“Bombom” no Boca, ex-Palmeiras deixou Argentina por racismo. Hoje, é lenda no DF

  • Por Jovem Pan
  • 01/06/2016 18h09

Baiano é querido pelas torcidas dos quatro grandes clubes do Distrito Federal

Divulgação Baiano é querido pelas torcidas dos quatro grandes clubes do Distrito Federal

O ano era 2005. No auge da carreira, Baiano deixava o Palmeiras para cruzar a fronteira e reforçar o poderoso Boca Juniors, que, naquela temporada, completaria 100 anos de história. A responsabilidade era enorme, já que o clube argentino acabava de perder Hugo Ibarra, lateral-direito que era um dos pilares do Boca campeão continental em 2000, 2001 e 2003.  

Único brasileiro e negro do elenco argentino, Baiano se apresentou com receio. Algum tempo depois, contudo, derrubou estereótipos, venceu o preconceito e caiu nas graças da torcida xeneize. As boas atuações, principalmente do meio para frente, renderam-lhe até o carinhoso apelido de “Bombom” – que, para um time cujo estádio se chama Bombonera, está longe de representar pouca coisa.  

Mas a bela e surpreendente história de amor entre Baiano e Boca Juniors se encerrou de maneira fulminanteO jogador, então com 26 anos, não soube lidar com a hostilidade do país – que o crucificou em um momento delicado do futebol argentino – e apelou ao próprio bolso para rescindir o contrato com o clube. O racismo, que, na época, tornava ainda mais acirrada a rivalidade entre Brasil e Argentina, obrigou o lateral direito a abandonar o Boca após somente sete dos 12 meses de contrato. Foi um soco na boca do estômago do atleta, que, até então, acreditava viver um conto de fadas. 

 

Onze anos depois de deixar um dos clubes mais tradicionais do planeta, Baiano se recorda da rápida passagem pelo futebol argentino com certa nostalgia. E se ele tivesse continuado no Boca? E se o clube tivesse lutado mais para defender um jogador tão importante para o elenco? A incerteza sobre os rumos que sua carreira tomaria se não fosse o racismo é cruel. Mas, acredite, ajudou o humilde lateral direito a, hoje, tornar-se motivo de inspiração para muita gente. 

“Infelizmente, saí do Boca Juniors por um problema que não era meu, e sim do Grafite, que tinha denunciado o Desábato, zagueiro do Quilmes, por racismo, na Libertadores de 2005. O Desábato saiu de campo preso, e eu era o único brasileiro e negro que jogava pelo Boca Juniors em 2005, no centenário do clube. Comecei bem, mas depois a situação se tornou insustentável. Imprensa e torcida me pressionaram muito”, relatou, em entrevista exclusiva a José Manoel de Barros para o Plantão de Domingo, da Rádio Jovem Pan. “Mas foi uma coisa com a qual eu aprendi muito”, acrescentou. 

As tristes lembranças daquela repentina experiência na Argentina seguem vivas no coração de Baiano. Mas, hoje, dividem espaço com um presente muito mais satisfatório. Aos 37 anos, o jogador, que foi revelado pelo Santos e teve passagem marcante pelo Palmeiras, é o principal nome do futebol brasiliense. Em quatro anos no Centro-Oeste brasileiro, o veterano conseguiu algo improvável: tornar-se querido pelas torcidas dos quatro grandes clubes do Distrito Federal. Baiano foi ídolo no Brasiliense, campeão estadual com o Gama e referência no Brasília e Ceilândia, time pelo qual joga atualmente, por empréstimo. 

“Desde que cheguei aqui em Brasília, fui muito bem recepcionado. Inclusive, tem acontecido algo diferente comigo. Eu sempre fui aquele jogador voluntarioso, que marcava, dava passes e fazia alguns gols de falta… Mas aqui eu virei referência no futebol”, celebrou. “Por mim, já tinha me aposentado, mas o presidente do Brasília não deixou. Ele renovou meu contrato mesmo sem eu querer, então vou cumprir pelo menos até julho”, complementou.

O sucesso no presente, contudo, não faz o jogador se esquecer da equipe pela qual ganhou notoriedade no passado. O Palmeiras, que subiu à Série A em 2003 graças, também, aos gols e boas atuações de Baiano, ainda é muito bem quisto pelo lateral direito. “Na época, fui contratado para substituir um grande ídolo da história do Palmeiras, o Arce. Eu me lembro que, quando cheguei, todo mundo tinha aquela desconfiança… Mas deu tudo certo. Eu costumo brincar que o maior troféu que eu conquistei no Palmeiras foi o fato de não ouvir a torcida gritando o nome do Arce em nenhum momento”, sorriu. 

E a linda carreira do jogador, que até defendeu a Seleção Brasileira nos Jogos Olímpicos de 2000, em Sydney, foi reverenciada recentemente. Baiano simplesmente foi escolhido pelos moradores de sua cidade-natal, Capim Grosso, na Bahia, para encerrar o revezamento da tocha olímpica pelo local, há alguns dias. Foi uma experiência única e que, definitivamente, já ganhou lugar especial no enorme coração do jogador. “Confesso que nunca senti uma emoção tão grande como aquela. Tinha 45 mil pessoas nas ruas da minha cidade. Eu mais chorei do que sorri, porque passou um filme na minha cabeça”, decretou, prestes a encerrar uma carreira tão surpreendente quanto duradoura.

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