Bola no ângulo, cobertura, dribles: por que alguns gols são mais bonitos que outros?

  • Por Luiz V. Andreassa/Jovem Pan
  • 07/09/2015 18h02
Montagem sobre EFE/Folhapress/MowaPress A ciência

Todo fã de futebol (e mesmo aqueles que não são) sabe reconhecer um golaço quando vê um. Seja um chute no ângulo, um toque por cobertura, uma finalização após um drible desconcertante: os gols bonitos são fáceis de definir. Mas há uma questão mais difícil: por que consideramos alguns gols mais bonitos que outros? Por que aquele do chute que entra no ângulo é considerado mais bonito que um de cabeça após cobrança de escanteio?

O poeta Carlos Drummond de Andrade disse certa vez que “a estética do torcedor é inconsciente; ele ama o belo através de movimentos conjugados, astuciosos e viris”. E é mais ou menos por aí: segundo o professor doutor Ronald Ranvaud, físico especializado em estudos do esporte, a beleza do esporte é composta por quatro quesitos – exuberância física, habilidade, estratégia e o imponderável. “Nos anos 1950, eu tinha cinco anos quando vi o Baltazar fazer um gol de fora da área de cabeça”, explica o professor a respeito da exuberância física, pela força da cabeçada.

“A destreza e a habilidade física são o controle motor. Se tiver mais que você, mesmo que você seja mais forte, eu consigo ganhar. O terceiro nível, a estratégia, é a parte de inteligência, como levar a luta para um cantinho em que o fato de o adversário ser mais alto e mais forte não faça tanta diferença. A quarta parte é o imponderável, ou seja, a bola que segue uma trajetória estranha e entra no gol”, complementa. “Gol bonito é aquele em que pelo menos uma dessas quatro partes do esporte se sobressai”.

Mas, além de ciência, golaço também é arte – e é cinematográfico. “Tem a ver com o conceito de beleza no campo da estética. Quando dizemos que algo ‘é coisa de cinema’, sugerimos que existe ali uma beleza que vai além do cotidiano, do comum, do corriqueiro; existe ali, portanto, uma beleza extraordinária. Ao tomar contato com ela, nos sentimos presenteados pela vida, que passa a fazer mais sentido”, diz Sérgio Rizzo, jornalista especializado em cinema e professor de jornalismo esportivo. “Os golaços renovam a nossa paixão pelo futebol e compensam os minutos de futebol horroroso que assistimos em muitas partidas. Precisamos dos golaços para continuar respirando futebol”.

Por fim, a última parte da explicação sobre a beleza que vemos em certos lances é o fator psicológico. “Acredito que seja pela plasticidade e pela dificuldade: um gol de longa distância é considerado golaço porque a probabilidade de acontecer é muito menor do que um debaixo da trave”, explica Rodrigo Scialfa Falcão, psicólogo do esporte. “Tem outras variáveis, como uma percepção mais pessoal. Se alguém gosta de um futebol mais defensivo, tem tendência a ter um gosto voltado pra isso. Um que gosta de futebol mais bem jogado, pra frente, pode ter outro tipo de percepção”.

Da teoria à prática – porque todo mundo gosta de ver golaços

Confira abaixo exemplos de gols bonitos que atendem a cada um (ou mais de um) dos conceitos que compõem a beleza do esporte, segundo o professor Ronald Ranvaud.

1. Exuberância física

É o uso da força e da capacidade física para fazer aquilo que poucos seria capazes – como Ibrahimovic, quando marcou o gol abaixo contra a Inglaterra.

2. Habilidade ou destreza

O baixinho Messi mostrou como a habilidade pode superar a força e a altura ao passar com facilidade pelo zagueiro Boateng e encobrir o gigante goleiro Neuer.

3. Estratégia

O gol não saiu, mas a jogada de Pelé contra o Uruguai na Copa de 1970 é um clássico exemplo do uso de estratégia que torna um lance bonito.

4. Imponderável

Um gol que ninguém espera, muitas vezes nem mesmo seu autor, tem boas chances de ser um golaço. Aquele marcado do meio de campo por Diego Souza, na partida entre Palmeiras e Atlético-MG em 2008, é um exemplo.

Tudo isso junto

O gol de falta de Roberto Carlos contra a França em 1997 é um caso de golaço que reúne todos os quesitos acima. Tem exuberância física (a força do chute), habilidade (a técnica usada para bater na bola), estratégia (o ato de enganar o goleiro Barthez) e o imponderável (a curva inacreditável que a bola faz).

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