de exigência, inclusive quanto à qualidade do futebol jogado e os parâmetros de comparação. De 2008 a 2013, pelo menos um título foi conquistado, com o auge em 2011, com a “tríplice coroa”. Houve conquistas, recordes e o reconhecimento do mundo de futebol.
Mas a inércia acabou. Rosell chegou ao poder em 2010 com o respaldo de mais de 35 mil sócios e abriu mão do passado para construir um presente promissor. Do eixo vencedor – Guardiola e Cruyff -, pouco restou. Os torcedores violentos, afastados do Camp Nou durante sete anos, retornaram às arquibancadas, a Catar Foundation substituiu a Unicef na camisa oficial, e o clube entrou no DeLorean para voltar no tempo, certamente um retrocesso de várias décadas.
O ano de 2014, com a morte do técnico Tito Vilanova, foi um dos piores para a instituição, que ainda se viu envolvida, direta ou indiretamente, em processos pela contratação de jovens de forma irregular, como a de Neymar, além dos problemas de Lionel Messi com a receita.
Rosell renunciou em janeiro do ano passado. Em fevereiro, o então primeiro vice-presidente assumiu o cargo e tentou a todo custo se manter no posto até o fim do mandato do antecessor, em 2016.
A antecipação do processo eleitoral parecia evidente quando o time de Gerardo Martino perdeu o título do Campeonato Espanhol em casa contra o Atlético de Madrid na rodada final na última temporada. Mas o clube e seu entorno viviam um momento de estagnação, tanto que os torcedores sequer manifestaram sua inconformidade com o revés.
Luis Enrique chegou e contou com 170 milhões de euros em contratações para revitalizar o Barça, mas em poucos meses ficou claro que não é uma questão de resultados, mas do futebol jogado.
Tudo começou a cair assim que foi encenado o conflito entre o técnico e Messi, depois que o argentino não gostou de ter sido reserva na derrota para a Real Sociedad, no último domingo.
Qualquer técnico do Barça acaba sabendo, mais cedo ou mais tarder, que o argentino quer jogar sempre, inclusive os amistosos. Guardiola, Vilanova e Martino demoraram um pouco a perceber, mas no fim das contas tiveram que ceder para manter o sorriso do camisa 10.
Mas Luis Enrique, assim como Messi, tem personalidade forte e quer que tudo siga suas próprias regras. E nelas a decisão de quem joga é tomada independentemente do renome dos atletas envolvidos. Nesta quinta-feira, quando a equipe catalã goleou o Elche por 5 a 0 pela Copa do Rei, já foi possível ver as primeiras discussões entre fãs do técnico e do atleta.
O nome do principal jogador do elenco já vem sendo relacionado ao Chelsea, Luis Enrique está ameaçado, o clube não tem diretor-técnico, nem diretor-geral, o presidente que começou o mandato renunciou há um ano e seu substituto se viu obrigado a convocar eleições. O Barcelona está novamente disposto a entrar no carro de “De Volta para o Futuro”.
Joan Laporta, que foi presidente do Barça de 2006 a 2010, Bartomeu e Agustí Benedito serão os principais atores das eleições, e o primeiro deles parte com vantagem em todas as pesquisas.
O pleito, que ainda não tem data confirmada, é uma oportunidade de encontrar um novo caminho para não se perder, como quase sempre, em um espiral infinito. Será interessante ver as propostas de candidatos que não poderão prometer reforços, já que a proibição de contratar imposta pela Fifa valerá até janeiro do ano que vem.
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